Ator de incomparável versatilidade, sedutor magnífico, comediante de riso inconfundível, sua figura atravessou 50 anos de carreira nas telas do mundo todo.

Filho de austríaco e de uma italiana campea de basquete, Vittorio Gassman nasceu em Gênova (Norte da Itália), em 1º de setembro de 1922. Incentivado por sua mae, que descobriu seu talento de ator, abandonou os estudos de direito e entrou para a Academia de Arte Dramática de Roma.

Em 1943, estreou no teatro de Milao. Seu amor pelos palcos tornou-se eterno, e fundou sua própria companhia, Il teatro d'Arte em 1948.

Depois de uma série de papéis no teatro trágico (``Um bonde chamado desejo', ``Hamlet', ``Édipo Rei'), o cinema interessou-se por ele em 1946. Com poucas exceçoes como ``Riso Amaro' , seus 35 primeiros filmes foram ``horríveis', segundo suas próprias palavras.

Foi Mario Monicelli que o revelou ao mundo em 1958, con ``Uma dupla irreverente' (I soliti ignoti). Gassman causou furor com seu papel de ladrao lamentável.

Gassman no geral interpretou personagens marcados como machista, cínico, egoísta e fanfarrao, mas podia passar registros opostos, e naturalmente passar ironia, tragédia, ternura e crueldade.

De sua imensa filmografia, destacam-se os filmes feitos sob a direçao de Dino Risi, como ``Sua excelência, o trapaceiro' (Il Mattatore, 1959), ``Aquele que sabe viver' (Il Sorpasso, 1962), ``Os monstros' (I Mostri, 1963). También sob direçao de Risi, de quem foi parceiro inseparável, rodou ``Perfume de mulher' (Profumo di donna, 1974), ``Almas perdidas' (Anima persa, 1976) e ``Caro papá' (1978). Com ``Perfume de mulher', obteve o prêmio de melhor interpretaçao no Festival de Cannes em 1975.

Uma de suas interpretaçoes mais saborosas foi em ``O incrível exército de Brancaleone' (L'armata Brancaleone, 1965), de Monicelli, ou em ``I nuovi mostri' (1977).

Ettore Scola, um dos cineastas com quem mais trabalhou, fez com ele a nostálgica ``Nós que nos amávamos tanto' (C'eravamo tanto amato, 1974), ``O terraço' (La Terrazza, 1979) e ``La Famiglia', em 1986.

Vittorio Gassman, cuja filmografia conta com 140 obras, cinco delas como diretor, rodou nos Estados Unidos, onde ficou casado durante um certo tempo com Shelley Winters.

A crise do cinema italiano nao reduziu a atividade deste artista incansável, que participou de séries de televisao, onde exibiu todo seu talento para viver todo tipo de personagens.

Seus dotes de ator foram apreciados também no estrangeiro: nos Estados Unidos trabalhou com Robert Altman, em ``Cerimônia de casamento' (A wedding, 1978), na França, com Alain Resnais, em ``La vie est un roman' (1983), na Bélgica, com André Delvaux ``Benvenuta' (1984).

Apesar do intenso trabalho cinematográfico, encontrava tempo para dirigir cursos de arte dramática, para interpretar nos palcos teatrais obras que o apaixonavam, como ``Kean' e ``Otelo', e para escrever suas próprias obras, como ``Um grande futuro atrás de mim'.

Em fevereiro de 1999, despediu-se dos palcos com um comovente espetáculo no teatro Sistina de Roma, no qual leu Pirandello, Shakespeare e Edmund Kean, recitou poesias e falou da morte. ``A morte nao me deixa obcecado, me desagrada', disse, recitando um poema de Boris Vian.

Dirigindo-se aos jornalistas, acrescentou: ``Escrevam de mim o que quiserem. Basta que comecem dizendo: era o melhor'. Este artista completo, que falava e atuava em quatro idiomas, também era um solitário, apesar dos três casamentos e quatro filhos.

Cerimônias - O enterro de Gassman será realizado no sábado, em Roma. O velório acontece na manha de sexta, na Prefeitura de Roma. O corpo de Gassman será incinerado.

Numerosos cineastas, atores e amigos do ator foram à residência romana onde morava Gassman, para apresentar os pêsames à viúva, Diletta D'Andrea, e a seus quatro filhos, nascidos de três casamentos: Paola, Victoria, Alessandro e Jacopo.

Entre os primeiros a chegar, estavam o cineasta Marco Risi e a atriz Francesca D'Aloja.

A atriz Monica Vitti, que foi aluna de Gassman na Academia de Arte Dramática, chegou à residência às 13h locais. ``Trabalhar e estudar com ele era magnífico, algo que nao se esquece', disse.

``Foi um grande homem, uma grande sensibilidade. Sua maior qualidade foi enfrentar a vida com inteligência, sensibilidade e cultura', declarou por sua parte o diretor Francesco Rosi, que também compareceu para dar os pêsames à família Gassman.

Um dos mais famosos cineastas com os quais Gassman trabalhou, Mario Monicelli, 85 anos, preferiu nao fazer declaraçoes, enquanto o ator Alberto Sordi, que trabalhou em muitos filmes junto com Gassman, evocou algumas lembranças de filmagem.