Esportes Titulo Abuso na ginástica
Coordenadora tem papel crucial no início de denúncias ao técnico

Ivonete Fagundes foi a primeira a saber do caso e encorajou família a relatar abuso sexual à polícia

Por Anderson Fattori
Dérek Bittencourt
03/05/2018 | 07:00
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Reprodução/Facebook


Não se sabe ao certo quando os supostos casos de abuso sexual envolvendo o técnico de ginástica artística do Mesc (Movimento de Expansão Social Católica), Fernando de Carvalho Lopes, começaram, mas o fim da linha foi em 8 de junho de 2016. Neste dia, a coordenadora da modalidade na Prefeitura de São Bernardo, Ivonete Fagundes, soube de um fato e encorajou os familiares a denunciar o profissional à polícia. Foi o primeiro de série de depoimentos de ginastas que dizem terem sido vítimas de algum tipo de abuso físico, moral ou sexual por parte do treinador.

“Assim que soube do caso tive conversa franca e bem difícil com os pais do garoto e resolvemos denunciar o Fernando à polícia”, contou Ivonete, que na sequência afastou o profissional de atividades em São Bernardo. “Na época, Fernando estava no Exterior (acompanhando Diego Hypólito e Caio Souza) e no dia que ele chegou à cidade nem deixei ele ir ao ginásio. Marquei encontro em uma padaria e comuniquei o afastamento dele, sem dar detalhes. Ele me questionou e eu disse que o motivo corria em segredo de Justiça, mas que em breve ele saberia”, explicou Ivonete.

A denúncia caiu como uma bomba na Seleção Brasileira, que estava a dois meses dos Jogos Olímpicos do Rio. Fernando também foi afastado da função de treinador da equipe nacional até que a denúncia fosse apurada. A inclusão de novos depoimentos no processo complicou ainda mais sua situação.

“A cada novo depoimento eu era chamada na delegacia para tomar conhecimento. Percebi que não se tratava de caso isolado e cada vez mais gente teve coragem para denunciar”, ressaltou Ivonete. “Mas a impressão que os meninos tinham era que não valeria nada terem se exposto, que não iria andar. Só em janeiro, quando o processo veio para a Delegacia de Defesa da Mulher (de São Bernardo) é que teve continuidade”, acrescentou.

Com mais de 30 anos de esporte, Ivonete, que foi técnica de handebol em São Bernardo e também coordena o tênis de mesa da cidade, disse que nunca desconfiou de Fernando. “Ouvia boatos, nada além disso. Quando chegou em mim fiz minha parte, denunciei. O via como treinador rígido, firme e que protegia seus atletas. Não imaginava tudo isso. Fico extremamente triste com essa situação”, finalizou.


Conselho move processo contra acusado

O Cref-SP (Conselho Regional de Educação Física do Estado de São Paulo) move desde 2016 processo ético contra o ex-treinador do Mesc, ASA e da Seleção Brasileira Masculina de Ginástica Fernando de Carvalho Lopes, acusado de abusar sexualmente de ao menos 40 atletas. A entidade vai incluir as novas denúncias na ação e tentar dar mais celeridade ao procedimento, que pode acarretar na cassação de seu registro.

Se comprovada infração ética, o Cref afirmou em nota que “aplicará as penalidades previstas no Código de Ética, podendo inclusive cancelar o registro profissional” de Lopes, que é formado em Educação Física e funcionário concursado da Prefeitura de Diadema, que vai abrir processo para exonerá-lo.

O conselho regional paulista abriu processo contra o ex-treinador da Seleção no dia 18 de julho de 2016 e, desde então, o caso é mantido em sigilo. A ação foi ingressada pelo pai de um ginasta menor de 18 anos que treinava com Lopes, em São Bernardo. De acordo com a entidade, no dia 27 de março a sua câmara de sindicância solicitou à Delegacia Seccional de São Bernardo, por meio de ofício, a cópia integral do inquérito policial da ação movida pelo menor de idade.

A entidade ainda reiterou que só pode impor alguma punição a Fernando se houver o rito previsto dentro do processo ético e criminal.


