Política Titulo Entrevista da Semana
‘Geraldo foi omisso em não me dizer que iria com Lula’
Sérgio Vieira
Do Diário do Grande ABC
17/01/2022 | 07:45
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Claudinei Plaza/DGABC


Um dos políticos mais leais ao ex-governador Geraldo Alckmin (sem partido), o deputado estadual Campos Machado (Avante) não consegue entender a decisão do ex-tucano em abandonar a pré-candidatura ao governo do Estado para buscar a vaga de vice-presidente na chapa de Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Para Campos, o parceiro de longa data foi omisso em não avisá-lo. “Eu acho que merecia ter ouvido isso dele”, disse. Com o novo cenário, o parlamentar decidiu apoiar o vice-governador Rodrigo Garcia (PSDB), que assume o cargo em abril e irá disputar a reeleição. “Ele tem o mesmo perfil do Geraldo.” Mas deixa claro que não há qualquer chance de apoio ao presidenciável João Doria (PSDB), de quem Campos sempre foi rival declarado.

Sua história política sempre esteve ligada ao ex-governador Geraldo Alckmin. Como o sr. enxergou a decisão dele em abandonar as conversas para disputar o governo de São Paulo e agora trabalhar para ser o vice de Lula?

Eu tenho uma ligação fraternal com ele, de mais de 30 anos. Nos últimos anos, começamos a trabalhar a campanha dele para governador. Primeiro porque eunão aceitei a traição que o (governador) João Doria fez com ele. Fui então considerado o maior opositor do Doria no Estado. Me uni com o Gilberto Kassab (presidente nacional do PSD), que é um político sério, hábil e decente e estaríamos unidos na campanha ao governo. Naquela altura, eu era presidente estadual do PTB (deixou a legenda em direção ao Avante em dezembro de 2020), um partido muito forte. O Geraldo, então, veio umas 50 vezes em meu escritório político e consegui trazer muita gente para a campanha. E muitos filiados que estavam no meu antigo partido.Alguns prefeitos não vieram no começo porque o governo do Estado fez uma espécie de assédio moral. Fortalecemos o Avante e seguimos no caminho pela eleição de Geraldo Alckmin, que iria se filiar ao PSD. Durante semanas, ele recebeu muita gente no meu escritório, na certeza de que ele
seria nosso candidato. Isso foi empolgando muita gente. Nossa previsão era a de que ele iria se eleger. Estava tudo muito bem, até meados de dezembro. Em uma reunião, Geraldo disse que não tinha mais vontade de ser candidato a governador. Disse para mim e para o Kassab. Falou que queria promover uma união nacional. Eu falei:‘E a sua história, governador?’. Mas eu senti que ele não queria dar a resposta naquele momento. Depois dessa reunião, não me disse mais nada.

E o que senhor fez, a partir desse fato?

Eu tinha que tomar algumas decisões. Kassab e eu não tínhamos nos preparado para isso. Nesse sentido,muitas pessoas começaram a me dizer que o perfil do vice-governador Rodrigo Garcia (PSDB), que assume o governo em abril, é o mesmo do Geraldo. E de fato é. Pessoa simples, discreta, de família, que não é intempestiva nem agressiva. No dia 3 de janeiro, fui ao Palácio dos Bandeirantes conversar com o Rodrigo. Disse a ele que poderíamos caminhar juntos e falei da minha convicção de que esse pessoal que me acompanha no Avante virá junto. E ter esse grupo é fundamental para ganhar a eleição. Vamos ter uma conversa no fim do mês, mas a decisão está tomada, que é apoiar Rodrigo Garcia. Os votos que seriam trabalhados para o Geraldo iremos trazer para o Rodrigo.

O eleitor de Alckmin, então, pode migrar para a candidatura do Rodrigo?

Tranquilamente. Não dá para imaginar o eleitor do Geraldo votando no Fernando Haddad (PT), por exemplo. Nem mesmo no Márcio França (PSB). Esse eleitor deve votar no Rodrigo pela questão de afinidade. Eu imagino que esses meus 32 anos de deputado estadual vão ajudar nisso, em reunir esse grupo que muita gente chama de campista.

O campismo seria o novo alckmismo?

Pode ser sim. A posição que eu tomei não irei voltar atrás. E eu não mudei de lado. Como sempre fui leal ao Geraldo Alckmin, estou sentindo que este grupo segue comigo por lealdade. Grande parte dos alckmistas não aceita o acordo que foi feito com o Lula. Muita gente me disse ‘Não voto nessa Lula e Alckmin, mas ficarei ao seulado’. Isso me deu um ânimo novo para ajudar o Rodrigo a ganhar a eleição. Reúne condições para ser, neste momento, o melhor candidato a governador.

Dá para ser rival de Doria e apoiar o Rodrigo?

É possível sim. Com o Doria não tem acordo. O Rodrigo sempre foi meu companheiro de Assembleia e parceiro político.E o Doria é candidato a presidente. Meu compromisso é o apoio ao governo do Estado, desvinculado de Doria, até porque nesse sentido preciso conversar com o Kassab e com o presidente nacional do Avante (deputado federal Luis Tibé).

O sr. pode caminhar de forma separada com Kassab em São Paulo, que já afirmou que o PSD terá candidatura própria?

