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Prefeituras escondem destino de dinheiro arrecadado com multas

De janeiro a junho, cinco cidades da região somam juntas mais de R$ 71 milhões; somente Santo André e Mauá detalharam uso da verba

Por Daniel Macário
Do Diário do Grande ABC
09/11/2015 | 07:00
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Anderson Silva/DGABC


Apesar de o artigo 320 do CTB (Código de Trânsito Brasileiro) prever que toda verba proveniente de multas deve ser revertida em prol de melhorias do sistema viário, gestores do Grande ABC escondem a destinação do montante milionário arrecadado com as autuações. Questionadas pelo Diário desde terça-feira sobre a aplicação da verba proveniente de infrações de trânsito, prefeituras da região, com exceção de Santo André, não detalharam onde investiram os valores.

Só para se ter uma ideia, de janeiro a junho, radares espalhados por cinco municípios do Grande ABC foram responsáveis pela aplicação de 692.028 multas. O número é 11,64% superior ao registrado no primeiro semestre de 2013.

Durante o período, cofres públicos de cinco municípios da região – Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra não se manifestaram – arrecadaram total de R$ 71, 3 milhões provenientes dessas autuações. Mesmo com todo o montante, ainda é precário o investimento público destinado a melhorias de sinalização e fluidez do trânsito das cidades, resultantes desses recursos contabilizados.

“Compare a arrecadação com a qualidade das ruas e sinalização.” A indignação do transportador escolar Douglas Pasquini, 36 anos, evidencia a dúvida que boa parte dos motoristas da região tem sobre o real destino da verba arrecadada com multas. Afinal, quem passa pela região nota o descaso com itens básicos para o bom funcionamento da Mobilidade Urbana no Grande ABC.

Buracos espalhados por ruas e avenidas, placas em estado precário de conservação, semáforos quebrados e, inclusive, faixas de pedestres sem pintura se tornaram problemas recorrentes na região.

Exemplo disso pode ser visto em Diadema. O município, que arrecadou só no primeiro semestre quantia superior a R$ 6,7 milhões com autuações ainda sofre com sistema viário precário, incluindo falta de sinalização para pedestres na Avenida Doutor Ulysses Guimarães, local onde está o radar campeão de multas no Grande ABC.

Em São Bernardo, a precariedade de placas de sinalização, muitas delas quebradas ou apagadas, também mostra a falta de investimento por parte do município em itens que deveriam garantir a segurança dos motoristas que trafegam pela região.

Para o advogado e presidente do Instituto Brasileiro de Ciências de Trânsito, Pedro Siqueira Matheus, a aplicação das verbas de multas ainda é algo que merece mais transparência. “Desde 1998 venho lutando para as prefeituras e órgãos responsáveis pela aplicação de autuações explicarem melhor o destino desse dinheiro. O atual cenário mostra que o investimento parece ser zero. Temos placas quebradas, ruas com buracos. O Ministério Público deveria ser mais duro em relação à fiscalização”, relata.

De acordo com o especialista, enquanto não houver regulamentação que obrigue a transparência no gasto desses valores, a população ficará com dúvidas sobre o destino do dinheiro.

A Prefeitura de Santo André informou que, dos R$ 31 milhões arrecadados, somente R$ 17,5 milhões já chegaram aos cofres da administração municipal. O restante ainda aguarda pagamento do autuado.

A quantia recebida foi aplicada nos seguintes setores: sinalização (R$ 5,1 milhões), processamento (R$ 5,6 milhões), fiscalização (R$ 3,2 milhões), Educação de Trânsito (R$ 1 milhão), custeio (R$ 1,1 milhão) e projetos (R$ 500 mil). Total de R$ 1 milhão ainda não foi gasto. Já em Mauá, o Executivo justificou que R$ 7 milhões foram gastos em sinalização, o equivalente a 44,5% da arrecadação. Já a folha de pagamento dos funcionários demandou R$ 2,9 milhões (18,5% do total).


Especialista diz que prefeitos podem ser indiciados por má gestão do recurso

Segundo o presidente da comissão de Direito viário da OAB-SP, Maurício Januzzi, a má gestão do dinheiro arrecadado pela aplicação de multas pode ocasionar aos gestores municipais responsabilidade por má administração da verba, que deveria ser revertida em prol do sistema viário.

“Atualmente sabemos o quanto é arrecadado, mas não sabemos o quanto é investido. O que é importante salientar é que a falta de atenção dos governantes na hora de divulgar o destino dessa verba com transparência pode acarretar em consequências legais. O governante pode ser responsabilizado por má administração e indiciado por improbidade administrativa.”

Segundo ele, o Ministério Público da região deveria seguir o modelo de São Paulo e atuar de forma mais rigorosa na fiscalização das prefeituras do Grande ABC.
 




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