Política Titulo Há 35 anos
Há 35 anos, prisão de Lula transformou ato sindical em político

Detenção do então presidente do Sindicato dos Metalúrgicos fez com que greve da categoria virasse luta contra a ditadura militar

Por Fabio Martins
Do Diário do Grande ABC
19/04/2015 | 07:00
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Banco de Dados/DGABC


Em abril de 1980, os metalúrgicos do Grande ABC iniciaram a maior mobilização de greve sindical da história, que durou 41 dias ininterruptos e se espalhou por todos os Estados do País. Com o decorrer do tempo, a ação perdeu força e poder de negociação com o empresariado. Em contrapartida, depois de 18 dias, a prisão do então presidente do Sindicato dos Metalúrgicos de São Bernardo e Diadema, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), transformou o ato reivindicatório por aumento salarial e melhores condições de trabalho em movimento político, na luta contra a ditadura militar.

Era madrugada com cerração na região, no dia 19 daquele ano. Os militares vigiavam aqueles a quem chamavam de ‘agitadores’ há pelo menos três anos. Integrantes da corporação compareciam a bares, acompanhavam eventos públicos e até alugaram pensão nas proximidades das sedes. No dia da operação, entre 5h e 7h, a Polícia do Exército invadiu a residência de 15 líderes sindicais do Grande ABC, enquadrando-os na Lei de Segurança Nacional. Diante da situação, os manifestantes condicionaram a volta ao trabalho, além dos requerimentos, à libertação de Lula e dos outros dirigentes detidos.

Lula ficou 31 dias em cárcere do Deops (Departamento Estadual de Ordem Política e Social), na Capital, assim como a maioria dos envolvidos. Entre eles, Djalma Bom, então tesoureiro do sindicato e, posteriormente, vice-prefeito de São Bernardo. “Fizeram grande aparato. Eu morava na Vila Vivaldi (São Bernardo), cortaram a linha de telefone para evitar contato. Chegando na prisão ficamos oito dias incomunicáveis, mas depois disso, mesmo da cela, nós elaborávamos boletins para serem lidos na assembleia dos metalúrgicos”, relatou Djalma, demitido da Volkswagen após a greve. “Me tornei persona non grata (na empresa).”

Em depoimento à Comissão Nacional da Verdade, Lula afirmou que os militares devem ter se arrependido de tê-lo prendido naquele momento de enfraquecimento da greve. “A minha prisão politizou o movimento. Eles cometeram a burrice de me prender. Foi motivação a mais para a greve continuar”, alegou. O ex-presidente citou que teve tratamento VIP no local. “Lembro que o Corinthians ia disputar título. O (Romeu) Tuma (diretor do órgão) levou TV para a gente ver o jogo. Havia certo respeito. Não éramos presos comuns.” A mãe do petista, Eurídice Ferreira de Mello, a dona Lindu, morreu de câncer, durante o período. Ele foi liberado, na oportunidade, para ir ao enterro.

Cerca de 38 pessoas ficavam em cada cela. Os dirigentes decidiram fazer greve de fome, da qual Lula se dizia contrário, porém aderiu à prática. Ex-deputado e dirigente sindical, Expedito Soares entrou no esquema. “Adotamos a medida buscando reabrir a negociação (trabalhista) com Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo). Ficamos quatro dias diretos tomando apenas água”, mencionou, ao acrescentar que as prisões deram “dimensão nacional” ao movimento. “Criou vulto enorme. Intelectuais, artistas foram às ruas. Ninguém aguentava mais aquela opressão.”
Irmão mais velho de Lula, José Ferreira de Melo, o Frei Chico, então militante do PCB (Partido Comunista Brasileiro), que atuou no sindicato de São Caetano, contou que os ‘companheiros’ foram “sequestrados”. “Ninguém sabia aonde ia parar. Era muita gente conhecida no mesmo espaço.

Quando vimos Dalmo Dallari e o José Carlos Dias (advogados) acreditávamos que eles iriam nos tirar de lá (do Deops), mas eles também tinham sido presos.”
Historiador e jornalista, Ademir Medici lembrou que não há dúvida que a partir dessa ocasião o movimento ganhou corpo. “O Chico Buarque faria show no Estádio da Vila Euclides (em São Bernardo) que visava arrecadação para o fundo de greve. Esse espetáculo foi cancelado, impedido. Tenho dois ingressos guardados comigo até hoje.” O ato de 1º de Maio, por sua vez, reuniu mais de 220 mil pessoas na Praça da Matriz.

Paralisações sucederam intervenções no sindicato

As paralisações praticadas pelos metalúrgicos da região sucederam série de intervenções da Polícia Militar nos sindicatos. À época, os dirigentes sindicais desafiaram o regime e foram retaliados, logo na sequência. Além da grande mobilização em 1980, a categoria também emplacou greve dos trabalhadores em 1979, que reuniu milhares de adeptos, bem como no ano anterior, num dos primeiros movimentos após o golpe militar, deflagrado em 1964.

Na ocasião, as indústrias automotivas, na visão dos dirigentes, aplicavam a política de arrocho salarial. Esta situação criou clima de animosidade, ‘acendendo o pavio’ dos trabalhadores’. O episódio rendeu a luta pela democracia.  




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