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Dança de lágrimas e podridão
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11/12/2008 | 07:00
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Não espere assistir a um tradicional Lago dos Cisnes permeado por tutus, pontas e delicadeza aliada ao rigor clássico dos movimentos, além de uma clara diferenciação entre os solistas do espetáculo - a amada do príncipe Siegfried, Odile, e a feiticeira Odette -, somente neste fim de semana no Teatro Municipal.

A convite do Balé da Cidade de São Paulo, o coreógrafo andreense Sandro Borelli recriou, a partir da emoção, o balé do compositor russo Tchaikovsky dividido em quatro atos, considerado um dos maiores de todos os tempos.

"Toda a idéia partiu das lágrimas dos cisnes do texto original, que acabam por formar o lago. Lágrimas surgem de uma emoção forte, seja de alegria ou de dor intensas. Escolhi investigar o sentimento de dor que está contido nessas lágrimas, como se tivesse em mãos uma lupa ou microscópio. E encontrei ali microorganismos, colônias de bactérias, que habitam essas lágrimas expelidas por causa da dor", conta Borelli. Seres que abandonam o estado invisível a olho nu e ganham vida como bailarinos. "No fundo, o Lago original parte daí, ele é muito doloroso."

Imagens do Inferno de Dante, primeira parte da obra de Dante Alighieri, A Divina Comédia, assim como uma canção composta por Bertolt Brecht e Kurt Weill, A Balada da Menina Afogada, que descreve o percurso de um corpo em decomposição até o fundo de uma represa, alimentaram a versão de O Lago dos Cisnes? de Borelli, intitulada propositalmente com um ponto de interrogação.

"Não espero o estranhamento do público, mesmo porque estamos propondo uma pergunta. Jamais pensei em suplantar a genialidade da obra, mas de apresentar essa visão interior particular." Um cenário feito de tecido pintado, que se assemelha a paredes enferrujadas bem pesadas, foi pensado por Jean-Pierre Tortil para dar a impressão de estarem mergulhados em uma lata sobre a qual o público observa de cima.

O figurinista Marcelo Pies acompanha o movimento do cenário e veste os bailarinos com camisetas e calças de cores escuras, no estilo tie-dye, que aparentam estar prestes à corrosão pelo excesso de sujeira.

Gustavo Domingues adiciona ruídos das profundezas de um oceano às músicas de Tchaikovsky, que serão tocadas ao vivo pela Orquestra Experimental de Repertório, regida pelo maestro Jamil Maluf.

Borelli também acrescentou à montagem um insight que teve ao observar bolhas formadas na beira do Rio Tietê num dia quente, por causa da fermentação. "Não passa de um pântano formado por homens que tentam se salvar em meio à podridão."

O Lago dos Cisnes? - Versão de Sandro Borelli. Teatro Municipal - Praça Ramos de Azevedo, s/n.º. Tel.: 3397-0327. 6.ª, sáb. e 2.ª, 20h30; dom., 17h. Ingr.: R$ 5 a R$ 15. Até segunda-feira.

 




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