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Penso, logo sou bicho
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21/11/2009 | 07:00
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Renato Bolelli Rebouças é cenógrafo do Grupo XIX de Teatro e quem acompanha sua trajetória sabe de seu talento para criar ambientações cênicas originais, expressivas e pertinentes, jamais invencionices gratuitas. Pois ele assina a cenografia de "O Animal na Sala", nova criação da Cia. Linhas Aéreas, companhia cujos espetáculos, como o premiado "Pequeno Sonho em Vermelho", são tão atraentes quanto difíceis de definir, pois se situam na fronteira entre teatro, dança e circo.

Não por acaso a coreógrafa Renata Mello assina direção dessa nova montagem que contou com o apoio do Programa Municipal de Fomento à Dança. A cenografia, uma árvore de metal com base feita de sucata, é elemento fundamental nesse espetáculo que aborda, desde o título, o contraponto entre o mundo civilizado e o selvagem, entre razão e instinto. Do tronco dessa árvore saem os mais diferentes objetos e, mais ainda, ela se transforma ora em barco, ora em tanque de guerra, ora em acolhedora casa. Dessa matriz, metáfora da natureza, brota toda a vida cênica. Feita de ferro, sendo árvore, expressa o que funda o espetáculo: é um híbrido, a um só tempo construção e natureza.

O mesmo hibridismo perpassa a trilha sonora de Claudia Dorei, que mescla base contemporânea com sons tribais, som de água, de flauta. "Nós somos assim, bichos civilizados", diz Ziza Brisola, atriz fundadora do grupo, que divide o palco com Patrícia Rizzi e Natália Presser. "Eu acabo de ter filho e no momento do parto senti mais do que nunca como somos animais."

A dramaturgia desse espetáculo sem palavras, assinada por Paulo Rogério Lopes, baseia-se numa linha evolutiva que vai desde os primeiros hominídeos à urbanidade atual. Claro, há uma leitura crítica dessa trajetória cujo risco está na idealização do chamado mundo primitivo. "Tal equívoco não cometemos porque tínhamos consciência desse perigo desde o início", diz a diretora Renata Mello. Quanto ao aspecto crítico, a trupe sublinha o custo da razão, o que faz em sua linguagem cênica, por exemplo, explorando a dificuldade física de alcançar a pose de O Pensador, de Rodin. "Observe que o corpo está retorcido, não é uma posição relaxada, seu braço direito está apoiado no joelho esquerdo", diz Ziza.

A trupe traduz no corpo, na dificuldade de se chegar a essa imagem, os paradoxos da razão. A jaula é símbolo de civilização abordado em suas variantes. "O homem criou abrigos, cercas, muros e tornou-se prisioneiro. Não são só os condomínios. Qualquer casa de periferia tem grades", diz Renata. A inteligência, que levou a espécie humana a superar sua fragilidade diante das feras, não a livrou do medo. O mundo civilizado ainda é ameaçador. Mas pode ser pensado com arte. Aos sábados e domingos no Sesc Santana (tel.: 2971-8700). Ingressos a R$ 10. Até 6 de dezembro.




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