Cultura & Lazer Titulo
Segredos da Mozzarella
Por Sílvio Lancellotti
Especial para o Diário
20/01/2007 | 20:56
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Antes de mais nada, permitam a cara leitora e o prezado leitor que aqui eu respeite o idioma dos meus ancestrais e não nacionalize a belíssima palavra “mozzarella”. Tudo bem, a manterei entre aspas, para caracterizar a utilização de um estrangeirismo. Mas, convenhamos, apenas ocorre que eu não consigo escrever mussarela – e muito menos muçarela, conforme pedem os manuais de redação de alguns rotativos portentosos do país. A vera “mozzarella”, afinal, exige mais respeito do que a tradução elementar do seu nome ao português. A raiz da expressão advém de “mozzatura”, um termo nada poético, que significa mutilação, decapitação, ou, simplesmente, o corte.

A “mozzarella”, de leite de vaca, de leite de búfala, ou até de ambos, combinados em diferentes proporções, é um tipo de queijo cuja massa, depois de coalhada e aquecida várias vezes, redunda em tiras longas e delicadas – as quais o produtor ainda submete a um banho derradeiro, água à temperatura de 90 graus. As melhores marcas completam a operação com um enrolamento manual, no tamanho e no formato desejados. Pode-se conservá-la fresca, no próprio soro do seu leite, ou esperar que se curta, perca os seus líquidos, se torne curada e bem sequinha.

Saboreia-se a “mozzarella” na Velha Bota desde o século XII, quando um certo Alicandri, abade de um monastério de Cápua, perto de Nápoles, na região da Campânia, idealizou um queijo que oferecia, aos nacos, aos talhos, aos peregrinos famélicos que visitavam a igreja local de San Lorenzo.

De fato, a melhor “mozzarella” do planeta ainda hoje se faz na Campânia, embora haja exemplares excelentes em outras plagas, Lácio, Molise e Apúlia. No Brasil, de maneira ainda incipiente, a relíquia, exclusivamente de leite de vaca, aportou no final do século XIX.

Absolutamente de leite de búfala, porém, só chegou nos princípios da década de 1950. Era, então, integralmente artesanal – e muito cara. Daí, com o tempo, a fim de baratearem seu preço e de ampliarem suas vendas, alguns fabricantes passaram a misturar o leite de vaca ao leite de búfala – um artifício também comum e habitualmente aceito na Velha Bota.

Lá, como cá, todavia, os defensores da tradição enfim decidiram separar a legítima da combinada. Na Itália, hoje, a verdadeira “mozzarella” de búfala recebe um logotipo DOC, sigla de Denominação de Origem Controlada. Aqui, a Associação Brasileira dos Criadores de Búfalos também criou, recentemente, o seu Selo de Pureza. Basta examinar a embalagem e verificar a sua presença, bem delineada. A ausência eventual de tal dístico não significa, óbvio, que o produto seja inferior, ou ruim. O selo, no entanto, garante que a “mozzarella” contém apenas o leite de búfala, e nem uma gotinha do leite de vaca.

Na Itália, melhor, mesmo a “mozzarella” que pode se considerar de búfala passa por um outro gênero de crivo. Só deve ostentar, no seu rótulo, a palavra “Campânia”, aquela proveniente dessa região ou do Sul do Lácio. Aquela feita em outras plagas, ainda que exiba 100% de pureza, deve ter, na embalagem, a expressão “Mozzarella di Latte di Bufala”. Aquela feita, predominantemente, com leite de búfala, e uma quantidade menor de leite de vaca, precisa mostrar, no rótulo, a frase “Mozzarella con Latte di Bufala”. Enfim, aquela baseada no leite de vaca, mais alguma adição do leite de búfala, vira a “Fior di Latte”.

Sempre, e sempre, verifique as informações da embalagem. Seja qual for a matéria-prima e a situação. A seguir, dicas de uso e de conservação da “mozzarella” e duas receitas: a clássica Caprese que eu, ousado, recriei; e um prato de massa que os meus filhos mais velhos me ajudaram a desenvolver.

Receitas

Nuova Insalata

Caprese do SL

Ingredientes, para uma pessoa: 1 tomate, bem maduro, do tipo pêra, de formato oblongo, bem compridinho, preferivelmente. Azeite de olivas. Sal. 1 pelotinha de "mozzarella" de búfala. Um raminho elegante de manjericão.

