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Lei Seca: a um passo do descrédito dos motoristas
Por Tatiane Conceição
Do Diário do Grande ABC
20/06/2010 | 07:01
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A Lei Seca, que impõe penalidades para o motorista que consome álcool, completou dois anos ontem. Segundo especialistas, aumentou a consciência de que álcool e direção não combinam, o que gerou uma leve redução no número de mortes por acidentes de trânsito. No entanto, eles também concordam que a lei perdeu força e não é mais levada a sério como nos seus primeiros meses.

"Hoje em dia você vê muitos grupos que entendem que não dá para beber e dirigir", diz o professor de Engenharia de Trânsito da PUC-PR (Pontifícia Universidade Católica do Paraná) José Mário de Andrade.

"É inegável que houve maior conscientização de que o estado de embriaguez é incompatível com o ato de dirigir automóveis", completa a professora na área de Engenharia Urbana da UFABC (Universidade Federal do ABC) Silvana Zioni.

Segundo dados do Ministério da Saúde, houve em dois anos redução em 6,5% no número de mortes depois da implantação da Lei Seca no Estado de São Paulo, o que significa 499 vidas "poupadas" em comparação com o ano anterior à lei.

FALTA FISCALIZAÇÃO - No entanto, apesar dos avanços, a Lei Seca está a um passo da desmoralização, devido a uma série de fatores, entre eles a falta de pressão para o cumprimento da norma.

"Passou aquele momento de oba-oba e dificilmente você vê alguma fiscalização nas ruas", declara o professor Roberto Bahia, da Faculdade de Direito de São Bernardo.

"O que inicialmente parecia uma estratégia de fiscalização e acompanhamento não se manteve nestes dois anos. É uma certa hipocrisia social: vou lá, crio uma lei e depois de seis meses todo mundo esquece", critica Silvana .

Ela destaca ainda que não se trata apenas de ampliar o número de policiais e bafômetros. "É necessário criar alternativas para que as pessoas não peguem o carro em estado de embriaguez", diz a professora.

Entre os pontos que ela acredita que faltam para a Lei Seca ser efetivamente cumprida estão o incentivo ao uso de táxis, o aumento na rede de transporte coletivo e a fiscalização da venda de bebida alcoólica nas estradas.

DADOS DA REGIÃO - A Polícia Militar informou que o uso do bafômetro no policiamento do Grande ABC teve início em fevereiro de 2009. Ao todo, a região dispõe de 32 etilômetros, nome técnico do aparelho que mede o nível de álcool no sangue.

Deste período até maio de 2010, foram submetidos à fiscalização de trânsito aproximadamente 481 mil motoristas, sendo que destes foram autuados 744. Houve ainda 84 prisões na região por conta da Lei Seca.

Fazendo uma comparação entre o primeiro e o segundo ano da norma, houve um crescimento de 2087 ocorrências de trânsito, o que se traduziu em mais 362 pessoas feridas de um ano para outro.

Embora a PM ressalte que este aumento não está relacionado somente com pessoas alcoolizadas, este número confirma a percepção de que o segundo ano da Lei Seca foi bem menos efetivo em termos de fiscalização do que o primeiro.

Frequentadores de bares

O Diário foi avaliar o aniversário de dois anos da Lei Seca junto dos principais interessados na norma: os frequentadores de bares. Para eles, a lei é importante, mas ainda falta muito para que ela seja de fato algo que impeça o hábito de se dirigir embriagado.

Na roda de conversa estavam presentes o representante comercial José Carlos do Nascimento, 53 anos; o contador Luiz Carlos de Morais, 56; o biólogo William Tosi Seppa, 58; o dentista Carlos Felipe Dal Molin e seu filho, o estudante Bruno Dal Molin, de 21 anos.

Como os cinco falaram várias vezes ao mesmo tempo, segue um resumo das principais frases: "O negócio é que foi afrouxada a fiscalização. Se não dói no bolso, não funciona"; "O limite da Lei Seca brasileira é muito rígido, na Europa não é assim"; "Como vão fazer a fiscalização com tão poucos bafômetros?", e "Quem vai ao bar para tomar guaraná?"

Da turma, um admitiu já ter feito parte de "rodízio de motoristas" para se evitar a combinação entre bebida e direção.

E, entre os cinco, Bruno foi o único que já foi parado em uma blitze, que não era sobre a Lei Seca. Por conta isso, ele não foi submetido ao teste do bafômetro.

A reportagem perguntou ao grupo, cuja mesa continha copos de cerveja, se eles iriam dirigir em seus carros próprios para casa. A resposta foi: "Sim, mas ainda iremos almoçar e depois assistir a um jogo de futebol, e com isso o nível de álcool vai abaixar".

CARONA PARA CASA - O gerente do Bar Figueiras, em Santo André, Evandro Barbosa da Silva, de 37 anos, contou que após a Lei Seca foi contratado um motorista para levar os frequentadores embriagados para casa. Quando a lei foi criada, o profissional fazia de 30 a 40 viagens por fim de semana. Hoje, este número foi reduzido para 10 ou 15.




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