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Livro desvenda Bertrand Russell
Por Joao Marcos Coelho
Especial para o Diário
09/09/2000 | 15:50
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"Eu nao gostaria de ser levado a sério apenas quando sou solene". É citando estas palavras que Robert Enger abre sua coletânea O Melhor de Bertrand Russell - Silhuetas Satíricas, um divertido e agudo apanhado de frases do filósofo inglês que chega às livrarias em ediçao da Record (176 páginas, R$ 23,50). O livro é dividido em seis capítulos: psicologia, política, educaçao, religiao, ética e sexo. O humor que faz pensar, a ironia fundamentada, as posiçoes firmes - tudo isso nos faz pensar como é bom trazer de volta à circulaçao a irreverência, a militância e a inteligência de Russell.

Segundo filho do Visconde de Amberley, Russell fugiu do sossego dos castelos britânicos, transformou-se em ovelha negra da classe, foi preso duas vezes e sofreu todo tipo de humilhaçoes em sua longuíssima vida de 98 anos, distribuídos entre o nascimento em 18 de maio de 1872 e a morte em 2 de fevereiro de 1970.

Em compensaçao, foi o ícone por excelência do intelectual de fundamental importância tanto em filosofia, sua vocaçao original, quanto em todos os acontecimentos relevantes do século. Exemplos: é dele, junto com Alfred Whitehead, o livro Principia Mathematica, de 1910-14, que prova que a matemática deriva de alguns poucos princípios lógicos; nos anos 10, foi publicamente contra seu país, entao em guerra com os bôeres na Africa do Sul, e em 1918, por sua militância pacificista, foi demitido do cargo de professor no Trinity College e preso por seis meses.

No início da Segunda Guerra Mundial, foi indicado professor no City College de Nova York e em seguida teve sua contrataçao anulada pelos tribunais sob a alegaçao de que era "a favor da imoralidade sexual". Nao abandonou a trincheira nem após conquistar o Prêmio Nobel de Literatura em 1950 - naquela altura, já tinha mais de 40 livros publicados, juntando-se os técnicos de filosofia e lógica e os dedicados ao grande público, discutindo ética, política e história da filosofia em três volumes.

Sua imagem de militante pacifista foi emblemática a partir dos anos 50 e 60. Liderou com Einstein um manifesto dos cientistas detentores do Prêmio Nobel contra as experiências atômicas na ilha Bikini e também liderou uma grande campanha contra o desarmamento nuclear em 1958. No ano seguinte, integrou um movimento muito mais radical, o chamado Comitê dos 100, que incitava abertamente à desobediência civil. Em 1961, foi novamente preso por causa dessa militância.  

Finalmente, nos anos 60, com a ajuda do filósofo francês Jean-Paul Sartre, manteve uma luta sem tréguas contra os Estados Unidos na Guerra do Vietna e presidiu o Tribunal Internacional de Crimes de Guerra. 

Sua longa vida levou-o a ser um dos mais influentes intelectuais engajados por três geraçoes inteiras do século XX. A vetusta Enciclopédia Britânica qualifica-o de "liberal anarquista, homem de esquerda, de temperamento cético, e ateu". Um amontoado de etiquetas, que se pode resumir assim: Russell foi filósofo sim, mas jamais se omitiu de participar da realidade social, política e cultural, guiando-se tao-somente por um princípio fácil de entender, mote aprendido no século XIX, quando, ainda aluno no Trinity College de Cambridge, em 1890, ele formava um grupo de estudantes que criou uma espécie de sociedade dos poetas mortos. Sua crença? "Investigar, com critérios rígidos e praticando o ceticismo, como podemos dizer que conhecemos algo e com que grau de certeza ou dúvida". Ou, como dizia Millôr Fernandes, "livre-pensar é só pensar".




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