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Vereador Mario de Abreu: ‘Suspeito haver conotação política no meu caso’
Por Raphael Rocha
Do Diário do Grande ABC
22/06/2020 | 07:00
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Claudinei Plaza/DGABC


O advogado Mario de Abreu (PDT) havia sido eleito vereador em 2016, tinha sido indicado secretário de Gestão Ambiental do prefeito Orlando Morando (PSDB) em 2017. A ascensão foi interrompida no dia 31 de outubro daquele ano, quando a Operação Barbatanas, conduzida pelo Gaeco (Grupo de Atuação Especial de Combate ao Crime Organizado), apontou que ele, então no PSDB, vendia licenças ambientais e cargos. Em entrevista exclusiva ao Diário, Abreu, que segue afastado da função de vereador, nega as acusações, reclama de demora para analisar seu regresso à Câmara e diz suspeitar de conotação política em todo o episódio.

O Gaeco apontou que o sr. promovia venda de licenças ambientais e de cargos dentro da Secretaria de Gestão Ambiental. Como o sr. recebeu as acusações?
Ninguém espera algo desse jeito. Eu fui pego de surpresa. Todo o caso começou com uma pessoa, uma menina (Patricia Martiniano da Rocha) comentando em um grupo de WhatsApp que teria comprado uma vaga no gabinete, trocado o carro por uma vaga. É meio relativo isso. Quando você concorre a um cargo de vereador, tem pessoas dispostas a ajudar. Colaborar com suor, trabalho ou financeiramente. Essa questão do carro ficou com duplicidade de entendimento. Não sei o que o pai dela (Valmir Martiniano da Rocha Filho) combinou com ela. Em 2016, eu não era nada e ele me ofereceu ajuda financeira para ganhar a eleição. Qual a tendência hoje? Você eleito vereador, vai contratar um desconhecido ou alguém de sua confiança, que esteve com você na eleição, financeiramente ou dando o suor? Eu retribui. Não significa que ele comprou o cargo. Ele indicou a filha dele. Aí se ele pegou o carro da filha, isso eu não sei. O carro não veio para meu nome. Levantaram se tinha seguro no meu nome, não tinha.

Mas há acusação também das vendas de licenças ambientais na sua secretaria...
O negócio da licença é meio relativo também. Não tem como a Prefeitura de São Bernardo vender licença por corte de árvore, como está na acusação, porque esse serviço é determinado pela Cetesb (Companhia Ambiental do Estado de São Paulo). Existe lei específica. Para desmatar ou fazer uma terraplenagem em São Bernardo você só tem como dar entrada no pedido em São Bernardo. A documentação é encaminhada para a Cetesb, que verifica, dá anuência e devolve o processo para São Bernardo cumprir. Não despachava nada disso, não deliberava. A Cetesb determinava o cumprimento. Como poderia pedir algo se a Cetesb poderia não liberar? Teria vendido fumaça. Não sei o que aconteceu na diretoria.

O sr. tinha anuência das supostas vendas de licenças ambientais por parte de seus subordinados?
Não. Fiquei sabendo desse suposto esquema, que não está comprovado, diga-se, via processual. As pessoas têm visão errada, achando que o secretário de Gestão Ambiental é especialista. Nem sempre é. Tem conhecimento, claro. Mas tinha profissional que responde por mim. Imagina eu, secretário, com 12 mil processos de licenciamento ambiental, se eu pegar para ler todos eu não trabalho. Por que a secretaria é feita por hierarquia com quatro, cinco diretores, por chefes de seções? Para o processo chegar mastigado (ao secretário). Toda acusação me surpreendeu. Se fizer a leitura toda do processo, os supostos empresários dizem que nunca me viram, nunca falaram comigo, nunca tiveram contato. Há testemunha que disse que nem sabia que o Mario de Abreu era secretário de Gestão Ambiental.

