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Sto.André perde prazo para restaurar peça de Marx
Por Everaldo Fioravante
Do Diário do Grande ABC
16/12/2004 | 10:34
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A Prefeitura de Santo André perdeu a chance de ter neste ano o projeto Tapeçaria de Burle Marx - Restauração, Iluminação e Ação Educativa selecionado no Fundo Nacional da Cultura do MinC (Ministério da Cultura). A medida possibilitaria receber verba do governo federal para recuperação da monumental tapeçaria de Roberto Burle Marx (1909-1994) instalada e conservada de forma incorreta no Paço Municipal há anos. O Diário acompanha o caso desde 1993 e, a partir de 2001, reportagens registram promessas da atual gestão neste sentido.

Em março de 2001, logo que o primeiro escalão da atual equipe da Secretaria de Cultura, Esporte e Lazer de Santo André assumiu - o secretário, Acylino Belissomi, o secretário-adjunto, Alexandre Takara, e a diretora do Departamento de Cultura, Marta de Betânia Juliano - foi dito que uma das prioridades da Pasta seria a restauração. Os anos passaram, a gestão chega ao fim e a tapeçaria permanece do mesmo modo no 9º andar (Salão Nobre) do prédio que abriga a Prefeitura: encardida, cheia de dobras e esburacada por dezenas de pregos enferrujados que a sustentam na parede.

A diretora Marta de Betânia afirmou nesta quarta que "esta será uma dívida a ser quitada na próxima gestão". Ela admite a possibilidade de captar recursos junto à iniciativa privada em vez de "esperar a burocracia dos órgãos municipais, estaduais ou federais": "Passaram-se quatro anos, mas o compromisso terá continuidade".

O projeto de restauro, orçado em R$ 304 mil, foi entregue pela Prefeitura dia 26 deste mês na Representação Regional de São Paulo do MinC para concorrer a recursos do Fundo Nacional de Cultura. Mas já era tarde demais. No mesmo dia, o Fundo realizou um processo seletivo e o projeto de Santo André não concorreu. Agora, seguindo os trâmites burocráticos para tentar obter verba proveniente do Fundo, o projeto deve permanecer mais tempo parado. O próxima etapa de seleção deve ocorrer no ano que vem, mas sem data definida, e é impossível inferir se o tal projeto será aprovado para receber dinheiro do Fundo.

Delongas - "Acho que a Prefeitura de Santo André está delongando e temo que essa história se prolongue ainda mais. Essa restauração deve ser feita o quanto antes, porque depois fica pior, mais difícil, mais caro. Pelo que acompanhei nas reportagens do Diário, vê-se que até então nada foi feito para restaurar a tapeçaria", afirma o arquiteto e paisagista Haruyo-shi Ono, diretor da empresa de paisagismo Burle Marx & Cia, fundada em 1955 no Rio por Burle Marx, com quem Ono trabalhou de 1965 até 1994, data da morte do artista.

Em mensagem enviada ao Diário dia 2 deste mês, Ono lamenta a "inércia e o desinteresse do Departamento de Cultura e da Prefeitura de Santo André" em relação à tapeçaria. E arremata: "O que vemos é uma total desinformação cultural, inclusive da 'elite' governante que ocupa cargos de chefia e direção pelo Brasil afora".

Valor incalculável - No Brasil, só há tapeçarias de Burle Marx em dois locais públicos: na Prefeitura de Santo André e no Palácio do Itamarati, em Brasília. Na sala de banquetes do Itamaraty encontram-se cinco tapeçarias que medem 5m x 3m cada e que representam tipos de vegetação. Conforme Ono, ter essa tapeçaria deveria ser um motivo especial de orgulho para Santo André.

É uma composição sem título de valor praticamente incalculável. Data de 1969 e mede 3,5m x 26m. É o maior trabalho do gênero assinado pelo arquiteto paisagista, artista plástico e botânico autodidata paulistano Burle Marx. Bastante colorida, a peça tem tema abstrato.

Extremamente talentoso, Burle Marx nasceu em um casarão da avenida Paulista em 1909, filho de alemão e de uma pernambucana. Em 1913, a família Marx seguiu para o Rio. Burle Marx estudou canto e, depois, ao longo de sua vida, atuou como arquiteto, pintor, botânico, designer e, sobretudo, paisagista.

O artista cresceu em uma chácara localizada no Leme, lugar que lhe proporcionou o primeiro contato com variados aspectos da natureza: muita pedra, água corrente e vegetação natural. São elementos que literalmente revolucionaram os projetos paisagísticos de caráter conservador. Burle Marx, assim, tornou-se mundialmente conhecido e respeitado.

Entre o círculo de amigos de Burle Marx estavam Pablo Neruda, Oscar Niemeyer, Gilberto Freyre, Cícero Dias, Candido Portinari, Vinicius de Moraes e Rino Levi, este o arquiteto com quem assina o projeto do Paço de Santo André.




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