Política Titulo Crise política
Fim do financiamento privado é base da reforma

Medida obriga siglas a atraírem militantes
para impulsionar as campanhas eleitorais

Por Vitória Rocha
Especial para o Diário
28/03/2016 | 07:00
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Ari Paleta/DGABC


Depois da divulgação, na semana passada, de lista com mais de uma centena de políticos de diversos partidos que receberam doações da Odebrecht, sendo 11 deles do Grande ABC, a discussão sobre mudanças na legislação eleitoral volta à tona. Para especialistas ouvidos pelo Diário, o fim do financiamento empresarial de campanha é chave para reforma política efetiva e democrática do sistema político brasileiro.

Não há provas concretas de que as planilhas da empreiteira, apreendidas na casa de um dos integrantes do alto escalão da Odebrecht, o executivo Benedicto Barbosa Silva Junior, indicam doações ilegais, ou seja, por meio de caixa 2 ou pagamento de propinas. Contudo, as altas quantias depositadas aos candidatos evidenciam como o sistema eleitoral é caro, segundo o cientista político e professor da FGV (Fundação Getulio Vargas) Paulo Douglas Barsotti.

“Eu sou do tempo em que se fazia militância boca a boca, com comícios, visitas nos bairros, e todo esse processo foi desmontado pelo palanque eletrônico, midiático, caríssimo e sustentado pelas empresas privadas. Então, como vamos ter campanhas políticas agora? É incógnita. A militância combativa será vantagem para alguns partidos, porque é ela que vai para a rua fazer campanha.”

Aprovada no ano passado e já reconhecida pelo TSE (Tribunal Superior Eleitoral), entre vários pontos, a reforma política contempla o fim de doações de pessoas jurídicas (empresas) para campanhas eleitorais a partir do pleito deste ano. De acordo com a nova regra, o financiamento pode ser feito apenas por pessoas físicas e através de repasses do fundo partidário.

Outro ponto contemplado pela reforma política é a não caracterização como campanha antecipada a divulgação de “ideias, objetivos e propostas partidárias”. Barsotti sugere que, com as novas normas, os pré-candidatos sejam mais contundentes ao apresentar suas propostas. “Há agravamento da crise política e, de certa maneira, isso gera cobrança de mais posicionamento ideológico dos candidatos. Eles terão que ter mais firmeza naquilo que dizem.”

Cientista política e professora da UFABC (Universidade Federal do ABC), Tatiana Berringer considera o fim do financiamento empresarial de campanha como ponto inicial para transformação da política brasileira. “A suspensão do financiamento empresarial de campanhas é fundamental para o avanço da democracia. Muitas coisas a que assistimos hoje decorrem da má-formação do sistema político que foi forjado na questão democrática, mas por pessoas comprometidas com o regime ditatorial. Além disso, é forma de inibir o caixa 2, porque coloca o militante junto ao partido por meio do financiamento de pessoa física.”

GASTOS EM 2014
Na eleição de 2014, as bancadas de dois deputados federais e seis estaduais eleitos no Grande ABC gastaram R$ 15 milhões em suas campanhas. Dividindo esse montante ao número de votos recebidos por todos eles juntos (902.606 sufrágios), esses políticos desembolsaram, em média, R$ 16,75 por eleitor. 

Punição a empreiteiro coibirá caixa 2, analisa cientista político

Para o cientista político e professor da FGV (Fundação Getulio Vargas) Paulo Douglas Barsotti, a punição atribuída ao empreiteiro Marcelo Odebrecht, condenado a 19 anos e quatro meses de prisão no âmbito da Operação Lava Jato por corrupção, lavagem de dinheiro e associação criminosa, deverá coibir o caixa 2 nas campanhas eleitorais, já que o financiamento empresarial de campanhas não existirá. 

“Vai haver mais cautela e cuidado (por parte dos políticos) porque, quando se condena um executivo da maior empreiteira deste País a 19 anos de cadeia, isso pode e deve assustar. Muita gente vai colocar as barbas de molho”, avalia. 

Já a cientista política Tatiana Berringer acredita que a reforma política deve ir além. Ela defende que haja constituinte popular específica para “reformar aspectos que regem a vida política”. 

“Precisamos apresentar para a sociedade uma constituinte exclusiva e soberana em que não vamos abrir mão da Constituição (Federal da República) de 1988, mas vamos reformar os aspectos que regem a vida política, a organização dos partidos, o processo eleitoral e priorizar a participação popular por intermédio de delegados para que não se reproduza o que aconteceu em 1988”, defende, ao se referir aos membros da Constituinte de 1988, quando deputados e senadores  eleitos dois anos antes elaboraram a nova Constituição, em vez de  representantes serem eleitos exclusivamente para isso. “Temos que eleger delegados populares e se começaria uma assembleia específica que modificaria pontos da política (estabelecidos na Constituição de 1988)”, pontua.




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