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Jornada: patrões querem amplo debate sobre o assunto

Entidades do setor industrial e comercial já têm opinião formada sobre redução da jornada: são contra

Por Luciele Velluto
do Diário do Grande ABC
11/06/2008 | 07:00
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A redução da jornada de trabalho de 44 para 40 horas semanais é uma discussão que tem se intensificado no setor empresarial, depois que as centrais sindicais levaram o tema para debate no Congresso Nacional, na última semana. As entidades do setor industrial e comercial já tem opinião formada quanto a redução da jornada: são contra, a menos que se discuta, junto, a reforma tributária.

As organizações acreditam que o assunto tem um peso político maior que o trabalhista e que não um tema dessa importância não deve ser tratado de modo isolado. Os empregadores, no entato, preferem não comentar a questão, para evitar conflitos com os sindicatos.

Diversas empresas do Grande ABC foram procuradas pela reportagem para falar sobre a redução da jornada. Mas os executivos disseram que o assunto é muito delicado e que preferiam não se pronunciar. Em off, alguns empresários revelaram que a posição das empresas pode gerar problemas com o sindicato. Por isso, preferem que as associações e outras entidades empresariais comentem o assunto.

REPRESENTANTES - Para diretor do Ciesp de São Bernardo Mauro Miaguti, o projeto de mudança na jornada tem um viés mais político do que prático. "Não existe mágica. Reduzir a carga horária vai fazer com que alguém pague essa conta, e todos já sabem que é: a sociedade", afirma.

O empresário explica que não é contra a redução da jornada de trabalho, mas afirma que ela não pode ser feita sozinha. "Sou contra fazer dessa forma, imposta, sem discutir desoneração das empresas, encargos. Está na hora do governo também fazer a sua parte, devolver um pouco dos impostos pagos por empresas e trabalhadores em forma de redução da carga tributária. Isso, sim, geraria emprego, melhores salários, consumo e fomentaria a o ciclo de crescimento econômico do País de forma sustentável", argumenta Miaguti.

A assessora econômica da Fecomercio, Kelly Cavalho, partilha da mesma idéia sobre contrapartidas para a mudança na jornada. Para ela, se não houver incentivo - desoneração da folha de pagamento, crédito mais acessível, redução das alíquotas de impostos -, a alteração da lei que regulamenta a carga horária semanal de trabalho poderá implicar em desemprego, por conta da elevação dos custos para as empresas.

"Estimamos que será um aumento de 10% no custo da empresa com a redução de 10% da jornada, sem contar a perda produtiva. Isso ainda pode levar à troca de funcionários, com a contratação de mão-de-obra mais barata e elevação de informalidade para quem está desempregado", comenta a assessora.

Kelly é contra a alteração da Constituição Civil, como sugerem as centrais. A representante da Fecomercio acredita que a mudança deveria ser negociada setorialmente entre sindicatos e empresários. "Cada um sabe de suas necessidades, de como isso poderia ser feito. Não pode ser imposto, pois pequenas e micro empresas não conseguiriam se adaptar", diz.

Desembargador é contra a mudança da Lei

Um dos simpatizantes do movimento pela redução da jornada é o desembargador federal do Trabalho Nelson Nazar, professor da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo) de Direito Econômico. "Do ponto de vista extrajurídico, vejo o tema com muita simpatia. Pode ser uma saída para contribuir com a redução do desemprego no País, desde que venha com outros pontos, como o agravamento do valor das horas extras", comenta.

Nazar acredita que a redução deve ficar à espera das negociações e não ser feita através de uma PEC (Projeto de Emenda Constitucional), como as centrais querem. "Acho que os sindicatos têm que conseguir isso através da convenção coletiva. Seria um amadurecimento do processo de negociação. Sou contra mexer na Constituição, tenho muito receio, pois pode haver mutilação das leis."

O desembargador também se mostra preocupado quanto ao discurso das empresas, que pedem a desoneração da folha de pagamento para poder aceitar a idéia da redução do período semanal de trabalho. "Acho que pode ser uma moeda de troca perigosa, caso se mexa na Constituição, pois podemos perder direitos garantidos para os trabalhadores nesse caminho", ressalta.

Na visão econômica, o coordenador do curso de Economia do Imes (Universidade Municipal de São Caetano), Francisco Funcia, acredita que esse seja o momento certo para a discussão da jornada diante dos resultados positivos que a economia nacional tem apresentado. "É hora do trabalhador se mobilizar para que os ganhos de produtividade dos últimos anos sejam repartidos", afirma.

Para Funcia, a redução é possível, mas precisa adotar critérios para ser instituída. O economista acredita que os setores empregadores não estão aptos a receber a mudança de uma vez e defende que a alteração precisa ser feita de forma escalonada para que todos consigam absorver a alteração, evitando o desemprego.

Mesmo assim, o economista não descarta que a mudança possa vir por meio de uma projeto de alteração na Constituição. "Seja como for, o processo precisa ser negociado entre trabalhadores e empresários, com intermédio do Ministério do Trabalho e Emprego, para se ter o menor impacto negativo possível."

Para centrais, debates devem ser separados

As centrais sindicais defendem que a redução da jornada de trabalho vai gerar 2,3 milhões de empregos, se houver junto o controle das horas extras. No entanto, nem todas as entidades estão dispostas a negociar ao mesmo tempo contrapartidas, como a desoneração da folha de pagamento, por exemplo.

"O que os empresários chamam de encargos são 13º salário, férias, entre outros direitos que não aceitamos discutir. Quanto ao peso da Previdência, já trabalhamos a idéia de mudar essa contribuição sobre a folha para a produtividade da empresa, como já ocorre em outros países", explica Artur Henrique, presidente da CUT (Central Única dos Trabalhadores), que afirma que os temas devem ser tratados independentemente.

O presidente da UGT (União Geral dos Trabalhadores) Ricardo Patah concorda quanto a desoneração, mas também é contra ligar a redução da jornada à carga tributária. "Se colocar as duas em discussão, não sai nem uma coisa nem a outra."

Já o secretário-geral da Força Sindical, João Carlos Gonçalves, o Juruna, afirma que a entidade está disposta a discutir redução de impostos. "É possível falar em contrapartida. Os empresários só precisam perceber que 13º salário e férias não são encargos", comenta.

Há duas semanas, as centrais organizaram um movimento dos trabalhadores sobre o tema em todo o País para pressionar o Congresso Nacional à abrir a discussão do tema. Na semana seguinte, um abaixo-assinado com 1,5 milhão de assinaturas foi entregue na Câmara dos Deputados, gerando um debate entre entidades empresariais e dos trabalhadores.




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