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Títulos dificultam divulgação de livros de autor da região

Rede social chegou a banir publicação; ‘Viado’ e ‘Bicha’ reúnem contos sobre a experiência de ser um homem gay

Por Flavia Kurotori
Do Diário do Grande ABC
10/01/2021 | 07:00
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Divulgação


 Artista de Santo André, Marcos Lemes, 54 anos, quis passar uma mensagem direta ao escolher o nome de seus livros mais recentes, Viado e Bicha, lançados em agosto e dezembro, respectivamente. O que ele não imaginava era que a escolha dos títulos seria motivo de suspensão por 24 horas no Facebook.

“A hora que a pessoa lê não tem como não entender sobre o que está falando. No entanto, essas palavras têm diversas conotações e acabam sofrendo certas retaliações. Quando fui fazer o material promocional, os bottons, foi uma dificuldade encontrar uma empresa que fizesse”, relata. Lemes destaca que estas não são as primeiras produções artísticas que utilizam os termos ‘viado’ e ‘bicha’ no título, portanto, ele não imaginava que teria problemas. “Foi uma decisão no sentido temático porque todos os contos, nos dois livros, falam sobre questões do homem gay na nossa sociedade”, adiciona.

Desde o lançamento, o artista diz que enfrenta problemas na divulgação. Segundo ele, veículos de imprensa negaram falar sobre o livro justamente em razão do título, além de Lemes não ser convidado para lives literárias pelo mesmo motivo. “Algumas livrarias também não aceitam (vender as obras). É uma produção independente, então eu mesmo levo para os lugares. São diversos preconceitos velados e outros escancarados. As pessoas tiram conclusões sem saber o que os livros dizem”, afirma.

Na terça-feira, ele fez uma publicação na sua página do Facebook divulgando Viado e Bicha. No entanto, a postagem foi apagada e ele foi suspenso da rede social por 24 horas sob a justificativa de que Lemes estaria promovendo o discurso de ódio. “Temos que desconstruir esteriótipos sobre as palavras. Elas têm peso de xingamento, porém, dentro da própria comunidade (LGBTQIA+) não é usada como xingamento e os contos vêm justamente para mostrar a possibilidade de desconstrução”, assinala.

Amigos chegaram a sugerir que ele não utilizasse a palavra literal e substituísse algumas letras por sinais gráficos, como asteriscos e arrobas, ou emojis para evitar que as postagens sejam excluídas novamente. Entretanto, Lemes se nega a adotar o artifício. “Não vou colocar desenho, emoji, nada disso. Senão, vou estar me calando e sucumbindo à pressão da normatização de uma coisa que não deve ser normatizada.”

Lemes avalia que a resistência aos títulos dos livros reflete o preconceito enraizado na sociedade, que é passado como herança de pai para filho. “Não vencemos o preconceito não falando sobre ele. Quando uma pessoa preconceituosa não quer falar sobre seu preconceito, é ela quem perde a oportunidade de aprender. (Neste caso) É preconceito na etimologia da palavra porque a pessoa não leu o livro, não sabe o que é tratado”, diz.

Ele relata que a ideia para os livros Viado e Bicha surgiu a partir da pesquisa que está realizando para suas peças de teatro. “O material me inspirou a falar sobre situações em que os personagens estão colocados por conta de sua orientação sexual, como se isso definisse seu caráter.” O artista, que também é ator e diretor de teatro, já havia publicado a trilogia Pedro, Outros Pedros e Tantos Pedros, sobre relacionamentos fracassados.

Questionado, o Facebook não se posicionou até o fechamento desta edição.




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