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Dia da Criança: o fim da surpresa
Luciana Sereno
Do Diário do Grande ABC
05/10/2002 | 16:50
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O Dia da Criança pode ser a oportunidade para um resgate do verdadeiro significado de presentear. A afirmação é da psicanalista do Instituto de Psicologia da USP (Universidade de São Paulo), Maria Cristina Kupfer. “Presente só é presente quando é surpresa.” Essa quebra de tradição chega a ser mais preocupante do que a massificação de anúncios e propagandas sobre opções e lançamentos de produtos voltados ao público infantil. “Ao invés de levar os filhos até as lojas para que escolham o que querem ganhar, é melhor que peçam várias opções para que o presente seja de fato uma surpresa”, aconselhou Maria Cristina.

Esse também é o momento para que os pais adotem um outro papel, o de frear os reflexos que os apelos publicitários desencadeiam nas crianças para que os filhos não se tornem consumistas. Por tratar-se da melhor data para o varejo de brinquedos e itens infantis, as indústrias fabricantes apostam na imagem das crianças para visar o lucro e garantir aumentos consideráveis de faturamento.

Seja por meio de lançamentos de brinquedos ligados aos desenhos e programas televisivos do momento e das bonecas das apresentadoras infantis, ou por estratégias emocionais anunciadas em cada ponto-de-venda do comércio, as empresas aproveitam para cativar os consumidores mirins. “É aí que os pais devem aproveitar para mudar a regra do jogo”, disse a psicanalista.

Abrir o leque de opções do que se gostaria de ganhar pode ser uma estratégia válida para que pais e filhos consigam recuperar a tradição do presente-surpresa, mais ligado ao sentimento. Os psicanalistas costumam dizer que, com diálogo, os pais podem encontrar caminhos para educar as crianças quanto a mudanças de valores e ainda mostrar a elas que nem tudo o que é apresentado pelas propagandas condiz com a sua idade. “Assim consegue-se driblar a insistência publicitária sem causar decepção aos sentimentos da criança.”

Compreensão – Na prática, os pais dizem que, em geral, peneiram os pedidos dos filhos e presenteiam dentro das possibilidades. E garantem que contam com a compreensão dos filhos quando são obrigados a dizer não aos seus pedidos. “Gosto de levá-la para escolher o presente porque, afinal de contas, o dia é dela”, disse a autônoma Cícera Abreu Souza, mãe de Luciana, 4 anos. “Mas nesse ano, por exemplo, ela me pediu uma boneca que não posso comprar. Conversei com ela e acertamos que vou comprar outra coisa dentro das minhas condições. A boneca fica para o Natal.”

Os limites financeiros e a possibilidade de adiar a compra do pedido para o Natal também é a estratégia de Maria Aparecida Rodriguez Pimentel, mãe de Samuel, 12, e Jessica, 10. “Como tem muita influência da televisão, eles acabam sempre escolhendo presentes caros. Por isso, estipulo um determinado valor, levo eles até a loja e deixo que escolham. Assim é mais difícil de ficarem decepcionados e aprendem a lidar com o dinheiro.”

Para evitar qualquer problema, a mãe de Maynara, 8, e Gabriela, 6, vai sozinha para comprar os presentes. “Sempre foi assim. Elas sabem que é um presente e presente não se escolhe.” Ao saber que não irá ganhar o computador que pediu, a caçula disse que “não tem problema porque o gostoso é ganhar alguma coisa”. A mesma metodologia deverá ser seguida nos próximos anos por Andreza da Silva. “O Agnaldo ainda não pede nada porque tem apenas 2 anos, mas como a situação está difícil, vou educá-lo a aceitar o que eu der.”

Na contramão dos limites, Ornella Covella, 7, sempre acaba ganhando o presente que deseja. “Mas isso porque a avó é quem compra”, afirmou a mãe Silvia Covella. “Quando o assunto é comigo, tanto ela quanto minhas outras duas filhas ganham o que posso comprar e compreendem que nem sempre dá para fazer o gosto delas.”




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