Modo de fazer: Com uma faca bem afiada, remover a tampa do tomate. Delicadamente, com a mesma faca, ou com uma colher de tamanho adequado, extrair o miolo do tomate, os seus brancos e as suas sementes, sem machucar a polpa e a pele exterior. Numa cumbuquinha, com azeite, o sal a gosto, folhas de manjericão, marinar o tomate por dez minutos. Retirar, escorrer. Preencher o vazio do tomate com a pelotinha de "mozzarella". Deixar que fique, fora do vazio, como contraste visual, ao menos metade da pelotinha. Dispor, de forma charmosa, no prato que irá à mesa. Enfeitar com o raminho de manjericão. Banhar o conjunto, generosamente, com mais azeite. Caso queira uma Caprese ainda mais inusitada, aqueça tudo, por uns trinta, quarenta segundos, no forno ou no micro, até que o tomate se amolengue e a "mozza" ameace derreter.

Cappelletti

Ditcho & Dutcha

Ingredientes, para uma pessoa: 150g de cappelletti de carne, já pré-cozidos, bem al dente. 2 colheres, de sopa, de azeite de olivas. 1 1/2 xícara, de chá, de polpa peneirada de tomates. 2 colheres, de sopa, de vinho tinto, bem seco. 3/4 de xícara, de chá, de "mozzarella" comum, grosseiramente ralada. 1 colher, de sopa, cheia, de queijo parmesão, raladinho. Sal. 1 colher, de chá, bem cheia, de orégano. Mais azeite de olivas, para a finalização da delícia.

Modo de fazer: Numa frigideira farta, aquecer, apenas aquecer, o azeite de olivas. Agregar a polpa de tomates e o vinho tinto. Misturar e remisturar. Em fogo suave, levar à ebulição. No instante em que despontarem as primeiras borbulhas, mexer e remexer, de novo. Cozinhar, mansamente, por cerca de cinco minutos, sem permitir, jamais, que a polpa grude no fundo da frigideira. Incorporar a "mozzarella" e o parmesão. Virar e revirar, por alguns instantes. Importante: a "mozza" e o parmesão, apenas, começarão a se derreter na polpa – não deixar que se desmanchem em demasia; preservar a textura pedaçudinha deste molho. Acertar, se necessário, o ponto do sal. Temperar com o orégano. Misturar e remisturar. Reaquecer a massa, rapidamente, no conjunto do seu molho. No prato respectivo, banhar com mais um fio de azeite. Sem problema, caso você deseje, à mesa, espalhar mais parmesão raladinho sobre o topo.

Dicas

Truques para as amostras de Búfala

Entraram na moda, de uma década para cá, as pizzas de "mozzarella" de búfala. Cuidado, porém, ao colocar a "mozzarella" muito fresca no topo de uma redonda. Como ostenta uma quantidade quase absurda de soro, ainda, na sua composição, digamos, esponjosa, a muito fresca liberta esse soro sobre a massa das pizzas – que somente se cozinham, e não assam corretamente. Por favor, consuma a "mozzarella" fresca imediatamente, sem resguardá-la no frio da geladeira. Para outras opções, inclusive a das pizzas, elimine o líquido que protege a "mozzarella" e a guarde, embrulhada em papel-filme, na parte mais baixa do refrigerador. Não ficará perfeita para se desfrutar, ao natural – mas, se tornará impecável em qualquer processo que exija o derretimento.

Dentre as marcas, a campeã

São inúmeras as marcas de categoria, hoje, no Brasil, no departamento da "mozzarella" de búfala. De qualquer forma, preciso sugerir "La Bufalina", que os irmãos Davide e Vittorio Auricchio, provenientes de Battipaglia, na Campânia, implantaram em São Paulo, 1998, conceito e tecnologia totalmente peninsulares (tels.: 3825-8000 e 5051-3737) – e preços acessíveis, em relação à sua qualidade superlativa.

Avalizam a minha postura inúmeros restaurantes celebrados da capital, como Baby-Beef Rubaiyat, Don Pepe di Napoli, Fasano ou Fogo-de-Chão, seus consumidores fiéis. Recentemente, aliás, um teste de degustação, realizado pela revista Affari, da Câmara Italiana de Comércio no Brasil, destacadamente elegeu a "Bufalina" como a melhor do segmento.



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