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Blade Trinity’ é pretensioso
Por Cássio Gomes Neves
Do Diário do Grande ABC
31/12/2004 | 12:09
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Ao assistir a Blade Trinity você até pode achar que, antes de rolarem os créditos finais, terá experimentado um filme que se propõe a quebrar paradigmas. Na seqüência de abertura do longa, o terceiro da série baseada em personagem das HQs (histórias em quadrinhos) dos estúdios Marvel, o narrador contesta um ícone do terror: Drácula, que não usaria capa nem seria sedutor conforme propagaram Bram Stoker, Vincent Price, Bela Lugosi e Francis Coppola, que não passariam de um bando de equivocados na confecção do hematófago maior da ficção. Pelo menos é o que julga o filme de David S. Goyer, lançado neste fim de semana em oito salas da região.

Esse rufar de tambores introdutório contrasta, e muito, com o restante da sinfonia audiovisual de Goyer. Blade Trinity diz renunciar à iconografia pré-existente sobre vampiros. Insinua que Drácula, o personagem, não representa mais do que uma das muitas manifestações de um sujeito (Dominic Purcell) criado na aurora da civilização e que é a matriz genética de todos os seres do gênero.

A série Blade tem como núcleo o personagem-título vivido por Wesley Snipes, ator reanimado do limbo dos filmes B de artes marciais. Seu personagem é um híbrido de homem e vampiro empenhado em exterminar seus semelhantes de caninos proeminentes, capaz de suportar a luz do dia e refrear seu instinto de consumir sangue humano. Desta vez, Blade confrontará o pai de todo o mal hematófago, não por acaso seu criador também, recentemente despertado de sua hibernação por descendentes que querem, acima de tudo, a supremacia de sua espécie em todo o globo.

Destaque de Blade Trinity a narração inicial, e sua pose de iconoclasta, e eis que terá diante de si um filme de ação no limite do chulo. Nem mesmo o gesto obsceno dirigido ao céu por um dos vampiros e sua conseqüente simbologia profana – afinal, está mandando Deus para aquele lugar – sustentam a pretensão revolucionária exposta de início.

Blade, considerado um psicopata perigoso, é preso pelo FBI – mas logo se revelará que a polícia federal dos Estados Unidos está infestada de vampiros. Com essa revelação, piadas sobre a obsessão anti-vampiro do protagonista, que seria projeção de uma repressão sexual, perdem todo o sentido. O resgate do exterminador é providenciado por um grupo liderado por casal de caça-vampiros (Jessica Biel e Ryan Reynolds). Passam a operar em conjunto, Blade e a gangue, na luta contra os sanguessugas.

O diretor Goyer afoga-se na correnteza que separa pretensão e resultado. Trabalha em favor da agilidade, ao economizar diálogos esclarecedores e trocá-los pelas coreografias da ação. Por outro lado, exibe uma série de colóquios impertinentes e supostamente engraçados, descartáveis enfim. Por fim, só consegue concluir seu filme graças ao repertório do cinema de gênero (ora ação, ora terror) que precede seu Blade Trinity, sem contestá-lo ou retrabalhá-lo, talvez até sem percebê-lo afora o discurso de abertura. Quanta iconoclastia, hein?




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