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Santo André tem montagem do teatro Nô
Gislaine Gutierre
Do Diário do Grande ABC
10/02/2005 | 12:11
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Sete histórias reais, recriadas dentro da linguagem do teatro Nô, ganham a partir do próximo sábado (dia 12) o palco do Teatro Conchita de Moraes, em Santo André. Intitulada Nô Caminho – 7 Passos para Dentro, a montagem é encenada pelos atores do Núcleo de Formação 6 da ELT (Escola Livre de Teatro) e conta com direção geral de Georgette Fadel e orientação dramatúrgica de Luís Alberto de Abreu.

“O teatro Nô é cármico. Conta a história de alguém que comete um erro e precisa ser rendido, reparado, senão seus fantasmas vagam pelos infernos budistas”, afirma Georgette. O caráter sagrado, típico desse teatro clássico japonês, dá corpo às narrativas. Há sempre um drama que transcende a realidade simples.

Nona (ator-dramaturgo Rony Abreu), por exemplo, leva ao palco o caso real de uma mulher que casou seu amante com a própria filha, para não perdê-lo. Sua atitude a faz mergulhar num universo de dor e culpa. Zói di Deus (Christian Amêndola) fala de um beato do sertão, casado com Graça, que se deixa levar pelo jogo de sedução da sobrinha Madalena. Um dia, Graça ateia fogo na casa, causando a morte dos três. A alma do beato, então, passa a vagar pelo sertão até ele encontrar um andarilho que o procurava vivo. Revendo a própria história com o novo amigo, o homem se redime.

Máscaras – Seguindo a cartilha do teatro Nô, os atores da ELT não se limitam a revelar emoções, mas personificam as paixões. “No teatro Nô, não existe a mulher ciumenta, por exemplo. Ela é a máscara do ciúme, ela é o próprio ciúme”, afirma Georgette. Não se trata de emoções cotidianas, folhetinescas, mas de sentimentos profundos.

Enquanto os japoneses demonstram essas paixões por meio de máscaras de madeira, a ELT coloca ao ator o desafio de personificar esses sentimentos utilizando somente a “máscara muscular” do rosto. Apenas alguns personagens têm maquiagem branca com traços pretos que realçam as linhas da face. “Seria pretensão nossa abarcar esse conhecimento em tão pouco tempo de trabalho. Os japoneses têm uma reverência muito grande pelas máscaras e não queríamos dessacralizá-las”, diz Georgette, lembrando que os preparativos para essa montagem consumiram um ano de trabalho.

Mas a “máscara” não está apenas no rosto. Toda a movimentação do corpo e a voz são trabalhados em função da paixão sentida pelo personagem. Nada é realista, mas ritualístico. Segundo Georgette, os japoneses têm muitos gestos codificados dentro do teatro Nô e, para ser protagonista, só mesmo tendo a maturidade e experiência de quem tem mais de 50 anos.

Nessa montagem, os gestos foram criados pelos próprios atores, sem comprometimento com a tradição nipônica. O que facilita muito ao público, pois os códigos de expressão levados ao palco nascem do gestual comum da cultura brasileira. “O espetáculo é mais difícil de entender que uma novela. Ele extrapola o drama burguês. Mas quem estiver disposto a viajar um pouco nessa brincadeira das formas, irá gostar. É possível entendê-lo com perfeição”, afirma a diretora Georgette Fadel.

A música – indispensável no teatro Nô – surge em Nô Caminho – 7 Passos para Dentro com pequenas adaptações. Os tradicionais tambor e flauta aparecem junto com outros instrumentos e com elementos não convencionais, como galhos de árvore. As músicas ajudam a contar a história, pois são participantes diretamente da montagem. Os figurinos são “híbridos”. A maioria dos atores veste quimonos, como no teatro Nô, mas estes são bem mais simples. Algumas peças foram feitas com base em conceitos de outra arte japonesa: o origami.

Georgette explica que a escolha dos dramas se deu a partir de uma conversa do grupo com Abreu. São casos que os atores viveram ou sobre os quais tiveram conhecimento ou proximidade. Para criar a dramaturgia de cada uma das narrativas, foram escolhidos integrantes sem qualquer ligação com o fato real – justamente para o resultado ser impessoal.

Assim, a narrativa de Candeias contou com dramaturgia de Ivan Ribeiro e Janne Cordeiro; Hospital, Alexandre Santo; O Sucuri, Judson Cabral e Christian Amêndola; Menino do Beco, Luiz Soares e Ícaro Rodrigues; Num Canto Escuro da Cidade, Rodrigo Figueira (com colaboração de Lúcia Kazaku). A direção musical é de Gustavo Kurlat e a direção dos atores, de Cuca Bolaffi. Georgette Fadel ressalta, porém, que a montagem é resultado de um processo colaborativo: “Nós formamos não só atores, mas artistas de verdade, que assinam embaixo da obra que executam.”

Nô Caminho – 7 Passos para Dentro – Teatro. Com formandos da ELT. Estréia sábado (12), às 20h30. Aos sábados e domingos, às 20h30. No Teatro Conchita de Moraes – praça Rui Barbosa, s/nº. Tel.: 4996-2164. Entrada franca (sugere-se a doação de 1 kg de alimento não-perecível). Até 1º de maio.



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