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Pedofilia: hormônio é último recurso, diz psiquiatra
Isis Mastromano Correia
Do Diário do Grande ABC
21/10/2007 | 07:23
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O início da semana foi marcado pela polêmica da chamada ‘castração hormonal’, aplicada pelo psiquiatra do Ambulatório de Transtornos de Sexualidade da Faculdade de Medicina do ABC, em Santo André, Danilo Baltieri.

A terapia é experimentada em um pedófilo atendido na unidade e baseia-se na administração de hormônios femininos que inibem a libido do paciente e prejudicam temporariamente as ereções. Os resultados do procedimento são reversíveis.

Entretanto, a terapia hormonal não é novidade entre os especialistas. Os estudos datam da década de 1940, com a administração de estrógeno e bloqueadores de testosterona nos pacientes.

Antes disso, médicos lançaram mão da neurocirurgia e até mesmo da castração cirúrgica propriamente dita. Hoje, o padrão considerado moderno é a prescrição de antidepressivos inibidores de serotonina. A Unifesp (Universidade Federal de São Paulo) mantém o Ambulatório de Tratamento do Sexo Patológico do Proad (Programa de Orientação e Atendimento a Dependentes). À frente dos trabalhos está o psiquiatra Aderbal Vieira Junior, que se posiciona a favor da ‘castração química’ como última instância de tratamento, ainda assim, desde que consentida. Confira abaixo suas opiniões sobre pedofilia e seu ponto de vista sobre a polêmica terapia com hormônios.

DIÁRIO - O senhor acha que a pedofilia deve ser encarada como um crime ?
ADERBAL - A pedofilia é um crime, não tem dúvida. Mas é preciso fazer uma distinção. Você forçar uma relação sexual, algum contato ou constrangimento físico ou emocional à criança claramente é criminoso e deve ser punido, acho que disso ninguém discorda. Mas uma pessoa que tem uma criança como objeto sexual, mas não desempenha nenhum abuso nesse sentido, não tem por que ser considerado um criminoso. Ter essa tendência, por si só, não é crime.

DIÁRIO - É possível o pedófilo administrar seu desejo de outras maneiras que não com a criança?
ADERBAL - Para aqueles indivíduos que têm uma intenção sexual com a criança e se frustram de fazê-la, de desempenhá-la, o prazer é menor com manobras substitutivas do que com a atividade sexual propriamente dita. Mas elas (manobras) são uma saída, uma possibilidade.

DIÁRIO - O pedófilo se sente incomodado por conta de sua tendência sexual?
ADERBAL - A grande maioria dos pedófilos não se sente bem. Eles percebem que estão causando algum prejuízo às crianças, a si mesmos e à sociedade; que estão fazendo alguma coisa que é extremamente questionável. Tem uma minoria de pedófilos que são sociopatas, não estão nem aí e dizem: ‘vou fazer e pronto’. Mas isso é minoria.

DIÁRIO - A terapia hormonal não é, atualmente, a primeira escolha para o tratamento de pedófilos. Por quê?
ADERBAL - Porque há uma quantidade muito grande de efeitos colaterais. Atualmente você tem a psicoterapia, que não tem efeito colateral. Essa abordagem, em princípio, não causa nenhum prejuízo muito claro. Como segunda linha você tem os anti-depressivos, que têm efeitos colaterais muito menores. Eles funcionam muito mais no sentido de suprimir o impulso sexual desfavorável, vamos dizer assim, mantendo ainda a possibilidade de a pessoa ter alguma atividade sexual, mais convencional, mais aceitável.

DIÁRIO - É possível fazer com que o pedófilo direcione seu desejo para esses atos ditos convencionais?
ADERBAL - Na verdade o impulso sexual pedofílico, não é assim tudo ou nada. Há desde aquelas pessoas que só têm qualquer interesse, qualquer excitação, qualquer prazer sexual, tendo a criança como objeto, e esse prazer tem de ser o abuso, a manipulação carnal, até pessoas que têm algum grau de atividade pedofílica mas também manifestam algum interesse por adultos. Para esse pedófilo ‘puro’ (primeiro caso), eu acho muito difícil conseguir redirecionar o desejo com terapia, com medicamentos.

DIÁRIO - Algum de seus pacientes já te pediu para administrar hormônios?
ADERBAL - Eu nunca dei hormônio para ninguém.

DIÁRIO - Mas você o faria?
ADERBAL - Não faria única e simplesmente por uma questão de predileção pessoal. Não que eu ache a atividade em si mesma, desde que feita com ética, condenável. De alguma forma, pode ser papel do médico fazer (castração química), mas não é um papel que me agrade. Eu sou favorável a tentar melhorar essa sexualidade da forma que seja mais adequada para a pessoa e para os outros com quem ela se relaciona. Em alguns casos isso não vai ser possível, o cara vai continuar representando um risco para si mesmo e para a sociedade. E não é preciso ereção para cometer atos abusivos contra alguém.

DIÁRIO - O senhor é a favor de alguma pena contra os pedófilos, os que chegam ao abuso propriamente dito?
ADERBAL - Enquanto médico, não sou a favor e nem contra punição, porque médico não pune nada, médico trata. Enquanto cidadão, claro que eu não quero ver criança nenhuma sendo abusada. Alguém que abusa deve sofrer uma penalidade por isso.



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