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Questão ética está na peça 'Executivos'
Por Cássio Gomes Neves
Do Diário do Grande ABC
01/10/2005 | 07:57
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A falta de ética ou a ética entortada pelas necessidades pessoais e/ou econômicas? Uma dúvida que inquieta o espetáculo Executivos de ponta a ponta. Obra do grupo Tapa, uma das trupes mais bem reputadas do país, a montagem incrementa a programação teatral do Grande ABC neste e no próximo fins de semana: neste sábado e domingo, está em cartaz no Teatro Municipal de Mauá; nos dias 8 e 9, segue para o Lauro Gomes, em São Bernardo. Adaptada de texto do francês Daniel Besse por Clara Carvalho e dirigida por Eduardo Tolentino de Araújo, questiona os códigos morais da atualidade com uma valentia crítica singular.

"Executivos é, na verdade, uma fábula que faz uma amostragem de uma nova ética existente no mundo de hoje. Conceitos éticos que condizem com os tempos sombrios que vivemos", diz o diretor Tolentino. Para não perder-se na flutuação conceitual, cabe aqui sintetizar o entrecho: diretores da Delta Espace, uma multinacional francesa que atua no mercado bélico, protagonizam um vaivém de conspirações e cartadas não muito escrupulosas enquanto arquitetam estratégias para suportar a concorrência com uma empresa norte-americana.

Nas entrelinhas de Executivos há um hipertexto urgente, que remete ao debate que ferve na sociedade civil brasileira: o desarmamento, que será submetido a referendo popular em 23 de outubro. No viveiro de canalhas que é a Delta Espace, essa especificidade de comercializar armas só acentua a nova ética modelada segundo demandas econômicas. "Uma das executivas da peça diz que o importante é construir armas mais precisas para uma guerra mais limpa. Quanto mais científica for a guerra, menos valor tem a vida humana", afirma Tolentino.

Mas não se trata de uma questão de segmentação. O que o Tapa quer é registrar que a arbitrariedade de um veredicto decidido em torno de uma távola de reuniões, ou de uma mesa de restaurante que cobra milhares de dólares por 750 ml de vinho, ou sobre o gramado de um campo de golfe, é capaz de determinar ou condescender com uma estrutura social tão firme quanto castelo de cartas. Executivos tem como cenário uma indústria bélica, mas bem poderia ser uma empresa de outra natureza no lugar. "O público do Grande ABC é importante para nós, porque essa é uma região fabril, e a discussão que a gente vai levar para aí é bastante pertinente. Uma coisa muito próxima, de fácil identificação para quem trabalha em firma", conclui o diretor.

Apesar do tema, Executivos envereda pela ironia, pelo bom humor, para retratar essa bússola ética que já não aponta para o norte faz tempo. A inclinação ao cômico não pretende mastigar nada para o espectador; configura-se num estimulante para a reflexão por parte do público. E, no fim das contas, sublinha o quão preocupante é o panorama moral aqui e agora. Mais que pessimista, Executivos é quase documental.

Executivos - Espetáculo de teatro do grupo Tapa. Direção de Eduardo Tolentino de Araújo. Neste sábado, às 21h; domingo, às 19h, no Teatro Municipal de Mauá - r. Gabriel Marquês, s/nº. Tel.: 4555-0086. Ingr.: de R$ 15 (assinantes do Diário) a R$ 30. Dia 8, às 21h; dia 9, às 19h, no Teatro Lauro Gomes - r. Helena Jacquey, 171, São Bernardo. Tel.: 4368-3483. Ingr.: de R$ 15 a R$ 30.




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