Cultura & Lazer Titulo Consciência Negra
Negras vozes

Dia da Consciência Negra é a oportunidade para que temas da cultura afrodescendente tomem corpo

Por Ângela Corrêa
Do Diário do Grande ABC
19/11/2008 | 07:00
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Apesar de instituído na região a partir de 2006, o Dia da Consciência Negra, que várias cidades celebram nesta quinta-feira, é a oportunidade para que os temas acerca da identidade cultural afrodescendente tomem ainda mais corpo. É o que acreditam lideranças e produtores culturais do Grande ABC atentos ao movimento de conscientização da população de afrodescendentes. Eles são cerca de 7 milhões na Região Metropolitana, segundo a soma dos que se declararam de cor "preta" e "parda" na última Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios, feita pelo IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística) em 2007.

Na região, apenas São Bernardo não considera a data feriado, mas dedica parte da agenda cultural ao tema. São Caetano e Rio Grande da Serra transferiram as comemorações para o domingo e, Ribeirão Pires, para a sexta-feira. Além de lazer, estão programados debates e reflexões.

"As atividades culturais de diversos setores têm refletido cada vez mais a importância dessa data, por meio de debates, reflexões e abrangendo outros tipos de arte que não as de sempre", avalia o coordenador de eventos musicais da secretaria de Cultura de Santo André, Vanderlei Lopes de Faria, o Lela.

De acordo com Lela, o fato de as comemorações de 2008 não apresentarem famosos como carro-chefe em grande parte das cidades - em Santo André, por exemplo, o rapper Thaíde fez show no Parque Central em 2007; no ano anterior, foi a cantora Elza Soares, no mesmo local não é reflexo do ano eleitoral. "Não acho que isso tenha relação. Não adianta só desenvolver grandes nomes. A abrangência está muito maior nos debates", diz.

E é esse viés - de ações perenes - que os produtores planejam privilegiar com o passar dos anos. "Até agora as ações são muito pontuais. Não existe ainda um debate sobre o feriado. Há quem não saiba quem foi Zumbi, ou que a escolha da data é relacionada a ele. Hoje, os movimentos estão se articulando, mas ainda não dão conta de esclarecer isso", diz Adelza Freitas, uma das diretoras da Associação Cabo-verdiana do Brasil, que está localizada desde a sua fundação, há 30 anos, em Santo André.

A organização, por meio de seu grupo cultural, abriu o Mês da Consciência Negra na cidade com uma programação dedicada à música, artes plásticas, artesanato, literatura, vestuário, dança e gastronomia do arquipélago africano, lusófono e independente de Portugal há apenas 33 anos.

Mais que um feriado - A decisão de São Caetano, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra em transferir as comemorações para o fim de semana ainda é polêmica, apesar de não-inédita - São Caetano já havia optado por colocar o feriado em dia de descanso. A intenção dos três municípios é minimizar o impacto de outro dia livre na economia.

"É uma data importantíssima, mas ainda é pouco reconhecida, principalmente pelos órgãos oficiais. Historicamente, isso reflete ainda o racismo", avalia Lela.

Para o coordenador artístico da Comunidade Negra do Campanário, em Diadema, Jurandir de Sousa, esta é a oportunidade para que o povo brasileiro reconheça a contribuição, não só da figura de Zumbi dos Palmares, como dos primeiros africanos escravizados durante o período do Brasil-colônia, na construção da identidade. "Não é questão de ser mais um feriado. A gente já comemora a data há muito tempo. É vital a valorização de todos os povos que formam o País. A música, a comida, a dança... Tudo tem a contribuição do povo negro", diz.

Adelza Freitas enxerga o momento como propício para a provocação de uma reflexão. "A população negra tem de ser mais participativa politicamente, desvinculada, é claro, de política partidária".

O maestro João de Campos, 68 anos, um dos fundadores, em 1972, do Movimento Negro de Santo André, reivindica, além de mais espaço às manifestações artísticas, um olhar mais cuidadoso, não por acaso, às primeiras manifestações anti-racismo. "Fazíamos o movimento escondidos, por conta da ditadura", lembra.




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