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Região do Grande ABC não tem política contra trabalho infantil

Especialistas criticam isolamento das ações dos municípios; região tem 116 pontos de crianças em situação de rua

Por Vanessa Fajardo
Do Diário do Grande ABC
12/06/2009 | 07:00
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Hoje um ano depois de a Fundação Travessia identificar 116 pontos com crianças em situação de rua na região através do Projeto ABC Integrado, as políticas públicas regionais para atendê-las e combater o trabalho infantil ainda são inexistentes. O que se vê hoje - Dia Nacional e Mundial Contra o Trabalho Infantil - são ações isoladas dos municípios, enquanto o problema social transcende as barreiras territoriais.

Ao todo, 1.173 crianças da região (São Caetano e Ribeirão Pires não estão no número) são contempladas pelo Peti (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil), do governo federal. O programa inclui transferência de renda à família e obrigatoriedade da criança participar de atividades no contraturno escolar.

Hoje há no País quase cinco milhões de crianças e adolescentes com idades entre 5 a 17 anos trabalhando. Em São Paulo são 642.087, segundo a Pnad (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílio) 2007.

Criado com objetivo de traçar o perfil da criança de rua da região, o ABC Integrado promete ser o pontapé para mudar o cenário de investimentos individuais em cada cidade. O levantamento, uma iniciativa da Fundação Travessia e Universidade Metodista de São Paulo, vai trazer dados inéditos como número de crianças em situação de rua da região e quantas trabalham.

Para o integrante do Conanda (Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente), Ariel de Castro Alves, a integração regional é essencial para a luta do combate ao trabalho infantil. "Ainda não existe uma política regional de enfrentamento e erradicação do trabalho infantil", explica. "O menino que está hoje em Diadema pode estar amanhã em São Bernardo. O de Santo André pode ir para Mauá e vice-versa."

Para diretor de projeto da Fundação Travessia, Marcelo Caran, não faltam leis para combater o trabalho infantil, mas nem sempre há políticas públicas adequadas. "É hora dos municípios olharem de forma conjunta para o problema para que cada um não trate a questão de forma diferenciada enquanto as crianças circulam entre as cidades."

Especialistas ligados à Infância e Juventude reforçam que toda a sociedade tem se mobilizar. "Quando você compra balas de uma criança contribui para o trabalho infantil e por trás dela pode haver uma rede de aliciamento. A melhor maneira de ajudar é acionar o conselho tutelar", explica Denise Cesário, gerente executiva da Fundação Abrinq.

APRENDIZES - Um adolescente só tem amparo legal para trabalhar se for contratado sob condição de aprendiz. Uma das mais antigas entidades da região é a Associação Patrulheiros Mirins de São Caetano do Sul que completa 50 anos neste mês. Para participar das atividades é preciso saber de cor todos os hinos e deveres do patrulheiro. "Também tem de ter boas notas e comportamento", explica o coordenador Guilherme Rainho Teixeira.

Emprego das crianças nas ruas é o mais freqüente

Pesquisa da Fundação Telefônica realizada em 21 projetos apoiados pela instituição em 17 cidades do Estado, incluindo Diadema, confirmou o trabalho nas ruas como a mais recorrente forma de trabalho infantil. Foram ouvidas mais de 5.600 crianças e adolescentes de 6 a 18 anos.

Mais da metade dos entrevistados (67%) informou desenvolver algum tipo de trabalho e, entre estes, mais de 70% declararam trabalhar nas ruas, sendo a maioria na coleta de material reciclável. A segunda atividade mais citada pelas crianças foi o trabalho doméstico na própria casa.

Entidade parceira da Telefônica em Diadema, a Acer (Associação de Apoio a Criança em Risco) atende 115 crianças e seus familiares vulneráveis ao trabalho infantil, na região do Eldorado. A associação começou a atuar neste foco em 2003. "Antigamente a incidência do trabalho infantil nesta área era muito grande por causa do lixão do bairro Alvarenga (em São Bernardo). Havia muitas crianças envolvidas na reciclagem do lixo, era comum vê-las puxando carroças", lembra Jonathan Hannay, secretário-geral da ONG.

Além de receber as crianças para atividades no contraturno escolar, a Acer faz um acompanhamento individual das famílias que muitas vezes veem nas atividades ilegais dos filhos arrimo financeiro. "Ajudamos a família se estruturar melhor. Dessa forma abrimos espaço para a criança ter a sua infância de volta."

A associação realiza também atividades de conscientização nas escolas e junto à microempresários da região que podem se tornar empregadores, entre eles supermercadistas, donos de ferro-velhos, fábricas de sacolas e pequenas peças e lava-rápidos.

Prefeituras do Grande ABC promovem ações recreativas

Em Diadema, as principais ações destinadas às crianças em situação de trabalho são do Projeto Meninos e Meninas de Rua, ONG parceira da Prefeitura, que por meio dos educadores faz abordagens nas ruas. A Prefeitura promove atividades socioeducativas para crianças beneficiadas pelo Peti (Programa de Erradicação do Trabalho Infantil).

Em Santo André, o carro-chefe é o projeto Andrezinho Cidadão, que oferece atividades recreativas. O secretário de Inclusão Social, Ademar Carlos de Oliveira, afirma que o município definiu o plano para enfrentamento do trabalho infantil, que será desenvolvido paralelamente ao trabalho com adolescentes em situação de rua.

A Fundação Criança, vinculada à Prefeitura de São Bernardo, possui o Espaço Andança (casa de acolhimento inicial), que recebe crianças e adolescentes abordados nas ruas. A fundação também promove ações socieducativas no horário complementar ao escolar às crianças contempladas pelo Peti.

Ribeirão Pires informou que a Secretaria Municipal de Promoção Social mantém permanente fiscalização nos corredores de trânsito da cidade e possui uma série de atividades dirigidas aos adolescentes na área de esportes e cultura.

A Prefeitura de São Caetano informou que fazia parte do Peti até o início de 2008, quando deixou de existir demanda. Os casos esporádicos que surgem de crianças e adolescentes são levados aos Centro de Referência de Assistência Social. Rio Grande da Serra respondeu que não conhece pontos onde haja crianças em situação de rua ou trabalho infantil na cidade e Mauá não respondeu ao pedido de informações do Diário.




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