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ECA, 25 anos e muito a avançar
Por Yara Ferraz
Do Diário do Grande ABC
13/07/2015 | 07:00
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Pelas ruas de Santo André, dois adolescentes de 15 anos fazem malabares em troca de moedas. Eles passam a maior parte do tempo nas ruas, em vez de estudar. As dificuldades fizeram, inclusive, com que um deles desistisse de seus sonhos. No dia em que o ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) completa 25 anos, hoje, o Diário conta suas histórias.

D.D.C. mora com a mãe e o padrasto no Parque João Ramalho. O pai abandonou a família e quase nunca ajuda a ex-mulher, muito menos o filho. O jovem não vai à escola. Segundo ele, a mãe trabalha muito e não tem tempo de matriculá-lo. O dinheiro que ganha é para ajudar os cinco irmãos. “Rezo todas as noites, mas nunca fui atendido. Deixei de sonhar”, disse.

Colega de D.D.C., L.R. está na 8º ano do Ensino Fundamental e estuda pela manhã. Ele tem dois irmãos e mora apenas com o pai, já que a mãe foi embora de casa quando ele ainda era pequeno. Tudo o que ganha nas ruas é dividido com a família. “Tenho o sonho de ser jogador de futebol e melhorar de vida.”

O ECA foi criado para garantir o direito de jovens como os dois moradores da região. O estatuto substituiu o Código de Menores. Quando os garotos desta reportagem nasceram, a legislação vigorava havia dez anos e, mesmo assim, não lhes possibilitou uma vida digna.

Conforme avalia o coordenador da Comissão de Infância e Juventude da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) de São Bernardo e integrante do Conselho Estadual da Criança e Adolescente, Ariel de Castro Alves, ainda há abismo entre teoria e prática. “O desafio após 25 anos do ECA está na sua efetiva implementação. Para tanto, é necessária atuação maior do Estado e da sociedade, principalmente por meio de orçamentos públicos e recursos privados destinados aos fundos que priorizem a área social e a cidadania.”

O procurador de Justiça Clilton Guimarães explicou que o ECA prevê que as prefeituras mantenham políticas públicas para as crianças em situação de rua, porém, nem sempre isso acontece. “A família precisa ser assistida para que tenha condições de criar essa criança. Em tese, os governantes que são omissos são passíveis de responder por ato de impropriedade administrativa, mas muitos alegam falta de recursos para a execução das ações.”

Mesmo com problemas, o ECA possibilitou a redução da mortalidade infantil e a inserção de crianças nas escolas, lembra Ariel. “Houve ampliação do acesso ao ensino público, mesmo que a qualidade esteja pior.”(colaborou Ari Paleta)


Redução da maioridade penal pode gerar dúvidas

O ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente) protege todos que são menores de 18 anos. Com a aprovação da redução da maioridade penal para 16 anos, especialistas acreditam que a legislação pode ser reinterpretada.

Atualmente, o projeto foi aprovado em primeira votação na Câmara dos Deputados no início deste mês. Conforme o texto, que ainda precisa passar por mais uma sessão na Câmara e outras duas no Senado, os menores serão responsabilizados em caso de crimes hediondos, como estupro, latrocínio, homicídio e lesão corporal seguida de morte.

De acordo com Ariel de Castro Alves, todos os direitos dos menores serão fragilizados. “Por exemplo, exploração sexual de vulneráveis. A partir do momento em que a redução da maioridade penal for aprovada, a pessoa com menos de 16 anos pode não ser mais vulnerável. Além disso, como proibir alguém que já tem sua maioridade penal de consumir bebidas alcoólicas? São muitas divergências”, opinou.

Para ele, os principais prejudicados serão os jovens entre 16 e 18 anos. “O ECA não teria validade para essa faixa etária, por esses adolescentes serem considerados imputáveis, ou seja, responsáveis criminalmente pelos seus atos. Eles não seriam considerados menores, mas sim adultos. A redução é um golpe no ECA”, afirmou.

O procurador de Justiça Clilton Guimarães tem a mesma opinião. “É muito contraditório permitir que adolescentes possam ir para a cadeia como responsáveis por esses crimes. O ECA é uma legislação prestigiada e elogiada por setores da Organização Mundial da Saúde e da Unicef (Fundo das Nações Unidas para a Infância). Ela só precisa ser cumprida.” (YF) 




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