COB cria canal de ouvidoria para receber queixas no esporte olímpico

O COB (Comitê Olímpico do Brasil) vai implantar canal de ouvidoria para receber qualquer tipo de denúncia e acolher vítimas de abuso nos esportes olímpicos. A previsão inicial é que seja lançado no dia 22 de maio. “Será um canal que estará no site do COB. O pessoal vai lá, se cadastra e faz sua denúncia”, explicou Marco Antônio La Porta, vice-presidente da entidade.

As acusações de abuso sexual contra o ex-técnico de ginástica artística Fernando de Carvalho Lopes acabaram coincidindo com a criação deste espaço para denúncias. “Na verdade, esse canal de ouvidoria já era mudança que a gente tinha feito no processo de reestruturação do COB, de ter maior governança e transparência”, disse.

O dirigente reiterou que o COB não tinha conhecimento dos casos, mas que está dando a atenção devida. De qualquer maneira, a criação do canal vem a calhar. “Vamos receber qualquer tipo de denúncia e depois o caso vai para o comitê de ética”, afirmou.


Ele tem medo de sair de casa e ser agredido, diz advogado

Fernando de Carvalho Lopes adotou a lei do silêncio. Mais do que isso, tem vivido dias de reclusão e temor. Desde domingo, quando matéria do Fantástico reavivou as denúncias de que ele teria cometido abuso sexual a dezenas de garotos nos tempos em que era treinador do Mesc, clube privado de São Bernardo, ele não sai de casa.

“Ele tem medo de sair e ser agredido”, conta o advogado Luís Ricardo Davanzo, que busca argumentos para o cliente preferir o silêncio. “Não está bem para falar neste momento. Não se trata de blindar. Muito pelo contrário. Ele sempre atendeu a imprensa, inclusive desde a denúncia inicial, em 2016”, diz.

Independentemente dos fatos que surgem diariamente desde domingo, o defensor explica que Fernando segue confiante de que, no fim das contas, será julgado inocente.

“Ele acredita que no futuro será provada sua inocência. Disse que tem justificativa para diversas coisas faladas e vai apresentá-las no momento oportuno”, declara Davanzo, que afirma enxergar inclusive matérias que já condenam o treinador. “Não pode ser verdade absoluta sem antes ter busca da verdade real e do contraditório e ampla defesa”, conclui.

O advogado ainda aguarda a finalização do inquérito policial (leia mais abaixo) para saber qual será acusação contra Fernando e, então, apresentar a defesa.


Delegada estima dois meses para ouvir depoimentos antes de indiciar técnico

A delegada Teresa Alves de Mesquita Gurian, da DDM (Delegacia de Defesa da Mulher) de São Bernardo, responsável pela investigação de abuso sexual envolvendo o técnico de ginástica artística Fernando de Carvalho Lopes, disse ontem que deve levar mais dois meses para ouvir todos os envolvidos no caso, mas que já tem elementos suficientes para pedir o indiciamento do treinador.

“Ainda temos algumas pessoas para ouvir, não posso dizer exatamente quantas porque o processo corre em segredo de Justiça, mas espero que em dois meses eu possa ouvir todas as pessoas envolvidas”, disse a delegada. “Cada depoimento leva a outras pessoas que precisam ser ouvidas”, explicou ela, que deve chamar para depor o ginasta Diego Hypólito, o técnico Marcos Goto e a psicóloga que trabalhou para o Mesc, Thais Coppini.

No fim do processo, Fernando será intimado para dar explicações. Ele deveria ter ido à delegacia semana passada, mas não compareceu alegando que tinha consulta médica na data. “Após finalizar as oitivas temos de ouvir o Fernando. Ele será intimado e vamos aguardar que se apresente”, disse Teresa.</CS>

Ontem, o ex-ginasta Lucas Altemeyer, 29 anos, esteve na delegacia para depor contra Fernando. “Nunca tinha falado para minha família sobre isso, sempre guardei para mim. E, por ter visto as meninas nos Estados Unidos fazerem isso, e o próprio Petrix ter ido de cara aberta, me senti na obrigação”. disse, em entrevista à Globo. 




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