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Fiscais do Sarney fazem 20 anos
Por Mariana Oliveira
Do Diário do Grande ABC
19/02/2006 | 08:03
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28 de fevereiro de 1986. A data, escolhida pela equipe econômica do então presidente José Sarney para o lançamento do Plano Cruzado, marcou o início da implantação de diversas medidas para estabilizar a inflação no Brasil. Embora fracassado, o pacote serviu de subsídio para que o resultado fosse alcançado após quatro outros planos econômicos: Bresser (1987), Verão (1989), Collor (1990) e, finalmente, Real (1994), o primeiro a atingir o objetivo de controlar a inflação.

O Plano Cruzado teve como principais medidas introduzir uma nova moeda, o cruzado, em substituição ao antigo cruzeiro; congelar todos os preços, tanto de empresas privadas quanto tarifas públicas; conceder abono salarial de 8% para todos os trabalhadores; reajustar o salário mínimo em 15%; e criar um gatilho salarial – quando a taxa de inflação chegasse aos 20%, os salários seriam reajustados na mesma proporção. Tudo isso para tentar estabilizar a inflação, que atingia a taxa média de 15% ao mês.

Em princípio, o plano parecia um milagre. Como os cidadãos eram conclamados a participar como fiscais do Sarney e evitar que as empresas remarcassem preços, a popularidade do então presidente foi às alturas. O programa se transformou no principal trunfo de Sarney para as eleições que ocorreriam em 15 de novembro do mesmo ano. Os resultados após o lançamento do Cruzado ajudavam as expectativas positivas: a taxa de inflação em janeiro de 1986, que havia alcançado 17,79% pelo IGP-DI, caiu consideravelmente. Em abril, houve deflação de 0,58%, de acordo com o mesmo índice.

Mas, após alguns meses, a situação favorável começou a dar sinais de desgaste, segundo Marcos César de Barros, professor de Economia Brasileira da Unia (Centro Universitário Santo André) e economista do Observatório Econômico, da Prefeitura de Santo André. Por conta dos salários elevados e dos preços congelados, a demanda por produtos cresceu muito. “Começaram a faltar itens nas gôndolas dos supermercados, e algumas marcas simplesmente sumiram de circulação.”

Os produtores, conforme o professor, passaram a estocar mercadorias, esperando que os preços se recuperassem. O ágio se transformou em prática comum – se um produto custava 20 cruzados mas não era encontrado no mercado, os consumidores pagavam 30 cruzados, por exemplo. A maquiagem dos produtos também virou rotina: fabricantes mudavam a embalagem do item para vender com outro preço. “Isso fez com que o plano virasse água”, sintetiza Barros.

Bastidores – O jornalista Carlos Alberto Sardenberg, apresentador da rádio CBN e colunista do jornal O Estado de São Paulo, participou do lançamento do Plano Cruzado. De 1985 a 1987, ele foi coordenador de Comunicação Social do Ministério do Planejamento, na gestão de João Sayad, e mais tarde escreveu o livro Aventura e Agonia nos Bastidores do Cruzado.

Segundo ele, as idéias para a formatação do plano começaram a ser debatidas em 1984. “A intenção ganhou força depois que Israel e Argentina implantaram planos mais ou menos na mesma direção. Mas foi apenas em outubro de 1985 que o pessoal do governo Sarney começou a se reunir semanalmente para discutir um plano brasileiro.”

De acordo com Sardenberg, o Plano Cruzado surgiu dos estudos dos economistas Pérsio Arida, André Lara Resende e Francisco Lopes, conhecido como Chico Lopes. A proposta de Lara Resende e Arida, chamada de plano Larida, não previa congelamento, mas uma coordenação dos preços antes e depois da troca da moeda.

Já Lopes entendia que era necessário o congelamento no lançamento do Cruzado. Na preparação do pacote, levaram-se em consideração as duas propostas, mas a opção pelo congelamento foi ficando cada vez mais evidente. No entanto, os três economistas concordaram que o congelamento tinha de ser temporário, por três meses, a fim de impedir que a inflação retornasse.

Foi somente em 14 de fevereiro de 1986, quando Sarney empossava o ministro da Fazenda Dílson Funaro, que ocupava o lugar de Francisco Dornelles, demitido, que o então presidente informou a Funaro e João Sayad, ministro do Planejamento, que lançaria o Cruzado dali a 14 dias, em 28 de fevereiro.

“Os preparativos foram a toque de caixa. Obviamente, foi uma correria danada ter de preparar tudo em duas semanas. O pessoal tinha estudos, mas não tabelas, cálculos, portarias e decretos. A conversão dos salários, por exemplo, ficou pronta dias antes do lançamento”, conta Sardenberg.




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