Há também a acusação de emprego de funcionários fantasmas, inclusive com indicações ao gabinete da então vereadora Lia Duarte (PSDB)...
Tinha uma pessoa que me ajudou na eleição, pediu indicação para trabalhar com ela (Lia) e eu indiquei. Ela trabalhava. A Lia é suplente do Mario? Não, não era. Tinha uma pessoa que me ajudou lá (no gabinete de Lia), para ajudá-la (Lia). Trabalhava todo dia, todo mundo via, fazia as demandas de rua. A alegação deles (Ministério Público) diz que havia uma indicação minha, esse cara ficava na rua e a Lia era suplente do Mario, então era funcionário fantasma. Não. Todos os pontos foram assinados pelo cara. A Lia não era minha suplente. Meu suplente, ao pé da letra, é o Ary de Oliveira, que é o primeiro suplente do PSDB. A Lia era terceira suplente. Não tinha como ter relação de hierarquia sobre a Lia no sentido de se ela não fizesse o que eu queria eu poderia tomar o cargo dela.

Um pedido de prisão contra o sr. se baseou em suposta ameaça a testemunha do caso das licenças ambientais. O sr. ameaçou ou teve conhecimento de alguém próximo ao sr. que teria feito?
Era testemunha protegida, ninguém sabia o nome, o endereço, nada. Teve pedido de prisão. A Justiça em primeira instância não deu, entendeu não haver elementos para prisão, pediu para entregar o passaporte, adotou medidas cautelares, me afastou do cargo e tudo mais. Como advogado, eu entendo. Se existe suposto fato, tenho de afastar para apurar porque ali pode atrapalhar. O Ministério Público, não contente com a decisão, entrou com pedido para reconsiderar no Tribunal de Justiça. No dia em que o desembargador (Euvaldo Chaib) decretou a prisão, foi atravessada petição do MP em que uma testemunha procurou o MP porque estava com medo porque havia tomado tiro na janela e estava sofrendo ameaça. Não tinha boletim de ocorrência juntado. Você toma tiro na janela da sua casa e não faz um BO? Se eu tomo tiro na janela eu vou correndo fazer um BO. Ele (Chaib) fez monocraticamente, sem chance de defesa. No direito é garantido a ampla defesa e o contraditório. Você me acusa e eu me defendo.

O sr. trabalhou com o prefeito Orlando Morando antes de ele assumir a Prefeitura. Como viu a postura dele?
Em um primeiro momento, tivemos contato via interlocutores para saber da situação, o que tinha ocorrido. Mediante a gravidade dos fatos, automaticamente ele se desvinculou da minha imagem. Acredito que ele pensou que não pegava bem, para não dizer que estava me protegendo. Ou então, como me disseram, para me preservar também, porque podem dizer que estava usando a influência do prefeito para ajudar no caso, seria obstrução de Justiça. Houve afastamento, sim. Houve abalo, sim. Abalou a relação. Não tive mais contato. Desde então não tive mais contato.

O sr. acha que o prefeito sabia de algo supostamente ilícito que os diretores faziam?
Acho que não. Uma secretaria é um mix. Tem uns 40% de comissionados e uns 60% de concursados. As pessoas concursadas têm 20, 30 anos de Prefeitura. Passaram por dois, três prefeitos. É muito difícil, por mais que você seja centralizador, não tem ciência de tudo que acontece.

Depois da Operação Barbatanas houve a Operação Lix, envolvendo suspeita de cobrança de propina na Secretaria de Serviços Urbanos, chefiada então pelo vice-prefeito Marcelo Lima (PSD) e que culminou na demissão do então adjunto, Mário Orsolan. O processo envolve seu nome. O sr. tinha participação?
Esse comentário eu sequer sabia. Eu soube que meu nome tinha sido citado por algumas conversas que tive com o Mário (Orsolan). Usaram meu nome mais uma vez, com a teoria do domínio de fato. Esse do Marcelo me pegou de surpresa. Nunca fiz nada com o Marcelo. Minha secretaria nunca fez liberação nenhuma específica a pedido do Marcelo ou do Mário para que eles pudessem tomar atitude deles. Acho que era mensagem de terceiros mesmo, por já ter estourado comigo, me usaram como bode expiatório.

