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Desgraça agrada no cinema
27/12/2004 | 13:16
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Antes do início da história, a tela é inundada por uma advertência: se você se interessa por narrativas com final feliz, é melhor deixar a sala de cinema. O aviso, no entanto, não é levado a sério, a ponto de o filme ‘Desventuras em Série’ ter se tornado a principal bilheteria norte-americana do fim de semana retrasado, arrecadando US$ 30,2 milhões logo na estréia, desbancando Brad Pitt e sua turma em ‘Doze Homens e um Outro Segredo’. Com Jim Carrey encabeçando o elenco, o longa, que estréia no dia 14 no Brasil, já é o sucesso da temporada.

A advertência, na verdade, é até esperada pelos espectadores, que conhecem de cor e salteado a história do infortúnio dos irmãos Baudelaire, os principais personagens da coleção Desventuras em Série, escrita por um tal Lemony Snicket e que, lançada em livro, já atingiu 11 volumes nos Estados Unidos e dez no Brasil, editada pela Cia. das Letras. Verdadeiro fenômeno editorial, ‘Desventuras em Série’ já vendeu, desde 1999, mais de 6 milhões de exemplares nos 37 países onde foi publicado. A editora, aliás, planeja por aqui uma grande promoção com a estréia do filme.

O próprio autor observa que, na classificação das pessoas mais infelizes do mundo – e você sabe que elas não são poucas –, os irmãos Baudelaire ocupam sem dúvida o primeiro lugar. Logo de cara, eles perdem os pais em um incêndio. E, o que parecia um consolo, a herança de uma fortuna, transforma-se em um pesado fardo.

Violet, Klaus e Sunny Baudelaire só poderão dispor do dinheiro quando o primeiro atingir a maioridade. Mas Violet tem 14 anos, Klaus apenas 12 e Sunny não passa de um bebê. Assim, os irmãos são obrigados a viver sob a guarda de tutores, que pouco se preocupam em trazer algum conforto. Isso os obriga a passar invernos à base de sopas frias, trabalhar em serrarias e ainda morar em um casa infestada de caranguejos. Não bastassem esses problemas, os Baudelaires são ainda perseguidos pelo maléfico conde Olaf, cujo único interesse é usurpar o dinheiro reservado para as crianças. Na tela, ele é vivido por um Carrey quase totalmente irreconhecível, não fosse a reveladora covinha em sua bochecha esquerda.

O filme é inspirado nos três primeiros volumes da série, Mau Começo, A Sala dos Répteis e O Lago das Sanguessugas. Dirigido por Brad Siberling (Gasparzinho e Cidade dos Anjos), traz ainda Meryl Streep como a tia Josefina e Jude Law na voz do autor Lemony Snicket. E, a julgar pelo sucesso, renderá tanto mais continuações como a própria coleção de livros, prometida para encerrar com 13 volumes – mas nada impede uma prorrogação se o apetite dos leitores não for saciado.

A série de desventuras começou a ser lançada em 1999, no mesmo momento em que o fenômeno Harry Potter atraía praticamente todo par de olhos com menos de 14 anos. Lemony Snicket, porém, preferiu o caminho inverso: sem magia à disposição, os irmãos Baudelaire são uns desafortunados, em todos os sentidos da palavra. Snicket, aliás, também não passa de uma figura criada pelo escritor Daniel Handler que, avesso a badalações (evita, por exemplo, ser fotografado desde que atingiu o sucesso), aparece em palestras e tardes de autógrafos como representante de Lemony Snicket e sempre com uma desculpa estapafúrdia para explicar a ausência do autor.

"É difícil imaginar que tipo de história pode surgir sem que coisas terríveis aconteçam", disse Handler, em entrevista à imprensa norte-americana no lançamento do filme. "Há uma longa tradição de maldades cercando os órfãos". Assim, torna-se natural uma trajetória tão acidentada como a dos irmãos Baudelaire pois, para o escritor, os textos hoje não devem mais apresentar o confronto escuridão x luz, mas interessante x tedioso.

Ele cita como exemplo o próprio filho, Otto, de 1 ano, atualmente louco por um livro com imagens de gorilas. "Espero que, no futuro, ao ler meus livros, ele não pare na página 11 e venha me dizer: ‘É muito chato. Tenho mesmo de ler isso?."




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