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Qualificar agora, para quantificar depois
Antonio Carlos do Nascimento
21/06/2021 | 00:16
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Restrição calórica para os filhos era conduta absolutamente inimaginável para os pais de minha geração, e quando o faziam era pela estrita necessidade de conter o orçamento doméstico, especialmente nas fatias sociais com recursos mais limitados.

A regra universal era ingesta livre, sobretudo de grãos, verduras, legumes e carnes, enquanto a indústria alimentícia engatinhava, limitando-se aos embutidos e enlatados no horizonte de suas vendas. O refrigerante era artigo de luxo, destinado a datas festivas e almoços de domingo.

Fica claro que a citada liberdade não encontrava amplas alternativas nos anos de 1960 e 1970 e com isso alguma proteção nos foi dada, embora as gorduras vegetais hidrogenadas já fizessem imensos estragos, com as margarinas invadindo as cozinhas, bolos e tortas, enlouquecendo nossos pensamentos e iniciando os danos em nossas coronárias e outros setores orgânicos.

Atualmente, ainda que apenas em alguns perfis socioeconômicos, é bastante frequente o interesse dos pais com o montante energético entregue a seus filhos, dada a grande preocupação com a obesidade infantil e todas as suas consequências. Vê-se, não sem sofrimentos mútuos, mesas com ausências sentidas, tais quais bebidas açucaradas, frituras, sobremesas e muita limitação em quantidades.

Mas é necessário ir bem além da preocupação quantitativa e sedimentarmos o conceito qualitativo. A cada dia é percebido com mais clareza que alguns componentes adicionados em alimentos impõem ao organismo uma condição mais pedinte, inicialmente para a refeição seguinte, para depois modificar os centros de controle de fome e saciedade e aumentar definitivamente o consumo calórico diário. Então, devemos evitá-los, ou, melhor ainda, retirá-los das dietas de crianças e adolescentes.

São várias estratégias utilizadas pela indústria alimentícia para provocar os desejos da aquisição, que vão desde as bonitas apresentações, suas cores, substâncias que lhe dão aromas e sabores, além daquelas que lhes conservam, incluindo cor e textura. Estes elementos químicos modificam a gestão da fome e saciedade em nossos cérebros, sendo provavelmente muito mais certeiros quando encontram as jovens células cerebrais de crianças e adolescentes, lhes destinando à obesidade.

Pouco importa o número restrito de calorias ingeridas, interessa o quanto estes produtos são capazes de induzir mudanças, pois a restrição calórica utilizando produtos processados estará formatando exageros dietéticos futuros, para os quais nosso desejo pela magreza não vence as imposições de nossos centros de fome e saciedade modificados.

Inevitavelmente virão as adversidades, com estas chegarão o estresse, com este ocorrerá a humana e fisiológica compensação emotiva com ingestas alimentares confortantes, mas além das exigências fisiológicas. Antibióticos, anti-inflamatórios e tantos outros fármacos serão utilizados e talvez, afora seus benefícios, alguns modifiquem nossos sensores, que podem ainda ser alterados por inúmeros elementos do meio ambiente.

Para tantas certezas indesejáveis para a vida de nossos filhos, torna-se mais importante protegê-los naquilo que é possível, mantendo-os livres em suas refeições, mas para alimentos isentos de modificações e adições danosas.

Qualificar a dieta nos primeiros anos de vida é limitar a chance de obesidade futura e muito embora o excesso de peso possa chegar por muitas trilhas, retiraremos das próximas gerações o seu principal caminho. 




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