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Grupo de teatro de S.Bernardo se apresenta na Itália
Everaldo Fioravante
Do Diário do Grande ABC
23/05/2005 | 08:11
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A genialidade do texto de Franz Kafka (1883-1924) intitulado A Construção e a interpretação segura e visceral do ator Wilson Julião fazem do novo trabalho do grupo Teatro Cáustico/Núcleo Tubo de Ensaio, de São Bernardo, um espetáculo envolvente e provocador. A peça dirigida por Luiz Nunes estréia na próxima quarta-feira, dia 25, no Teatro H.o.p Altrove, em Gênova, na Itália, país que contará ainda com apresentações do espetáculo em junho em outras cidades – Lugo, Dozza e Faenza. O público do Grande ABC poderá assistir ao espetáculo em agosto, em Diadema e em São Bernardo.

O Diário acompanhou na última sexta-feira o primeiro ensaio aberto da montagem, apresentado no Centro de Formação Profissional Padre Leo Commissari, na favela do Oleoduto, em São Bernardo, espaço que é sede do Teatro Cáustico.

A Construção fala de um animal que cria um abrigo sob a terra, onde se isola e vive amedrontado com as possíveis ameaças externas. Sozinho em cena, Julião explora bastante os movimentos corporais e a expressividade facial para a criação do clima de claustrofobia e paranóia que marca a peça.

A narrativa, datada do início dos anos 1920, soa muito atual, pois as várias feridas da sociedade daquela época apresentadas guardam relações com o que ocorre no mundo contemporâneo.

“Muita gente hoje em todo o mundo tem esse medo e vive trancada. O 11 de setembro (os atentados terroristas em 2001 contra os Estados Unidos), a guerra no Iraque e os condomínios fechados em São Paulo estão entre uma série de outras questões atuais nas quais é possível pensar a partir do texto”, afirma Julião.

Escrito nos momentos finais da vida de Kafka (autor tcheco de família judia), A Construção tem caráter autobiográfico. “Há um paralelo claro entre a situação do escritor e a do bicho abordado na peça. O animal só pensa na ameaça exterior e a cabeça dele cria uma série de problemas. A relação com Kafka é que ele estava com tuberculose e de certa forma previa o nazismo”, diz Julião. “Embora tenho um tom de angústia, o texto apresenta uma saída para o mundo, que é se comunicar, dialogar, e não se isolar do universo”, afirma o diretor Luiz Nunes.

O cenário – assinado por Márcia Moon – é simples, formado apenas por hastes metálicas (de barraca de acampamento) e suportes para as mesmas, materiais que representam a construção. Há também uma montagem em tecido, no centro do palco, simbolizando a principal área do abrigo. O figurino também é econômico: bermuda, camiseta e botas, tudo preto. O básico do básico, conforme o diretor. “A ênfase é na criação de imagens. É uma peça centrada no ator”, diz Julião, que em parceria com Nunes responde também pela dramaturgia.

O texto levado ao palco é praticamente o original de A Construção. Apenas foram retiradas partes em que o discurso se repetia, “característica comum em textos do Kafka”, segundo Nunes.

Na Itália, a peça será apresentada em português. Mas antes das encenações serão distribuídos libretos em italiano para que as pessoas compreendam melhor o espetáculo. Haverá também inserções em italiano de frases-chave. “Acredito na comunicação por meio do corpo”, afirma Julião.

A trilha sonora ainda é provisória, composta por trechos de obras do compositor Edson Zampronha, professor de composição da Unesp (Universidade Estadual de São Paulo) que deve criar a trilha definitiva quando a peça retornar da Europa.

Wilson Julião, Luiz Nunes e a atriz Paula Carrara, que faz a produção de A Construção, viajariam neste domingo à noite para a Itália a convite da Associação Teatral da Emilia Romagna (região daquele país).




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