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Povo está decepcionado e ferido com política, diz bispo

Dom Pedro faz análise do cenário eleitoral e afirma que divisão do País só cessará com união dos poderes

Raphael Rocha
Do Diário do Grande ABC
09/09/2018 | 07:00
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Celso Luiz/DGABC


Bispo da Diocese de Santo André, que responde pelo Grande ABC, dom Pedro Carlos Cipollini nunca escondeu o gosto por debater as questões políticas. Em um processo eleitoral no qual ânimos estão acirrados e que demonstra fadiga do brasileiro com a classe política em geral, dom Pedro tem diagnóstico de que a sociedade brasileira está “ferida e decepcionada” e que a divisão do País só será revertida quando Executivo, Legislativo e Judiciário decidirem, com vontade política, fazer valer a Constituição Federal.

O Diário convidou o bispo a fazer reflexão da política nacional, a pouco menos de um mês para o primeiro turno, marcado para o dia 7. “O processo político atual está complicado. São muitos os fatores de desagregação que há tempo vêm atuando na nossa sociedade. O projeto de poder, quer pessoal ou de grupos, prevalece sobre o desejo de trabalhar pelo bem comum. É preciso resgatar a cidadania e o patriotismo”, analisa.

Não à toa, a Igreja Católica tem distribuído a seus fiéis cartilha pregando o voto consciente. São 70 mil exemplares com orientação a uma pesquisa séria dos candidatos a presidente, a governador, a senador e a deputados. A única frustração foi por conta da diminuição do número de unidades em relação a 2016, quando 150 mil panfletos foram entregues. “É a crise”, atesta o bispo.

“A Igreja Católica não encampa nenhum partido ou candidato em respeito à pluralidade de tendências de seus fiéis. Porém, mostra o que o Evangelho de Jesus Cristo propõe para quem deseja governar: ter espírito de serviço ao próximo e nunca de dominação ou exploração. A Igreja respeita a liberdade de cada um decidir: o primeiro tribunal eleitoral é a consciência de cada um”, relata dom Pedro, emendando que a decisão de distribuir as cartilhas foi tomada em conjunto com os padres da Diocese de Santo André. “A Igreja alerta para as consequências do voto. É preciso escolher candidatos honestos, com passado limpo de serviço efetivo ao bem comum. A Igreja é a favor de que se deve participar e votar, não anular o voto, mas correr o risco de exercer conscientemente a cidadania através do voto.”

Sobre o cenário nacional, dom Pedro mostra preocupação com o futuro do País, em especial pela divisão que se acentuou na acirrada eleição de 2014 – quando Dilma Rousseff (PT) venceu Aécio Neves (PSDB) com a menor margem de diferença de votos pós-redemocratização. Essa cisão só se agravou com o impeachment de Dilma, confirmado em 2016.

“O Brasil está dividido desde o tempo da colônia. Com a escravidão existia o andar de cima cheio de privilégios e o andar de baixo cheio de deveres e quase nenhum direito. Hoje temos uma democracia política mas não temos uma democracia social, que, se aplicada, todos seríamos reconhecidos como iguais perante as leis”, observa ele, que aconselha os governantes para a reunificação do Brasil. “Esta situação somente será revertida quando os que ocuparem os três poderes (Executivo, Legislativo e Judiciário) tiverem vontade política de colocar em prática o que diz a Constituição e outras ótimas leis. Nossas leis são continuamente postas de lado, escamoteadas por interesses particulares de pessoas e grupos que se articulam para manter privilégios.”

Dom Pedro também não esconde a preocupação com a crescente defesa da volta dos militares ao poder e relembrou como os direitos foram ceifados durante a ditadura, que se iniciou em 1964 e só terminou em 1985. “A sociedade brasileira está ferida e decepcionada. Sente-se traída por populistas e demagogos que traíram a confiança do povo. Prometendo um Brasil livre para todos, entregaram um Brasil mergulhado na corrupção e na vergonha. O apelo à volta dos militares é fruto do desespero e da desinformação de quem não viveu os anos de chumbo da ditadura. O progresso não se faz sem democracia. Por mais que o sistema democrático tenha defeitos é o melhor.”

O bispo finaliza a reflexão com o olhar do que o brasileiro espera do futuro presidente. “Nosso povo não exige muito, quer o básico que todo governo deve proporcionar: casa, comida, emprego, saúde... Existe recurso no Brasil para isso (a carga tributária é uma das maiores do mundo). O que falta é unidade em torno de projetos inteligentes e capacidade de levar avante esses projetos. Se o Brasil não melhorar e muito a Educação, não sairemos do lugar. A Educação na verdade não é prioridade de fato para os políticos ou partidos.” 




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