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A Copa e a voz do céu

Nossos Governos estão preocupadíssimos com estádios, hospedagem, aeroportos, mobilidade urbana

Por Carlos Brickmann
27/02/2011 | 00:00
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Nossos Governos estão preocupadíssimos com estádios, hospedagem, aeroportos, mobilidade urbana (aquilo que antigamente se chamava "transporte"), obras, boas licitações. Mas o que ameaça a Copa do Mundo e as Olimpíadas é coisa muito mais simples: a fragilidade da infraestrutura urbana brasileira.

Choveu outro dia em São Paulo. Moema, bairro de classe média alta, metro quadrado entre os mais caros da cidade, ficou 26 horas sem luz. Mais de um dia - fora outras falhas que duraram menos. Como choveu em algum lugar, a Internet caiu em boa parte da maior cidade brasileira. E, ao ribombar do primeiro trovão, os faróis de trânsito se desativam sozinhos, antes que a chuva chegue.

Se isso acontece na capital do Estado mais rico do País, imagine o País inteiro. De que adianta ter um estádio ultramoderno, ligado a um aeroporto de Primeiro Mundo por um metrô novíssimo, expresso, com ar condicionado digital e rede Wi-Fi de acesso universal, se tudo para por falta de energia? Os I-pads que registram a reserva de lugares até funcionam com bateria, mas estarão desligados do sistema. E quem preferir o carro ou o ônibus, que fará nas ruas com os sinais de trânsito desnorteados, piscantes, aturdidos com o rugir dos céus?

Consta que o aventureiro português Diogo Álvares Correia atemorizou os índios tupinambás com o ribombar de seu mosquetão. Eles o chamaram de Caramuru e lhe deram Paraguaçu, a filha do cacique, como esposa. Passados uns quinhentos anos, continuaremos, como os tupinambás, temendo o som do trovão?

FEZ-SE O CLARO

Desculpe a pergunta cretina do tópico anterior: quem paga o prejuízo sempre é aquela pessoa que o caro leitor vê no espelho de manhã cedo. Já foi aprovada pela Agência Nacional de Energia Elétrica uma nova fórmula de cálculo do imposto sobre energia, o que vai elevar as contas de luz em R$ 1 bilhão por ano.

A BOA NOTÍCIA

A construção do estádio do Corinthians, provável sede da abertura da Copa, começa em abril, logo após a aprovação do projeto. O estádio, para 70 mil pessoas (o projeto original era para 48 mil), será erguido pela Odebrecht.

PROMESSA É DÍVIDA

País rico é país sem pobreza, diz o genial slogan oficial. E o governo, com o salário-mínimo que impôs, está fazendo o possível para acabar com a pobreza.

RIR...

O governo decidiu reduzir de 484 para 171 o número de integrantes da Autoridade Pública Olímpica, que deve ser comandada por Henrique Meirelles. Alguém mais antenado lembrou que 171 é um número simbólico, do artigo do Código Penal que define o estelionato. O número foi mudado para 181 - o que mostra a seriedade com que se estimam as necessidades e se calculam os custos.

RIR...

A coisa passou meio despercebida na ocasião, mas merece ser lembrada. De 9 de março a 18 de abril do ano passado, realizou-se em São Paulo uma exposição de 39 quadros de Moamar Kadhafi - o próprio. Quem coordenou a exposição foi a ONG Kadhafi International Foundation for Charitable Associations (Fundação Internacional Kadafi para Associações de Caridade), fundada e dirigida pelo filho do líder líbio, Saif (este que anunciou que o pai não vai se render e prometeu um banho de sangue). O objetivo da ONG é patrocinar "desenvolvimento e ajuda humanitária nos campos social, econômico, cultural e dos direitos humanos".

RIR

O Brasil está preocupadíssimo com direitos humanos. A Comissão de Direitos Humanos da Câmara promoveu reunião com o diretor da Campanha Internacional pelos Direitos Humanos do Irã, Hadi Ghaemi, e a jornalista e feminista iraniana Parvin Ardalan. Não apareceu ninguém da oposição, nem do governo, nem da turma do muro. Para evitar o vexame, chamaram funcionários do Congresso para ocupar as cadeiras vazias e um técnico da Comissão comandou o encontro.

A LUZ NO FIM DO TÚNEL...

Não, ninguém parece preocupado com esse tipo de problema. Tudo bem, a época das competições é mais seca, mas pode acontecer: e se chover na Copa ou nos Jogos Olímpicos? Há algum esforço para aumentar a geração de energia (por exemplo, Belo Monte). Mas, como no caso da moça daquele anúncio de xampu, a transmissão continua a mesma, os transformadores e subestações não estão ficando mais novos com o passar do tempo, os sinais de trânsito continuam contemporâneos do Fusca e do Aero-Willys. E o que se discute, como se fizesse diferença, é se a energia é do PMDB de Sarney ou do PMDB de Eduardo Cunha.

É O TREM NA CONTRAMÃO

Algumas propostas beiram o inacreditável - como sugerir às grandes empresas para que troquem seus caríssimos geradores atuais por caríssimos geradores a álcool, e se desliguem da rede pública de energia nos horários de pico. Quem paga o prejuízo das empresas com a troca de geradores? Alô, Caramuru!




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