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Transição ecológica por meio da permacultura
Por Luis Felipe Xavier e Robson da Silva Moreno
06/11/2020 | 00:12
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Pesquisas e projetos recentes sobre os conceitos emergentes têm demonstrado que uma radical ampliação da cobertura vegetal em um sistema que articule desde pequenas áreas verdes nos espaços públicos e lotes urbanos (incluindo tetos e paredes verdes) fornece inúmeros benefícios aos moradores dessas áreas (melhora no manejo das águas urbanas, mitigação dos efeitos das ilhas de calor, habitat para vida silvestre, melhora, em diversos aspectos, na saúde pública etc.). Estas pesquisas raramente abordam a integração desses sistemas para o cultivo de alimentos, que pode ser enquadrado como permacultura. O tema foi tratado em nota técnica publicada na 14ª Carta de Conjuntura (outubro/2020) do Observatório Conjuscs (Observatório de Políticas Públicas, Empreendedorismo e Conjuntura da Universidade Municipal de São Caetano).

A permacultura é uma das respostas às crises que se desenhavam no horizonte dos países industrializados, que deriva do conceito da ‘agricultura permanente’, criada pelos australianos Bill Mollison e David Holmgren, nos anos 1970. A publicação A Ética e Princípios do Design elaborada por eles parte da articulação de uma série de ideias para a criação de sistemas agrícolas, com vistas a garantir o abastecimento alimentar a longo prazo, contrapondo a agricultura tradicional, a partir de 12 princípios, comuns aos conceitos emergentes. Como parte de uma visão sistêmica, e traz à tona a importância da articulação de uma estrutura em rede, coloca dimensão social no centro da discussão de  ética e do design, para tratar de uma ampla ação que pode contribuir com um plano de manejo socioambiental e de segurança alimentar.

Há um caso específico que deve ser destacado que foi a transição realizada em Cuba nos anos 1990, que era dependente de mercados de exportação de produtos primários, trabalhos precários, utilização de agrotóxicos – como Brasil se configura hoje. A transição ecológica da maior cidade do país, Havana, que no início dos anos 2000 respondia pela metade da produção das hortaliças em Cuba, foi significativa. Pesquisadoras da Embrapa, que estudaram o caso dessa transição ecológica em 2001, mostraram que a produção orgânica de alimentos saltou de 4.200 toneladas por ano, em 1991, para 2 milhões de toneladas por ano em 2001. Além do plano de segurança alimentar, a adoção do modelo mostrou reflexos no manejo das águas de seus rios, avaliando-se o impacto da agricultura sustentável na qualidade da água dos rios centrais em Cuba (bem melhor) em comparação com outros locais nos Estados Unidos.

Há lições deste caso que devemos tirar nesta crise, como a necessidade de se produzir alimentos em áreas urbanas, como elementos-chaves das novas concepções de planejamento e design ambiental, como:  respeito ao meio ambiente (através da reorientação de seu manejo); a busca da qualidade de vida; a valorização de uma estrutura em rede articulada pelo Estado. A política de agricultura familiar urbana, e periurbana, pode ser implantada em qualquer bioma do mundo, não sendo isolada de outras ações do Estado, como o plano de mobilidade, da educação, da saúde, de geração de emprego e renda etc, principalmente em um País como o Brasil, onde a demanda das famílias é responsável por 60% do PIB (Produto Interno Bruto) e que muitas crianças que dependem da alimentação da merenda da escola, na hora do almoço, para sobreviver estão passando fome, porque as escolas estão fechadas!

Não há lógica em desmantelar uma rede de proteção social do Estado e de combate à pobreza, enquanto a pandemia nos impõe uma reação imediata de preservação da vida, do meio ambiente e das relações humanas antes que o processo de desumanização a que estamos sendo submetidos seja irreversível.

Há várias experiências que nos remetem a refletir que um outro ‘fim de mundo’ é possível, onde haja uma articulação compartilhada que vise o bem comum, com a dimensão social na ponta e na centralidade de todas as outras dimensões, com administradores e gestores de diversas instituições e diferentes áreas do conhecimento, com pessoas que vivem e não se evaporam ao fim de uma longa jornada de trabalho e que devidamente também têm que ser convidadas para discussão, para a ação e, principalmente, para ‘a ceia’! 




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