Política Titulo São Bernardo
Museu do Trabalho coleciona atrasos e problemas

Projeto foi contestado por homenagem a Lula, acréscimo de valores, abandono e por não ter sido entregue em 2013

Por Júnior Carvalho
Do Diário do Grande ABC
14/12/2016 | 07:00
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Epicentro da Operação Hefesta, deflagrada ontem em São Bernardo pela PF (Polícia Federal) e pela CGU (Controladoria-Geral da União), o Museu do Trabalho e do Trabalhador coleciona atrasos na entrega da obra, aditamentos nos valores e polêmicas envolvendo o equipamento, como a existência de suposto laranja como sócio da empreiteira responsável pelo projeto, a Construções e Incorporações CEI (leia mais abaixo).

A construção de um museu do trabalhador foi idealizada ainda nos meses iniciais do primeiro governo do prefeito Luiz Marinho (PT), mas só saiu do papel em 2012, quando o petista finalmente assinou ordem de serviço em ato público com a então ministra da Cultura, Ana de Hollanda.

Desde que surgiu, o projeto gerou divergências. Pupilo e ex-ministro do Trabalho e da Previdência do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), Marinho justificava que o equipamento seria erguido para resgatar a história das greves metalúrgicas na cidade na década de 1980 e que colocaram o Grande ABC na história do período de redemocratização do Brasil – época também em que Lula emergiu no movimento sindical e iniciou sua militância partidária, criando o Partido dos Trabalhadores.

Marinho também elencou o museu como “intenção turística” e de valorização do Centro, já que a área de 10 mil metros quadrados abrigava antigo mercado municipal central, em frente ao Paço. O prédio foi desativado em 2004 e, antes de ser projetado para receber museu, foi abandonado e virou cenário de acúmulo de lixo e usuários de drogas.

Mas nada disso se concretizou. Além do atraso de três anos na entrega do equipamento, a obra, que inicialmente custaria R$ 18 milhões aos cofres públicos, saltou para R$ 21,68 milhões (sendo recursos da União e do município). Marinho sempre culpou o Ministério da Cultura pela demora, acusando a Pasta – mesmo durante a gestão de Dilma Rousseff (PT) – pela “incompetência” na não liberação de verbas.

Em novembro de 2014, com o esqueleto do museu erguido, as obras foram paralisadas. O que era para ser vitrine da gestão virou elefante branco. O prédio, pixado e envolto a lixo, novamente dava lugar a entulho e à proliferação de doenças. No início do ano, o Diário noticiou que, com as chuvas fortes que atingiam a cidade, o prédio acumulava poças d’água, possíveis focos do mosquito Aedes aegypti, transmissor da dengue, do zika vírus e da febre chikungunya.

As intervenções voltaram em julho, durante o período eleitoral. Opositores ao governo do petista, então, iniciaram mobilização para trocar o objeto do local. Prefeito eleito, Orlando Morando (PSDB) defende a implementação de Fábrica de Cultura, do governo do Estado, no espaço.

No dia 24, o ministro da Cultura, Roberto Freire (PPS), antecipou com exclusividade ao Diário que o setor poderia rever a finalidade da obra. Marinho até que tentou reverter esse movimento, enviando à Câmara projeto que formalizava a existência do futuro museu, mas a proposta foi amplamente rejeitada.

Denúncia do Diário motivou inquérito

Reportagem publicada pelo Diário no dia 29 de setembro de 2013 motivou o inquérito aberto pelo MPF (Ministério Público Federal), que ontem denunciou envolvidos na construção do Museu do Trabalho e do Trabalhador de São Bernardo.

À ocasião, o jornal revelou que a Construções e Incorporações CEI, vencedora da licitação aberta pela Prefeitura, tinha um eletricista desempregado em seu quadro societário. Erisson Saroa Silva, segundo a Junta Comercial, possuía R$ 10,4 milhões em cotas da empresa. Em contato com a equipe do Diário, disse que não sabia que era dono de uma empreiteira. O nome de Erisson saiu da sociedade da CEI poucos dias depois da denúncia.

O autor da representação contra o contrato do Museu do Trabalho e do Trabalhador foi o munícipe Marcelo de Sá e Sarti, que utilizou justamente a reportagem do Diário para reforçar o pedido de investigação sobre o episódio.

“Houve muita luta. Houve denúncia ao conselho do MPF (reclamando da morosidade no caso contra a procuradora Fabiana Rodrigues de Souza Bortz). Tudo isso para dar melhor atenção à farra com o dinheiro público que é esse museu. O local (o antigo mercado municipal, no Centro), merece outra utilização, um outro equipamento que faça muito mais pela Cultura de São Bernardo”, disse.

Cloves garante lisura da obra: ‘Não há desvios’

Conduzido a prestar depoimento coercitivamente na sede da PF (Polícia Federal) em São Paulo, o vereador José Cloves (PT), de São Bernardo, assegurou que não há irregularidade na construção do Museu do Trabalho e do Trabalhador.

Cloves foi levado à PF por ter sido secretário de Obras no primeiro governo do prefeito Luiz Marinho (PT). O vereador petista disse que havia deixado a Pasta dois meses antes da assinatura do contrato para concorrer a uma vaga na Câmara e que, por isso, não tem relação com o projeto.

“Vejo um ponto midiático nesta obra. Você pode questionar série de coisas nela, como atraso (na entrega), finalidade e projeto arquitetônico. Mas não de corrupção. Isso não acontece. Não há irregularidades”, disse o parlamentar. Cloves foi eleito em 2012, com 5.602 votos. Neste ano, perdeu a reeleição.

O petista foi conduzido à sede da PF às 6h. Prestou depoimento durante 30 minutos. Voltou para São Bernardo já na hora do almoço. Ele é aliado da deputada estadual Ana do Carmo (PT) e se tornou um dos mais fiéis vereadores da base de Marinho. Neste mandato, chegou a exercer o posto de líder do PT na Câmara.

Outro nome que teve de prestar depoimento coercitivo foi Carlos Alves Pinheiro, que foi diretor da Construções e Incorporações CEI, empreiteira responsável pela obra do Museu do Trabalho e do Trabalhador. 




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