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Projeto do Senado segue modelo de cotas da UFABC

Pelo projeto, metade das vagas em universidades será ocupada por quem cursou colegial em escola pública

Adriana Ferraz
Do Diário do Grande ABC
07/07/2008 | 07:03
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O novo sistema de cotas para alunos da rede pública de ensino, aprovado pela Comissão de Educação do Senado na semana passada, segue modelo já utilizado pela UFABC (Universidade Federal do ABC). Se aprovado no Congresso, metade das vagas em escolas técnicas e universidades do governo federal será ocupada por alunos que fizeram o ensino médio em colégios gratuitos. No Grande ABC, mais de 95 mil estudantes poderiam ser beneficiados.

"A proposta é idêntica à implementada por nós desde o início das atividades, em 2006", explica a vice-reitora da UFABC, Adelaide Faljoni-Alario. "São reservadas 50% das vagas no vestibular para estudantes que cursaram o ensino médio integral em escolas públicas. Destas, 27,2 % são reservadas para negros e pardos e 0,26 % para indígenas, segundo informações do IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística)."

A diferença do modelo usado pela universidade para o projeto aprovado está nas cotas para pessoas com deficiências, que representam outros 5% das vagas.

A autora da proposta, senadora Ideli Salvatti (PT), explica que o projeto original destinava a reserva apenas para escolas técnicas federais. "Não incluí as universidades por considerar que o modelo já despertaria bastante polêmica. A mudança veio da oposição, com o adendo do senador Marconi Perillo (PSDB)."

A senadora justifica o projeto relatando o desequilíbrio existente na Educação no País. "Nós tínhamos, até 1993, cerca de 600 mil alunos que se formavam no ensino médio por ano no Brasil. Metade era de escola particular e metade de escola pública. Em 2007, o número da rede privada se manteve, mas os estudantes da rede gratuita pularam para 2,1 milhões. Quando ambos chegam na disputa em instituições federais, não existe esta proporção. Este projeto visa equilibrar as chances", diz.

As cotas oferecidas na UFABC garantiram a matrícula de Lucas Tozatti, 21 anos. "Sempre estudei em colégios públicos e já tive dificuldades para entrar na escola técnica da Unicamp. Sou de Limeira e assim que soube da possibilidade de estudar na UFABC pelas cotas fiz minha inscrição. Para mim, essa possibilidade foi boa, mas acho que se a educação recebesse mais atenção e se tivesse mais qualidade, não precisaria de cota."

Cefet de São Paulo já supera a legislação proposta

Mesmo sem legislação específica para reserva de vagas, a maioria das matrículas firmadas em escolas técnicas federais instaladas em São Paulo são efetuadas por alunos da rede pública de ensino. Na prática, a projeto em debate na Câmara não deve alterar o quadro, pelo menos na Cefet (Centro Federal de Educação Tecnológica) da Capital.

O diretor Garabed Kenchian afirma que 66% dos 3.800 estudantes matriculados já eram da rede pública. "Se a medida for aprovada, não teremos uma mudança significativa em nossas classes. Os cursos técnicos respondem às necessidades deste perfil de alunos, que precisa se profissionalizar para entrar no mercado de trabalho", diz Kenchian.

A mudança só seria percebida na disputa por vagas pelo ensino médio e curso de técnico integrado. "Pela qualidade do estudo, há muitas inscrições de pessoas que desejam migrar do particular para o público. A procura para cursar a especialidade técnico integrado, por exemplo, é de 76% entre estudantes da rede privada." A relação é inversa quando se analisa a procura por vagas em Licenciatura. Segundo dados do primeiro semestre deste ano, há apenas 20% de matriculados oriundos de colégios particulares.

Apesar de já ultrapassar a cota proposta pela senadora Ideli Salvatti, as Cefets formularam um programa de incentivo ao ingresso de alunos da rede pública. A nota obtida no vestibular recebe um bônus de 10% se o candidato tiver cursado o ensino gratuito ou se declarar negro, pardo ou indígena.

Coordenadores de vestibular são contrários à medida

Se nas escolas técnicas do governo a medida não surtirá grandes alterações, nas universidades federais a possibilidade já levanta discussão no meio acadêmico. O aval dado pela Comissão de Educação do Senado ao novo modelo de cotas movimentou o manifesto de 28 coordenadores de vestibular de instituições de ensino superior do País. A posição dos profissionais é contrária à implementação da medida por considerar que o projeto retira a autonomia das universidades.

Em carta enviada ao presidente da Câmara dos Deputados, deputado Arlindo Chinaglia (PT), a comissão de coordenadores afirma que é graças à autonomia dos centros de ensino que o Brasil goza de um sistema de estudo, pesquisa e extensão diverso, criativo e reconhecido no mundo inteiro.

"Hoje em dia mais de 50 instituições de ensino superior adotam políticas afirmativas (programas de incentivo à participação de alunos da rede pública), cada uma adaptada à sua realidade local e de acordo com os desejos de seu corpo docente, discente e funcional", diz a carta. "Somos todos favoráveis a diversidade entre as instituições, na forma de diferentes programas de inclusão", assinam os professores da Unicamp, Unesp, UFSCar e UFMG, entre outros.

O ministro da Educação, Fernando Haddad, foi procurado para comentar o novo projeto de cotas a ser implementado no País, mas não se manifestou. A Secretaria de Estado da Educação também preferiu não comentar o projeto.




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