Não é difícil ele se somar à gente nessa campanha estadual, embora a meta dele seja mesmo candidatura a governador. E ele está procurando. Kassab é um político muito inteligente. Gostaria muito que no final das contas eu pudesse marchar junto com o Kassab em São Paulo, mas isso também depende do Rodrigo e do próprio Kassab.

Então o sr. pode garantir que, nesta eleição, não votará em uma chapa que terá o nome de Geraldo Alckmin?

Eu não tenho candidato a presidente. Não tenho nenhumcompromisso coma chapa Lula e Alckmin porque foge dos mais de 30 anos de história política que eu construí. E as pessoas que estão comigo também não aceitam Lula.

O que o sr. acha que aconteceu para que Alckmin decidisse abandonar o projeto estadual para embarcar na chapa presidencial com Lula?

Influência negativa de terceiros que nada fizeram por ele nesses últimos quatro anos em que ele ficoude fora do cenário político. Eu passei todo esse período o defendendo na Assembleia.

Influência de quem?

Gabriel Chalita (ex-secretário estadual de Educação), por exemplo. O presidente do PSB, Carlos Siqueira, e um pouco também o Márcio França. A pergunta que faço é onde estavam nos últimos anos? Em que caverna estava escondido o Chalita? Onde estava quando o Geraldo Alckmin ficou sozinho e foi massacrado? A própria bancada do PT dizia que eu estava sozinho na defesa do ex-governador. A amizade não pode ser apenas nas flores. Tem que ser também nos espinhos.

O sr. sempre fala da importância da lealdade. Nesse sentido, dá para dizer então que Alckmin o traiu?

Não diria que ele me traiu. O que posso dizer é que elenão me deu nenhuma explicação. Eu acho que merecia uma explicação. Se existe alguém neste País que merecia uma palavra dele sou eu. E não tive isso.Da mesma forma que não o consultei na hora de defendê-lo. Fiz isso porque era minha obrigação, como amigo e parceiro leal. Ele não me disse diretamente que pretende ser vice do Lula.E eu acho que merecia ter ouvido isso dele. Eu teria feito isso, em nome do que eu mais prego, que é lealdade.

Há alguma mágoa?

Não. E nem estou triste com ele, muito menos bravo. Para mim, ele continuará sendo meu amigo.Mas nessa fraternidade terá esse ponto de interrogação. Por que, depois de tanta prova de amizade e carinho, ele não me avisou que iria tomar esse outro caminho? Precisei ouvir comentários atravessados. Tive que ouvir deum deputado do PT que eu era o último a saber da aliança. O Geraldo é um homem de bem, mas deveria ter falado para mim. Ele tem o direito de escolher o caminho que quiser. Mas não é o mesmo que o meu.

Então o sr.concorda que pelo menos ele não foi correto com o senhor?

Ele se omitiu diante de uma regra básica da vida, que é manter lealdade com os irmãos. Que não informasse para ninguém, mas que tivesse me falado. Ainda assim, falando da viabilidade da chapa Lula e Alckmin, acredita em favoritismo? É uma chapa nova, onde dois inimigos ferrenhos por 30 anos se unem sob a alegação de que o País precisa de mudanças. A carreira que o Geraldo teve foi brilhante e o povo merecia uma outra explicação e não apenas um anúncio. Não há qualquer explicação. É uma opção dele. Respeito, mas não vou segui-la.

Como o sr. vê essa polarização entre Lula e Bolsonaro?

Vejo com muita preocupação, porque essa tal de terceira via se confunde com a quarta via e com a quinta via. Nunca vi tantas vias na minha vida. E quem é a terceira? Quem é a quarta? E ainda aparece um exj-uiz de Direito, o Sergio Moro (Podemos).

Qual sua avaliação sobre Sergio Moro?

Vou dizer apenas um detalhe: o CNJ (Conselho Nacional de Justiça) decidiu que o magistrado que não tem casa própria pode fazer uso de auxílio-moradia. Ele tem apartamento em Curitiba e recebia auxílio-moradia. Não precisaria dizer mais nada sobre ele. Como explicar o fato de um homem que dizia amar o Judiciário decide entrar na política? Como explicar que o rei da (Operação) Lava Jato foi se tornar assessor da empresa que presta consultoria à Odebrecht? A candidatura do Sergio Moro é oportunista.

Significa, então, que hoje nenhum dos nomes colocados é uma opção a presidente para o sr.?

Tenho que aguardar o posicionamento do Avante nacional. Depois disso, vou dedicir qual rumo seguir. Hoje já sei em quem não vou votar: nem Lula, nem Bolsonaro, nem Doria nem Moro.

O senhor está em seu oitavo mandato na Assembleia. Pretende disputar mais um mandato?

Sou pré-candidato a deputado estadual e tenho o compromisso de transformar o Avante em um dos maiores partidos do Estado. Sou recordista com oito mandatos consecutivos. Como eu acho que quem envelhece é o espírito e não o corpo, quem sabe o campismo, a força desse grupo, pode me ajudar a pensar em eleições majoritárias no futuro

Raio X
Nome
: Antônio Carlos de Campos Machado
Local de nascimento: Cerqueira César (São Paulo)
Formação: Direito
Hobby: assistir aos jogos do Palmeiras
Profissão: advogado criminalista
Onde trabalha: Assembleia Legislativa de São Paulo 




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