Aos 74 anos de idade e 50 de carreira, Nathália é declaradamente avessa a entrevistas. Atualmente, a atriz se divide entre as gravações de Celebridade e a excursão da peça Melanie Klein, em que interpreta a famosa psicanalista. Graças à insistência de seus produtores, Nathália concordou em celebrar o meio século de trabalho com uma biografia, que será escrita pela também atriz Tuna Dwek. Ao contrário da vaidosa Yolanda, no entanto, Nathália não é a melhor promotora de si mesma. “Acho que a Tuna terá muito trabalho. Tenho fugido dela. Definitivamente, não sou meu assunto favorito”, dispara.
Pergunta – Sua carreira é pontuada por vilãs inesquecíveis. Você gosta de personagens de caráter duvidoso?
Nathália Timberg – Gosto de fazer o que é bom, não importa que seja a vilã ou não. Acho até muito primária esta história de ser vilã ou ser mocinha. E a Yolanda não chega a ser uma vilã. É uma pessoa que tem falhas de caráter, uma mulher de sociedade, em situação de decadência econômica, que tenta se sustentar com a experiência que tem. Ela tem uma ética bastante elástica, mas não chega a ser mau-caráter.
Pergunta – Como foi o processo de composição da Yolanda?
Nathália – Não existe muito esta diferença de composição de uma personagem para outra. A não ser, é claro, que você tenha uma personagem com características específicas. Mas o mundo da Yolanda é este mundo em que vivemos aqui, tenho contato com ele diariamente. Ela é uma mulher que fala bem, tem uma formação, é viajada. Isso tudo fornece elementos para a construção.
Pergunta – Mas, no teatro, certamente seu trabalho de composição é diferente.
Nathália – A abordagem não se altera. O que se altera é o aprofundamento. O trabalho no teatro vai em camadas muito mais profundas que a televisão. Na TV, o desenvolvimento da personagem é uma obra aberta, caminha junto com o autor. É uma troca muito interessante que se faz: o autor recebe o seu trabalho, devolve de uma forma diferente. É um trabalho desenvolvido em conjunto e à distância. Já no teatro você tem uma proposta de um trabalho que vai se aprofundando em camadas. A personagem evolui para dentro.
Pergunta – Como você avalia as mudanças da profissão nesta ‘era das celebridades’?
Nathália – Nossa profissão está glamourizada. As pessoas que buscam ser atores nem sempre estão preocupadas em saber o que vão expressar. Muitos buscam uma passarela, uma forma de exibição, não têm preocupação alguma além de um retorno que imaginam ser fácil. A gente vê muitos atores mais interessados em levar sua cama para os jornais que em qualquer trabalho. Acho negativa esta vitrina em que o ator está exposto, porque distorce as coisas. O glamour tem pouco a ver com o trabalho e muito com a imagem pública. Quem tem alguma coisa a dizer no seu trabalho não precisa ficar falando da sua vida privada.
Pergunta – Um marco como 50 anos de carreira é um assunto profissional e interessante.
Nathália – São 50 anos, podiam ser 49, 47, 62. É claro que é um momento de maturidade. Mas, para mim, é um momento de vida, que não tem marco, não tem dia.
Pergunta – Como é sua relação com o tempo?
Nathália – Acho que o tempo é muito injusto com os atores, porque você passa 70% da sua vida sem ser você. Então, há dias em que acordo e tomo um susto. Não me sinto com a idade que tenho. Tomo sustos quando vejo que cheguei a esta idade, porque não tenho estes marcos do tempo. Ou tenho às vezes, quando olho minha agenda e vejo quanta gente já se foi. Isso me assusta porque acho que ainda tenho tudo para aprender, tudo para fazer. E está acabando meu tempo.
Pergunta – Você acha que sentiria de outro modo caso não fosse atriz?
Nathália – Acho que todo mundo sente um pouco isso, mas nós, atores, ficamos mais sensíveis a estas coisas. Porque nossa profissão exige um abandono de nós mesmos. Meu eu fica em casa quando vou para o teatro. Chego lá e tenho de criar o universo do meu espetáculo, depois vou para o estúdio e tenho de criar o universo da novela. É curioso você passar um tempo enorme da sua vida se emprestando a outros seres, a outras vidas. E, ao mesmo tempo, você tem de ser uma pessoa muito antenada, tem de viver sua época e estar absolutamente ligada a ela. É uma ambivalência curiosa.
Pergunta – O que é mais difícil na profissão para você?
Nathália – É lidar com este lado administrativo da carreira. Talvez por isso eu seja tão esquiva a entrevistas. Faço muita questão de preservar o pouco meu que tenho: o direito de ficar em casa, fazendo nada, lendo, ouvindo música. Não tenho nada a esconder, levo uma vida absolutamente simples, mas é minha. Acho que o ator já se dá muito neste tipo de trabalho, porque entra com toda sua sensibilidade, física e mentalmente. Então, tem um pedacinho que deve ser preservado.
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