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Missa do trabalhador vai ser apenas virtual

Celebração, que completa 40 anos, será realizada com a igreja vazia pela primeira vez

Por Yara Ferraz
Flávia Kurotori
do Diário do Grande ABC
01/05/2020 | 00:09
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A tradicional missa do trabalhador no Grande ABC vai acontecer de um jeito diferente hoje. A celebração do 1º de Maio, que completa 40 anos, terá os bancos da Igreja Matriz de São Bernardo vazios pela primeira vez e será transmitida ao vivo pelas redes sociais, a partir das 9h30, devido à pandemia causada pelo novo coronavírus.
A edição de estreia, realizada em 1980, foi histórica e reuniu aproximadamente 100 mil pessoas, que ocuparam toda a praça na frente e o entorno da igreja. Na data, os trabalhadores da região estavam em greve geral e a celebração, presidida por dom Claudio Hummes – amigo pessoal do papa Francisco e atual cardeal da Igreja Católica –, serviu como marco do início do movimento sindical, que tinha como um dos principais representantes o ex-presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva (PT) – que não participou porque havia sido preso pelo Dops (Departamento de Ordem Política e Social). Em 1979, havia acontecido o primeiro grande ato, que reuniu 120 mil trabalhadores no Estádio da Vila Euclides.

O metalúrgico aposentado Nelson Campanholo, 81 anos, contou que na época ele era o único integrante da diretoria do SMABC (Sindicato dos Metalúrgicos do ABC) que não estava preso e foi o responsável pela organização da celebração, junto com dom Claúdio. “Participaram 100 mil pessoas, que não couberam na igreja, Era difícil até chegar na igreja, e a polícia fez um cordão de isolamento”, lembrou.

Desde então, a missa é marcada pela presença de lideranças sindicais e políticos, além de lembrar lutas e conquistas dos trabalhadores. São sempre cheias, Porém, neste ano, pela primeira vez na história, a missa será apenas on-line e transmitida pelo Facebook da Diocese de Santo André, em parceria com a Paróquia Nossa Senhora da Boa Viagem (a Matriz de São Bernardo), cujo pároco, padre Alejandro Cifuentes Flores, fará a celebração.<EM>

O bispo dom Pedro Carlos Cipollini, da Diocese de Santo André, também lembrou que hoje a Igreja celebra o dia de São José Operário. “É importante manter essa missa. Grande parte do operariado da região é católico e a igreja tem papel significativo na caminhada dos trabalhadores, principalmente no início da organização sindical, primeiro com o bispo dom Jorge Marcos (de Oliveira, primeiro bispo da Diocese), que incentivou e apoiou muito os trabalhadores, e também o dom Claudio (Hummes)”, disse.

Dom Pedro afirmou que a maior angústia do trabalhador atualmente é o desemprego e o medo de passar necessidade. “Antes da Covid-19, o Brasil já tinha alta taxa de desempregados. A pandemia pegou o Brasil em situação fragilizada e deve deixar grande crise.”

O ex-prefeito de Santo André João Avamileno, que na época da missa inaugural era trabalhador da Pirelli, contou que não conseguiu entrar na igreja e que “há 40 anos, muitas coisas importantes foram conquistadas, como a jornada de trabalho reduzida e reivindicações salariais. Hoje, a reivindicação principal é como gerar mais emprego”, disse.

Para Campanholo, outro debate importante é a tecnologia. “Na década de 70 havia 43 mil trabalhadores na Volkswagen, hoje tem em torno de 10 mil. A tecnologia é muito importante, mas reduziu o número de operários.”

Eduardo Suplicy (PT), ex-senador e atual vereador de São Paulo, que participou da primeira celebração, afirmou que agora “é muito importante assegurar aos trabalhadores total liberdade de sindicalização e de formação de sindicatos.”

Dia será de luta por direitos com ato nas redes sociais

Ainda que o novo coronavírus tenha alterado diversas diretrizes, o Dia do Trabalho não deixou de ser dedicado à reivindicação de direitos. Neste ano, a data ganhou novos motes devido ao cenário. Assim, o tema da ‘festa’ das centrais sindicais – ao vivo, a partir das 10h, nas redes sociais – é Saúde, Emprego, Renda: um Novo Mundo é Possível com Solidariedade.

“Nossa lógica está dentro do que estamos defendendo, que é o isolamento social. Este dia não pode passar em branco e, principalmente no atual cenário, requer o movimento sindical para pensar em como construir alternativas para o futuro”, afirma Wagner Santana, o Wagnão, presidente do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC.

“(Quando a crise passar) O uso de tecnologia e do teletrabalho vai aumentar, com certeza, mas precisamos manter os contratos de trabalho para garantir todos os direitos e evitar a precarização das relações trabalhistas”, avalia Belmiro Moreira, presidente do Sindicato dos Bancários do ABC.

Os dirigentes defendem que toda negociação seja feita com intermédio dos sindicatos, mesmo aquelas que permitem acordos individuais, como a MP 936, que permite redução de jornada e salários e suspensão temporária de contrato trabalhista. “Buscamos manter a liquidez salarial com aumento do vale-alimentação”, exemplifica Wagnão. Pelo menos 52 mil empregados da região estão operando sob condições diferenciadas.

Segundo Raimundo Suzart, presidente do Sindicato dos Químicos do ABC, o cenário valorizou os trabalhadores que não deixaram o País parar. “A quarentena está desmistificando a crença de que a automação irá acabar com a mão de obra humana, mostrando que as pessoas com cargos essenciais continuam trabalhando.”

Morador de São Bernardo, o montador Romeu Pereira da Silva, 37 anos, é funcionário de montadora na mesma cidade. Para ele, este é o momento para refletir como a economia será daqui em diante. “A economia vai ser lenta, independentemente do momento que retomarmos as atividades. Então, precisamos preservar a saúde, sem ela, não há economia.”

Ele costuma participar das atividades sindicais no Dia do Trabalho, além da tradicional missa. Neste ano, além de acompanhar as ações on-line, irá ajudar no drive-thru solidário promovido no estacionamento do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo, das 10h às 16h.




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