Em três anos e meio de gestão, três grandes operações contra corrupção atingiram o governo Morando: a Barbatanas, que envolve seu nome, a Lix e a Prato Feito, que culminou na saída de Carlos Maciel. Por que o sr. acha que o nome do prefeito está envolvido em tantas denúncias?
Ele é o chefe do Executivo. O órgão acusador usa a teoria do domínio de fato. Como chefe, você supostamente tem o conhecimento de tudo. Pela fama que ele tem de ser centralizador, fazem a relação de que ele tem o conhecimento. O MP sempre bate muito, quando se trata de política, de organização criminosa e um é o cabeça. Quem é o cabeça? No caso de um secretário, o cabeça não pode ser o diretor, porque ele não manda. Sempre quem tem a caneta, teoricamente, no entendimento do MP, em uma acusação, tem o domínio do fato, supostamente tem de ter o conhecimento.

O sr. está tentando voltar ao mandato. Neste ínterim, viu outras figuras acusadas voltarem, como o prefeito de Mauá, Atila Jacomussi (PSB), e a vereadora Elian Santana (DEM), de Santo André. Há dois pesos e duas medidas?
Tenho a visão profissional por ser advogado. Tem caso que é mais rápido. Vamos falar em um habeas corpus. A Elian já voltou. Deu sorte que o próprio TRF-3 (Tribunal Regional Federal da 3ª Região) deu. O meu está no STF (Supremo Tribunal Federal). O trâmite é mais demorado. Estou com habeas corpus desde setembro de 2019 para ser julgada a liminar. A Elian teve liminar dada em alguns meses. Você se questiona. O que eu me sinto prejudicado, embora não tenha poder para julgá-los porque sei que cada um tem seu trâmite, é por esvaziar meu mandato. Tive 3.014 votos, pessoas que confiaram em mim. Houve o escândalo. Se amanhã for absolvido, quem devolve meu mandato e a confiança que essas pessoas depositaram em mim? Eu não tive tempo de exercer meu mandato.

O sr. acredita em conotação política no seu caso?
Suspeitei bastante.

Segue suspeitando?
Sigo sempre, na política... Desde o início meu nome estava em alta. Fui o único vereador denunciado por cargo fantasma no gabinete. Meu trabalho era crescente, fui eleito bem. Apesar de ser a segunda eleição, na primeira eu tive 1.400 votos, nesta segunda eu mais do que dobrei minha votação. Fui logo ser secretário. Imagina, eleito vereador de primeiro mandato e logo ser secretário, acredito que causa um pânico. Ouvi de tudo.

Teme ser preso?
Olha, temo. Todo mundo teme. São acusações e estou rebatendo no curso do processo. Hoje, ser político no Brasil é difícil. Todos os olhos estão voltados para a política. O Mario, voltando para a política, o MP pode entender que vou cometer novos crimes e pedir a prisão preventiva, vai de o juiz entender. Enquanto existir no ordenamento jurídico a prisão preventiva, eu terei receio. Eu tenho receio. Por isso preciso esperar uma decisão judicial que me autorize a voltar ao cargo e participar da política. Volto bem mais tranquilo.

RAIO X
Nome: Mario Henrique de Abreu
Estado civil: Divorciado
Idade: 38 anos
Local de nascimento: São Bernardo e mora em São Bernardo
Formação: Direito
Hobby: Praticar esportes
Local predileto: Praia
Livro que recomenda: Cartas a um Jovem Político: Para Construir um Brasil Melhor, de Fernando Henrique Cardoso
Artista que marcou sua vida: Ayrton Senna
Profissão: Advogado
Onde trabalha: Escritório particular




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