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Na dúvida, secretarias do Grande ABC optam pelo 'não pode'

Secretarias de Assuntos Jurídicos preferem alegar ilegalidade na interpretação das leis e incorrem em erros

Por Elaine Granconato
Do Diário do Grande ABC
16/08/2009 | 07:10
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As secretarias de Assuntos Jurídicos das sete prefeituras do Grande ABC são tratadas pelas demais como o setor do não pode. Isso em razão de, na maioria dos casos, os procuradores dos municípios e os advogados, na dúvida na interpretação de uma lei, alegarem ilegalidade de imediato.

Mesmo com respaldo técnico e estrutura montada para a área, as administrações públicas ainda tropeçam e erram feio na hora de elaborar editais e contratos.

"Há um legalismo exagerado", critica o professor Dalmo de Abreu Dallari, um dos mais renomados juristas do País, ao admitir os erros jurídicos em decisões de autoridades administrativas.

Para Dallari, os procuradores municipais devem inverter o velho chavão do não pode para o como pode. "Sem dúvida, seria a solução de muitos problemas e até mesmo para se evitar equívocos jurídicos futuros", afirmou, com base na experiência quando comandou a Secretaria dos Negócios Jurídicos da Prefeitura de São Paulo, de 1990 a 1992, na primeira gestão do PT na cidade, Luiza Erundina, hoje filiada ao PSB.

Nesse caso, o professor emérito da Faculdade de Direito da USP (Universidade de São Paulo), ressalta que o procurador passa a ter uma responsabilidade maior. "Dá trabalho. Ele tem de estudar muito para garantir a legalidade dentro dos princípios constitucionais da moralidade e da ética pública", receita o jurista.

O advogado José Carlos Macruz, que integra a Assessoria Jurídica do Cepam (Centro de Estudos e Pesquisas de Administração Municipal), concorda que existe um conceito equivocado do que não é possível fazer com base na legislação.

Para Macruz, os erros jurídicos cometidos pela gestão pública ocorrem em razão das mudanças constantes das normas e regras, da produção legislativa intensa e do volume de desenvolvimento tecnológico. "Em alguns casos, existe também a falta de preparo ou menos experiência de quem executa as atividades na administração pública", ressalta.

A fim de incorrer em atos de improbidade administrativa, o secretário de Assuntos Jurídicos da Prefeitura de Santo André, Niljanil Bueno Brasil, garante que reza a cartilha do administrador público, prevista no artigo 37 da Constituição Federal. "Só fazemos o que a lei permite", garante o secretário de confiança do chefe do Executivo, Aidan Ravin (PTB), independentemente dos interesses político-partidários.

Com exceção de Santo André, nenhuma das outras prefeituras da região autorizou entrevista com os secretários jurídicos, conforme solicitado pelo Diário.

Interesse político prevalece muitas vezes sobre o público

O conflito técnico-político é um dos motivos que geram os escorregões jurídicos na hora de legislar. No entanto, o jurista Dalmo de Abreu Dallari ressalta que o procurador público deve ter consciência de que representa o povo, e não o governante.

Infelizmente, não é o que se vê na prática. O interesse político sobressai, na maioria dos casos, acima do interesse público. "Às vezes, os interesses momentâneos e a ânsia arrecadatória em tributos provocam essa mudança de conceito", afirma Anis Kfouri Júnior, presidente da Comissão de Qualificação e Fiscalização do Serviço Público da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de São Paulo.

Outro fato apontado por Kfouri Júnior é a diminuição do número de leis inconstitucionais para se evitar a violação de vários direitos. "Por que tem de chegar ao STF (Supremo Tribunal Federal) para se declarar a inconstitucionalidade de uma lei, se no próprio Congresso Federal existe uma comissão de especialistas e técnicos para avaliar isso?", questiona o advogado, indignado.

Direito dá margens para várias interpretações

Uma vez que o Direito não é uma ciência exata como a matemática, a lei permite várias interpretações de um mesmo fato. Assim justificaram os advogados especialistas consultados pelo Diário em defesa dos escorregões jurídicos nas prefeituras.

Porém, nem todos os enganos na legislação podem ser atribuídos como "erros de interpretação jurídica". A administração do prefeito de Mauá, Oswaldo Dias (PT), por exemplo, tem recorrido em constantes equívocos.

Um deles foi no reajuste de 18,25% na tarifa de água da cidade, estabelecido pelo Sama (Saneamento Básico do Município de Mauá), que começará a ser cobrado a partir de 1º de setembro - com pagamento somente em 1º de outubro.

A irregularidade, recentemente denunciada pelo vereador Manoel Lopes (DEM), é que o reajuste só poderia ser aplicado 45 dias após sua assinatura, de acordo com a lei municipal. Pelo edital publicado pela Prefeitura, a cobrança passaria a valer em 1º de julho.

"Os erros jurídicos atrapalham, mas o que provoca mais indignação é a bancada da situação passar por cima e aprovar o projeto, apesar da ilegalidade", afirmou Lopes, vereador da oposição.

A Prefeitura de Mauá não respondeu aos questionamentos do Diário feitos por e-mail nem permitiu entrevista com o secretário de Assuntos Jurídicos, José Alves de Oliveira.




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