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CDPs da região têm riscos de rebeliões por lotação

De acordo com os especialistas, locais têm
condições que podem desencadear motins

Yara Ferraz
Do Diário do Grande ABC
23/01/2017 | 07:00
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Nario Barbosa/DGABC


A superlotação, ou superencarceramento, faz das unidades prisionais verdadeiros barris de pólvora sujeitos a explodir em rebeliões, como as que ocorreram em Amazonas, Roraima e Rio Grande do Norte, deixando quase 150 mortos. Guardadas as devidas proporções, é fato que os CDPs (Centros de Detenção Provisória) instalados no Grande ABC estão em linha com os chamados presídios de segurança máxima e podem, a qualquer momento, ser atingidos por levantes de presos que se amontoam em celas onde deveriam estar cerca de 15 pessoas, mas que abrigam mais de 30.

As quatro unidades da região – Santo André, São Bernardo, Diadema e Mauá – guardam 5.397, mas todos juntos deveriam ter 2.615. O caso mais gritante está em Santo André: são 1.395 prisioneiros onde deveriam estar 534.

A ameaça de rebeliões que paira sobre unidades prisionais superlotadas não pode ser descartada pelo poder público, alertam especialistas ouvidos pelo Diário, sobretudo por causa da falta de espaço.

“As rebeliões podem chegar até aqui. As condições de superlotação alimentam as facções, porque você gera condições insalubres no cárcere”, disse o especialista em segurança pública do Mackenzie Rio, Newton de Oliveira.

“Não há uma disputa de poderes, de facções, há uma disputa do poder pelo controle interno. Então pode ocorrer alguma movimentação em razão da superlotação, mas não na mesma intensidade. Ainda há um controle do Estado, mas ainda assim é preocupante”, destacou o professor José Vilmar da Silva, do curso de Direito da Universidade Metodista de São Paulo.

A coordenadora do departamento de atendimento ao preso da Defensoria Pública de São Paulo Maira Coraci Diniz cita que parte dos detentos é preso sem necessidade, por crimes sem violência ou tráfico de drogas, quando penas menores poderiam ser aplicadas. “É óbvio que se a ideia é ressocializar, se a pessoa fica com 40, onde poderia ter dez, ela vai sair ainda pior. No Estado são 30% de presos por tráfico de drogas. Na maioria pessoas que vendem para sustentar o vício e não grandes traficantes”, afirmou.

Para tentar diminuir o número de detentos, a SAP (Secretaria de Administração Penitenciária) realiza mutirões em parceria com a Defensoria Pública para análise dos pedidos de progressão de regime.
O governador Geraldo Alckmin (PSDB) afirmou que a situação do sistema prisional do Estado está sob controle, porém, reconheceu o problema da superlotação. “Vamos inaugurar, em 15 dias, a penitenciária de Votorantim, ao lado de Sorocaba, e com isso não vamos ter mais nenhuma mulher em cadeia ou distrito policial. Agora, concordo com a colocação de que é preciso acelerar a avaliação da progressão de pena. Muitos presos já poderiam estar em liberdade.”

HISTÓRIAS

Nos quatro endereços da região, todos com aviso de ‘área de segurança’, moradores e comerciantes têm opiniões diferentes sobre o local. Muitos não gostam, mas há quem sobreviva graças ao CDP.

Há nove anos vendendo objetos para que familiares montem o jumbo (kit de mantimentos), Márcia Maria, 35 anos, sabe muito bem o que é a rotina de visitar um ente querido na cadeia. Seu marido foi preso há nove anos. “Muitas pessoas me pediam para trazer algo, porque moro perto. Decidi fazer disso um empreendimento”, comentou. Em sua towner, no bairro Conceição, em Diadema, ela vende desde roupas até doces e desodorantes. O dinheiro que ganha, garante, dá para pagar as contas.

Instalado de frente para o mesmo local, o despachante Orlando João, 74, foi um dos que preencheu dois abaixos-assinados para a retirada do presídio. Ele, que reside e tem o seu negócio no bairro há 30 anos, não se conforma com o CDP por perto. Segundo ele, poderia ser uma escola: “Não adianta nada. Mas isso desvalorizou e muito o meu negócio. O movimento caiu 99%”, lamentou.

Em São Bernardo, no bairro Cooperativa, o casal Alessandra Nunes da Silva, 37, e Marcos Arnaldo, 28, tocam empreendimento iniciado pela mãe dele. Além de uma venda destinada à montagem dos jumbos, há uma pousada, para que as famílias que vêm de longe possam descansar enquanto esperam a hora da visita.

São pequenos colchões em uma tenda, com a oportunidade de assistir à TV. O preço é R$ 15. “O pessoal vem de longe e precisa de um lugar para descansar, porque chegam até de madrugada para a fila. A gente percebe que é uma vida de sofrimento e tenta ajudar o pessoal da melhor maneira”, disse ela.

Na Vila Carlina, em Mauá, o borracheiro Adão Lopes da Silva, 58, também comemora a clientela: “Sempre morei aqui, mas construí o meu negócio há 10 anos. Hoje tem uma movimentação maior de carros e muito mais clientes”, disse.

Vizinho da unidade de Santo André desde o início da construção, há cerca de 15 anos, o comerciante Romeo Capeci, 70, também não se incomoda: “Já teve rebelião, mas há muito tempo. Nunca tive problemas com eles (presos). Até acho o bairro mais seguro, porque fica passando viatura o tempo todo.” 




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