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Fundação Casa abre unidade na surdina

Justiça afirma que unidade de semiliberdade não tem
licença para funcionar; jovens foram presos por furto

Por Cadu Proieti
Do Diário do Grande ABC
13/12/2012 | 07:00
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O primeiro dia de funcionamento da unidade de semiliberdade da Fundação Casa (antiga Febem) ontem, no Jardim do Mar, em São Bernardo, foi desastroso. Na surdina, dez jovens infratores deram entrada no abrigo socioeducativo, por volta das 21h de terça-feira. O local, segundo a Justiça, não tem Habite-se nem planta atualizada aprovada pela Prefeitura, e, sendo assim, não tem licença para funcionar.

Além da abertura irregular, segundo informações da Polícia Militar, dois internos fugiram da casa durante a madrugada e foram presos na manhã de ontem por furto. A chegada dos adolescentes e a fuga deixaram em pânico os vizinhos do imóvel, na Rua Mediterrâneo.

Na segunda-feira, a juíza Cristiane Vieira, da 5ª Vara da Fazenda Pública do município, extinguiu a ação movida pelos moradores da rua que visava impedir o funcionamento da unidade por falta do estudo de impacto de vizinhança. Segundo a juíza, o pedido não fazia sentido, uma vez que a Fundação Casa já estava impedida de se instalar por não atender série de exigências.

Na sentença, a magistrada apontou que a própria fundação reconheceu não ter apresentado a documentação necessária à Prefeitura. Ao Diário, a entidade afirmou possuir o alvará, sem, no entanto, apresentá-lo.

A medida socioeducativa em semiliberdade prevê que os jovens estudem e trabalhem durante o dia e retornem à casa para dormir. Dos dez adolescentes abrigados na terça-feira em São Bernardo, seis não estão inseridos em programas socioeducativos e são obrigados a permanecer dentro da casa o dia todo. Ontem, os outros quatro teriam saído pela manhã para cumprir as tarefas impostas pela Justiça, mas, até o fechamento desta edição, não haviam retornado ao abrigo, segundo a Fundação Casa. Os garotos devem voltar ao imóvel até às 23h59.

Não é o que conta a Polícia Militar. Na manhã de ontem, policiais prenderam dois jovens, um de 21 anos e outro de 14, que furtaram caixa registradora do Parque Cidade da Criança, localizado em frente ao abrigo. Segundo a corporação, a dupla havia fugido da unidade de semiliberdade durante a madrugada e se escondido no espaço de lazer.

Os policiais encontraram os dois suspeitos tentando abrir o objeto furtado em uma praça na esquina das ruas Banda e Tasman, por volta das 11h. A ocorrência foi registrada no 1° DP (Centro) do município. A equipe do Diário flagrou advogados da Fundação Casa e da Prefeitura, que administra o parque, na delegacia.

O jovem de 21 anos capturado teria antecedente criminal por porte de réplica de metralhadora e roubo. O menor cumpria medida socioeducativa por tráfico de drogas, segundo as autoridades.

A Prefeitura não se manifestou sobre o caso. A Fundação Casa e a SSP (Secretaria de Estado da Segurança Pública) não haviam confirmado se os internos apreendidos eram fugitivos da semiliberdade.

Para o presidente da Fundação Criança, Ariel de Castro Alves, o início das atividades sem o cumprimento de todas as determinações não é o adequado. Segundo Alves, a Fundação Casa ainda não inscreveu o plano de trabalho da unidade de semiliberdade no Conselho Municipal dos Direitos de Criança e do Adolescente de São Bernardo. "Isso é uma obrigatoriedade do ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente). Esse tipo de entidade não pode começar a funcionar às pressas", disse.

Moradores do bairro temem pela segurança

Após a fuga de dois jovens no primeiro dia de funcionamento irregular da unidade de semiliberdade da Fundação Casa no Jardim do Mar, em São Bernardo, os moradores do entorno estão temendo pela segurança no bairro. Na tarde de ontem, cerca de 20 munícipes da região se reuniram e dividiram relatos de indignação com o fato. Eles tentam impedir a instalação do equipamento no local na Justiça.

A advogada Simone Henriques, vizinha do imóvel locado para a entidade estadual, era uma das mais nervosas com a situação. A casa dela fica bem ao lado do abrigo socioeducativo. As janelas dos dormitórios dos adolescentes infratores dão visão a quase toda a residência de Simone. "Como vamos dormir sossegados desse jeito?", disse.

Enquanto conversava com a equipe do Diário ela chegou a chorar ao relatar a situação. "Tenho pressão alta, diabetes e sofro de depressão. Como vou conviver com um problema desses? Essa casa é minha vida. Não é só a questão do valor. Foram anos de trabalho para termos nosso espaço e conquistarmos esse estilo de vida. Como vou receber os amigos na minha área de descanso com janelas dos quartos de menores infratores em frente?", comentou.

Simone disse que durante a noite de terça-feira viu bastante movimentação no imóvel vizinho e ouviu conversa alta, mas não sabia do que se tratava. No dia seguinte, pela manhã, dois jovens chegaram a cumprimentar suas empregadas pela janela.

Ao saber da prisão de dois jovens da unidade, Simone entrou em desespero. Ela procurou uma empresa de segurança para contratar vigilante particular. "Já fui assaltada três vezes por menores e tenho medo. Estou até vendo apartamento e pensando em sair daqui."

Morando vai ao MP e fala em instaurar CPI na Assembleia

O deputado estadual Orlando Morando (PSDB) disse que irá entrar com pedido no Ministério Público para apuração de irregularidades no início de atividade na semiliberdade da Fundação Casa no Jardim do Mar, em São Bernardo. O parlamentar, que é da base do governo estadual, já havia pedido a saída de Berenice Giannella do cargo de presidente da entidade.

"Isso é uma vergonha. Não há alvará de funcionamento. Estão descumprindo uma sentença da juíza. Não estão respeitando o Poder Judiciário, iniciando trabalho no local sem as mínimas condições de uso do espaço", comentou Morando.

O deputado também disse que irá realizar levantamento da condição estrutural de todas as unidades de semiliberdade em todo Estado. Caso haja irregularidade também em outras cidades, o parlamentar promete abrir CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) sobre o caso. "A situação de São Bernardo pode estar ilustrando o que vem acontecendo em São Paulo."

De acordo com o presidente da Fundação Criança, Ariel de Castro Alves, além do Ministério Público, Conselho Tutelar e Conselho Municipal dos Direitos de Criança e do Adolescente devem fiscalizar o trabalho da entidade no município.




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