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Restrições emperram adoção

Região tem hoje 27 crianças aptas a ganhar novo lar,
mas só 4 estão dentro do perfil considerado aceitável

Natália Fernandjes
Do Diário do Grande ABC
25/05/2015 | 07:00
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Denis Maciel/DGABC


As restrições impostas pelos pretendentes à adoção, principalmente em relação à idade, são o principal entrave para que crianças abrigadas possam ganhar novo lar. Dessa maneira, ainda que haja média de 5,9 futuros pais à procura de seu filho ou filha em relação ao total de crianças disponíveis no Cadastro Nacional da Adoção, do CNJ (Conselho Nacional de Justiça), muitas são preteridas e destinadas a passar toda a infância e adolescência nos abrigos, longe do convívio familiar.

O Grande ABC tem hoje, Dia Nacional da Adoção, 27 crianças aptas a ganharem novos pais. No entanto, apenas quatro delas têm menos de 10 anos, o que significa mais chances de serem aceitas pelos pretendentes. Conforme o cadastro, nove delas estão abrigadas em São Caetano (quatro com idade entre 11 e 15 e cinco acima dos 15), sete em Diadema (duas entre 6 e 10 anos e cinco entre 11 e 15), quatro em Mauá (duas entre 6 e 10 anos e duas acima de 15), duas em Santo André (acima de 15 anos), duas em São Bernardo (entre 11 e 15), duas em Ribeirão Pires (acima de 15) e uma em Rio Grande da Serra.

Na esfera nacional, são 5.634 menores à espera de um lar, sendo apenas 2,6% com idade até 3 anos. Em contrapartida, 70% das pessoas cadastradas desejam abrigados com essa faixa etária e apenas 10% aceitam crianças com mais de 5 anos.

O juiz da Vara da Infância e Juventude de São Bernardo Luiz Carlos Ditommaso afirma que são realizadas, em média, 30 adoções por ano na cidade. Segundo ele, embora haja trabalho de conscientização por parte de grupos de auxílio e também durante curso de preparação dos pretendentes, a adoção de crianças com idade a partir de 7 anos é exceção. “É preciso entender que não estamos falando de uma indústria onde se produz conforme a demanda”, pondera.

O magistrado diz que a cultura de ampliar o perfil da criança a ser adotada é “trabalho de formiguinha”. Segundo Ditommaso, quanto menos exigências o pretendente tiver, mais rápido é o processo. “Já tivemos casos de espera de apenas dois meses e outros de até um ano.”

A contribuição para que as chamadas adoções necessárias – tardia, inter-raciais e de crianças com irmãos – aconteçam é uma das tarefas do GAA (Grupo de Apoio à Adoção) Laços de Ternura, mantido pela Feasa (Federação de Entidades Assistenciais de Santo André), destaca a coordenadora técnica, Maria Inês Villalva. “A preferência está mudando com o passar do tempo, mas, apesar da evolução, os preconceitos ainda existem”, lembra.

O integrante do Condeca (Conselho Estadual dos Direitos da Criança e do Adolescente) e coordenador da Comissão da Infância e Juventude da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) São Bernardo, Ariel de Castro Alves, ressalta que outro problema é a lentidão no processo de destituição do poder familiar. Ele considera que seis meses é o prazo ideal para que os juízes cumpram todas as etapas da tentativa de fazer com que o menor permaneça na família de origem ou extensa, conforme obriga a lei 12.010, de 2009.

Para Ditommaso, apesar de ser conhecida como Lei da Adoção, a legislação reforça a proteção da família de origem, até mesmo de maneira exagerada, ao invés de incentivar de fato o processo adotivo. “Respondemos pelos atos que praticamos, mas a lei não cobra responsabilidade dos pais. Assim, o tempo vai passando e as crianças permanecem abrigadas”, comenta.

‘Ela nasceu para a gente’, diz mãe adotiva

Demorou quatro anos e dois meses para que o casal formado pela babá Alessandra Tavares, 35 anos, e pelo jornalista George Tavares, 43, tivesse concretizada a adoção da pequena Beatriz, 5. Após longo e burocrático processo judicial, a única certeza dos moradores da Vila Conceição, em Diadema, é que tudo valeu a pena. “Já sabíamos que ela era nossa. Apesar de toda a angústia durante esse período, tinha plena certeza de que ela nasceu para a gente”, destaca a mãe.

Junto há 16 anos, o casal sempre teve em mente a ideia de ter dois filhos, sendo um biológico e um adotivo. No entanto, o destino traçou planos diferentes para os dois. Após 11 anos de tentativas de engravidar, incluindo uma inseminação artificial sem sucesso, Alessandra e George ficaram sabendo de uma mulher que queria doar o bebê na Bahia. “Viajei para lá e acompanhei o fim da gestação e o parto. Assim que ela nasceu, dei entrada no processo para adoção”, revela Alessandra.

A única exigência era ter uma menina. “Não mudou em nada meu desejo de tê-la quando vi que ela seria negra. Alessandra destaca que foi amor à primeira vista. “Valeu a pena esperar 11 anos para conhecer ela”, garante. Ela acrescenta ainda que a família, infelizmente, chega a ser alvo de preconceito, tendo em vista que o casal é branco e a filha é negra. “Sentimos os olhares curiosos e até mesmo preconceituosos durante os passeios”, observa.

O desejo do casal de ter um filho biológico passou. Agora, eles estudam nova adoção. “Só posso dizer àqueles que estão na fila para adotar que não desistam. Que corram atrás do sonho e não adotem por dó, mas por amor. Vale a pena”, resume Alessandra.




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