Pesquisa revela que brasileiro compra mais com melhores salários, mas deixa de lado poupança
O chef de cozinha e empresário Carlos Edson Baima Neto tem experiência em preservar parte do faturamento de seu restaurante para realizar investimentos. Mas como consumidor, só consegue poupar se o capital estiver vinculado a uma dívida. "Consigo com o título de capitalização. Mas colocar dinheiro na conta, ou poupança, e não mexer é impossível", disse.
Neto se enquadra na média dos brasileiros. Segundo pesquisa do banco Credit Suisse, o consumidor está mais confiante na situação econômica do País, teve aumento na renda e passou a gastar mais. No entanto, a poupança ficou de lado.
De acordo com o levantamento, o crescimento real da renda nos próximos 12 meses deve variar entre 5%, para os grupos de baixa renda, e 12%, no caso dos mais abastados.
Com isso, 63% dos 1.500 entrevistados responderam que estão otimistas e aguardam melhora em suas finanças pessoais nos próximos seis meses. E o resultado dessa percepção positivista é a maior pretensão de gastos com despesas não obrigatórias, como aparelhos eletrônicos em geral e viagens.
Enquanto o consumo sobe, a poupança tem resultado morno. Segundo a pesquisa, mesmo com aumento da renda, a poupança média do brasileiro é de 10% de seu orçamento.
O percentual fica mais baixo quando comparado com a Rússia, cuja média é de 13% para poupança, na Índia 17% e na China 31%.
Para o professor do Insper e vice-presidente do Corecon-SP (Conselho Regional de Economia de São Paulo), José Dutra Sobrinho, faz parte da cultura do brasileiro gastar mais e poupar menos quanto tem elevação em sua renda.
"Lembro em 1986, no começo do Plano Cruzado, ocorreu a mesma coisa", disse Dutra, destacando situação semelhante também no início do Plano Real, em 1994.
"E faz sentido esse maior gasto. A nossa experiência tem mostrado que toda vez que o brasileiro está mais confiante com a manutenção do emprego, porque a economia vai bem, ele gasta mais", lembrou Dutra.
DIFICULDADE - O professor do Insper não arrisca percentual da renda que deve ser poupado. "Muitas pessoas não conseguem guardar porque gastam tudo para sobreviver. Portanto não há uma regra."
Este é o caso do eletricista Joaquim Francisco Araújo. Ele recebeu aumento no ano passado, sempre pensou em guardar dinheiro, mas as dívidas para sustentar sua família dificultam a criação de reserva. Com sorriso no rosto ele brincou. "Tem que aumentar muito o salário para conseguir guardar."
O policial Davi Alves de Lima disse que, além de contar com seu salário, faz alguns serviços extras e sua mulher também contribui com a renda familiar. "Mesmo assim não consigo guardar. Tenho de pagar as dívidas", afirmou. Ele reclamou que não está satisfeito com a economia do País. "Os preços só aumentam, principalmente os alimentos, e dificilmente a gente ganha mais."
Os gastos imprevistos também são inimigos dos consumidores. Segundo a doméstica Manuela Fernandes da Silva, uma doença imprevista em seu cachorro acabou com os planos de poupar. "E eu tinha me organizado para guardar neste ano."
Situação é reprise e deve proporcionar desaceleração
Não é a primeira vez que os brasileiros pretendem gastar, ou realmente gastam mais, com consumo. Mas de acordo com o professor José Dutra Sobrinho, depois do cenário otimista é possível que apareçam as consequências negativas.
"Em 1986, na época do Plano Cruzado, todos estavam muito confiantes. O pessoal saiu gastando muito. Lembro que tinham casos que a pessoa comprava duas enceradeiras mesmo sem ter necessidade", contou Dutra. Depois daquela época, houve recuo na economia. E o que estava fácil para o consumidor, acabou ficando bem difícil, pois a inflação atingiu níveis elevados.
Após o início do Plano Real, em 1994, Dutra disse que também houve consumismo compulsivo no País pela grande confiança na economia. E um dos reflexos negativos que apareceram foi a grande desvalorização do real ante o dólar. "Hoje a situação é outra. A economia está bem, mas o dólar desvalorizado pode se tornar um problema."
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