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Celso Frateschi faz as pazes com a TV
Por Renata Petrocelli
TV Press
22/01/2004 | 00:11
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Teatro e política sempre andaram de mãos dadas para Celso Frateschi. Cria do Teatro de Arena de São Paulo, que resistiu à ditadura militar pós-1964, o ator sempre foi um estudioso de Bertolt Brecht – o mais célebre representante do teatro político –, respondeu como secretário de Cultura de Santo André, é fundador da ONG Ágora, que desenvolve trabalhos culturais em escolas, e atualmente responde pela Secretaria de Cultura do Município de São Paulo. Por isso, o anarquista Ernesto, de Um Só Coração, não poderia ter caído em mãos mais ávidas.

Não por acaso, a utopia do personagem é o que mais atrai Frateschi: "É um personagem muito positivo. Luta por uma sociedade igualitária, livre, onde as pessoas convivam em harmonia". E ele anda tão satisfeito com o trabalho que – coisa rara – confessa estar gostando do resultado na telinha. "Não costumo nem ver", afirma.

Na construção de Ernesto, o ator misturou a experiência de ter escrito dois espetáculos sobre o universo do anarco-sindicalismo na década de 70 a inspirações dos pintores modernistas. "O visual dele me surgiu nos quadros da Tarsila", diz, citando a pintora Tarsila do Amaral, vivida por Eliane Giardini na minissérie. A idéia dos óculos que Ernesto ostenta partiu do próprio Frateschi: "Ele sempre leu muito e, como tem a mesma idade que eu, sei que a vista não resiste imune". Da mesma forma, o ator decidiu incorporar aos óculos um "amarradinho" de couro que os sustenta. Tudo para mostrar que ele já apanhou muito na vida. A seguir, trechos da entrevista com Frateschi:

Pergunta – A vivência política do Ernesto foi o que mais o atraiu no papel?
Celso Frateschi – Não só a vivência política, mas também a relação dele com a família e a influência de uma coisa na outra. É interessante ver como, de uma forma alheia à vontade dele, a relação familiar e a participação política acabam virando uma contradição. E este é o conflito básico do homem moderno: de um lado a sociedade, de outro sua postura de indivíduo. Sem dúvida, é um personagem que me atraiu muito. Mas não costumo escolher meus trabalhos por esta visão política, e sim por um contexto geral.

Pergunta – Mas você sempre teve uma postura bastante politizada...
Frateschi – Sim, e acho que posso levar isso para qualquer personagem, e não apenas necessariamente para os personagens que também tenham esta atuação acentuada. A visão política sempre me ajuda a compor meus papéis, porque não vejo apenas seu lado psicológico. É através dela que consigo dar um viés maior a meus trabalhos, abordá-los também por um lado social.

Pergunta – Depois de sua estréia na TV, em Uma Esperança no Ar, do SBT, você passou muitos anos longe das novelas. Por quê?
Frateschi – Sempre tive uma resistência muito grande à TV, uma certa bronca política. Quando fui trabalhar no SBT, eu achava que tinha de conhecer um pouco mais a TV, que poderia ser um preconceito bobo. Mas a experiência não foi positiva. A novela não era boa, a dramaturgia era fraca e o personagem era raso, talvez até porque eu estivesse insatisfeito... Aí fiquei meio vacinado.

Pergunta – O que mudou esta sua visão?
Frateschi – Comecei a fazer umas participações na Globo e vi que na TV também há espaço para desenvolver um trabalho de ator. A emissora tem uma dramaturgia interessante, sobretudo nas minisséries. Hoje considero a TV um belíssimo veículo, que tem muito a contribuir com a sociedade. As propostas que me chegam são estudadas e, quando aceitas, não me sinto um burocrata no trabalho. Construo os personagens, dialogo com os diretores e troco com os atores. Hoje, acho que um ator pode se realizar em qualquer veículo.

Pergunta – O fato de ser ator facilita seu trabalho à frente da Secretaria de Cultura de São Paulo?
Frateschi – Eu não diria que facilita. O que acontece é que eu sei o que é a "barra" da produção artística, vivo isso diariamente. Talvez ficasse até mais "fácil" se não soubesse, porque encararia tudo como números, meras estatísticas. Mas é claro que esta experiência me ajuda a tomar decisões mais ponderadas. Não vejo as coisas de maneira burocrática.




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