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Nathália Timberg: a sagaz Yolanda Mendes de 'Celebridade'
Renata Petrocelli
Da TV Press
29/05/2004 | 16:16
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Quando recebeu o convite de Gilberto Braga para entrar em Celebridade, novela das nove da Globo, Nathália Timberg imaginou que fosse se deparar com mais uma típica megera, como tantas que marcaram sua carreira. Só em novelas do mesmo autor foram duas: Constância Eugênia, de O Dono do Mundo, e Idalina Silveira, de Força de um Desejo. Mas a sagaz Yolanda Mendes surpreendeu a atriz com suas doses de humor e com o que ela classifica de ética flexível. “Ela faz de tudo para sobreviver, mas não é malévola. É incrível como o público gosta dela”, destaca a atriz.

Aos 74 anos de idade e 50 de carreira, Nathália é declaradamente avessa a entrevistas. Atualmente, a atriz se divide entre as gravações de Celebridade e a excursão da peça Melanie Klein, em que interpreta a famosa psicanalista. Graças à insistência de seus produtores, Nathália concordou em celebrar o meio século de trabalho com uma biografia, que será escrita pela também atriz Tuna Dwek. Ao contrário da vaidosa Yolanda, no entanto, Nathália não é a melhor promotora de si mesma. “Acho que a Tuna terá muito trabalho. Tenho fugido dela. Definitivamente, não sou meu assunto favorito”, dispara.

Pergunta – Sua carreira é pontuada por vilãs inesquecíveis. Você gosta de personagens de caráter duvidoso?
Nathália Timberg – Gosto de fazer o que é bom, não importa que seja a vilã ou não. Acho até muito primária esta história de ser vilã ou ser mocinha. E a Yolanda não chega a ser uma vilã. É uma pessoa que tem falhas de caráter, uma mulher de sociedade, em situação de decadência econômica, que tenta se sustentar com a experiência que tem. Ela tem uma ética bastante elástica, mas não chega a ser mau-caráter.

Pergunta – Como foi o processo de composição da Yolanda?
Nathália – Não existe muito esta diferença de composição de uma personagem para outra. A não ser, é claro, que você tenha uma personagem com características específicas. Mas o mundo da Yolanda é este mundo em que vivemos aqui, tenho contato com ele diariamente. Ela é uma mulher que fala bem, tem uma formação, é viajada. Isso tudo fornece elementos para a construção.

Pergunta – Mas, no teatro, certamente seu trabalho de composição é diferente.
Nathália – A abordagem não se altera. O que se altera é o aprofundamento. O trabalho no teatro vai em camadas muito mais profundas que a televisão. Na TV, o desenvolvimento da personagem é uma obra aberta, caminha junto com o autor. É uma troca muito interessante que se faz: o autor recebe o seu trabalho, devolve de uma forma diferente. É um trabalho desenvolvido em conjunto e à distância. Já no teatro você tem uma proposta de um trabalho que vai se aprofundando em camadas. A personagem evolui para dentro.

Pergunta – Como você avalia as mudanças da profissão nesta ‘era das celebridades’?
Nathália – Nossa profissão está glamourizada. As pessoas que buscam ser atores nem sempre estão preocupadas em saber o que vão expressar. Muitos buscam uma passarela, uma forma de exibição, não têm preocupação alguma além de um retorno que imaginam ser fácil. A gente vê muitos atores mais interessados em levar sua cama para os jornais que em qualquer trabalho. Acho negativa esta vitrina em que o ator está exposto, porque distorce as coisas. O glamour tem pouco a ver com o trabalho e muito com a imagem pública. Quem tem alguma coisa a dizer no seu trabalho não precisa ficar falando da sua vida privada.

Pergunta – Um marco como 50 anos de carreira é um assunto profissional e interessante.
Nathália – São 50 anos, podiam ser 49, 47, 62. É claro que é um momento de maturidade. Mas, para mim, é um momento de vida, que não tem marco, não tem dia.

Pergunta – Como é sua relação com o tempo?
Nathália – Acho que o tempo é muito injusto com os atores, porque você passa 70% da sua vida sem ser você. Então, há dias em que acordo e tomo um susto. Não me sinto com a idade que tenho. Tomo sustos quando vejo que cheguei a esta idade, porque não tenho estes marcos do tempo. Ou tenho às vezes, quando olho minha agenda e vejo quanta gente já se foi. Isso me assusta porque acho que ainda tenho tudo para aprender, tudo para fazer. E está acabando meu tempo.

Pergunta – Você acha que sentiria de outro modo caso não fosse atriz?
Nathália – Acho que todo mundo sente um pouco isso, mas nós, atores, ficamos mais sensíveis a estas coisas. Porque nossa profissão exige um abandono de nós mesmos. Meu eu fica em casa quando vou para o teatro. Chego lá e tenho de criar o universo do meu espetáculo, depois vou para o estúdio e tenho de criar o universo da novela. É curioso você passar um tempo enorme da sua vida se emprestando a outros seres, a outras vidas. E, ao mesmo tempo, você tem de ser uma pessoa muito antenada, tem de viver sua época e estar absolutamente ligada a ela. É uma ambivalência curiosa.

Pergunta – O que é mais difícil na profissão para você?
Nathália – É lidar com este lado administrativo da carreira. Talvez por isso eu seja tão esquiva a entrevistas. Faço muita questão de preservar o pouco meu que tenho: o direito de ficar em casa, fazendo nada, lendo, ouvindo música. Não tenho nada a esconder, levo uma vida absolutamente simples, mas é minha. Acho que o ator já se dá muito neste tipo de trabalho, porque entra com toda sua sensibilidade, física e mentalmente. Então, tem um pedacinho que deve ser preservado.




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