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Estudo vê negros nas novelas
Mauro Fernando
Do Diário do Grande ABC
24/12/2000 | 13:05
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Sem traços de sectarismo, Joel Zito Araújo cumpre o que promete o título de seu livro Negaçao do Brasil - O Negro na Telenovela Brasileira (Senac Sao Paulo, 323 págs., R$ 28). Ou seja, um estudo com um olhar próprio, mas nem de longe inadequado, sobre a sociedade brasileira - de formaçao multirracial, como se sabe - por meio da telenovela, gênero ficcional de presença marcante no país. E, talvez, o mais forte dos braços da indústria cultural, pela capacidade de difusao de signos de toda espécie.

O texto, originalmente tese de doutorado, vem livre de termos acadêmicos que dificultam a leitura. A reproduçao de depoimentos, as referências bibliográficas, as fotos de atores em cena e, principalmente, o estilo objetivo do autor enriquecem a ediçao.

Araújo nota que, para os negros na telenovela brasileira, a década de 60 transcorreu sob a marca do estereótipo: a empregada doméstica, o malandro carioca, a mulata sedutora. Papéis subalternos em produtos de consumo cultural que banalizam conflitos e reduzem a sociedade a dramalhoes com final feliz.

Um ator branco, Sérgio Cardoso, foi escalado para interpretar o protagonista de A Cabana do Pai Tomás, um negro. Araújo descreve com detalhes o episódio, incluindo a pressao do patrocinador (uma multinacional do ramo de higiene e limpeza) e os protestos liderados por Plínio Marcos.

Já nos anos 70, quando floresceu o mito cultural de que a acumulaçao de bens é conseqüência do nível educacional-científico do indivíduo, foram introduzidos nas tramas os personagens negros de classe média. Mas os papéis continuavam periféricos, sem importância nos enredos. Araújo observa que os negros enfrentavam obstáculos quando viviam romances inter-raciais. Raramente era colocada a questao da ascensao social.

As histórias nao apresentavam conflitos raciais sérios, mas situaçoes em que aflorava o preconceito, nas quais os negros reagiam à discriminaçao sempre com polidez, às vezes com indignaçao, nunca com revolta.

Araújo repassa também as décadas de 80 e 90, nas quais se assistiu a um controlado crescimento do número de atores negros nas telenovelas, sem que se alterasse o perfil dos personagens. O autor conclui que a telenovela, antes de se situar como um microcosmo representativo da sociedade, coloca-se como cúmplice da "persistência do ideal do branquecimento" e do "desejo de euro-norte-americanizaçao dos brasileiros".

A pesquisa engloba o período 1963-1997. A primeira telenovela, descendente da radionovela e do folhetim do século XIX, surgiu em 1951, no ano seguinte à introduçao da TV no Brasil. Mas o gênero tornou-se diário somente em 1963.




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