Adjetivo usado para quem gosta de bagunça nos dias atuais, se fosse vivo, o escritor modernista Mário de Andrade poderia ser classificado como um fanfarrão. Habitué dos grandes salões de Carnaval, não só em São Paulo como também no Rio de Janeiro e Recife, um dos ícones literários brasileiros – que partiu há exatos 75 anos – não perdia a uma festa onde esvoaçavam confete e serpentina.
Essa sua faceta entre tantas outras é mostrada no livro Em Busca da Alma Brasileira – Biografia de Mário de Andrade (Sextante, R$ 49,99), de autoria do jornalista Jason Tércio. Na obra, o biografado é retratado como ousado e tímido, recatado e escandaloso, confessional e comedido, modesto e vaidoso, apolíneo e dionisíaco, singular e plural.
A ideia de pesquisar a fundo sua história surgiu para o escritor por causa da admiração. “E para melhor se entender a sua obra e o seu projeto cultural. Ele não foi apenas autor de romances, contos e poesias (veja Quando eu Morrer, à dir.), mas também um militante cultural. Então a biografia focou o seu papel histórico, seu processo criativo e também a sua vida íntima, os conflitos psicológicos, as aventuras amorosas etc. E para isso eu tive de fazer uma revisão da história do Modernismo.”
Para tanto, Tércio mergulhou na obra e vida do autor de Pauliceia Desvairada por uma década. E revela que antes da pesquisa tinha a imagem oficial de Mário, ‘um intelectual metódico, austero, que só vivia no gabinete e na missa, católico praticante, com muitas doenças, homossexual e um dos integrantes do Modernismo.’ “Ele era metódico sim, disciplinado e católico, um intelectual com profundo amor ao Brasil, mas ao mesmo tempo era festeiro, bem-humorado, boêmio, gostava de Carnaval, e era bissexual, porque encontrei várias evidências de relacionamento dele com mulher.”
Na publicação, o autor fez não só essas, mas várias correções históricas na vida do escritor. “Os equívocos corrigidos são de que Mário ignorou o samba carioca, que ficou nacionalista só a partir de 1924, que Oswald de Andrade foi o pioneiro da vanguarda modernista no Brasil, que a Semana e o Modernismo foram um projeto das elites do café – mostro que foi um movimento de classe média –, que o grupo alugou o Theatro Municipal para a Semana, mas não foi alugado”, exemplifica. Para Tércio, a pesquisa sobre Mário, como escreveu na introdução da biografia, nunca terminará. “Ele era um oceano, onde quanto mais se mergulha, mais coisas se descobrem”, finaliza.