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Dia da Infância sem celebração

Data estimula reflexão sobre as condições sociais,
inadequadas a que são submetidas crianças pobres

Vanessa de Oliveira
Do Diário do Grande ABC
24/08/2016 | 07:00
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André Henriques/DGABC


Com o propósito de criar uma reflexão sobre a situação das crianças, tanto no âmbito econômico-social quanto no educacional, instituiu-se o 24 de agosto como o Dia da Infância. O cenário em que se encontram milhares de brasileirinhos mostra que há muito o que refletir e mais ainda o que fazer para garantir às crianças todo o tipo de atenção a que elas têm direito e estão assegurados pela Declaração Universal dos Direitos das Crianças, pela Constituição Federal e pelo ECA (Estatuto da Criança e do Adolescente).

“No Dia da Infância, não temos nada a comemorar, já que a maioria das crianças brasileiras está alijada de direitos fundamentais, como acesso às creches e ao Ensino Infantil; ao lazer e a brincadeiras sem ficarem expostas a situações de risco, sendo que boa parte delas vive em condições de abandono, negligência e em situações desumanas e degradantes, inclusive nos locais de moradia, outras ainda são vítimas de violência e exploração do trabalho infantil”, ressalta o coordenador estadual do Movimento Nacional de Direitos Humanos e da comissão da infância e juventude da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Ariel de Castro Alves.

Infância roubada diante de tanta negligência, principalmente nas periferias. No loteamento Chafik/Macuco, no Jardim Zaíra, em Mauá, por exemplo, as brincadeiras acontecem à beira dos barrancos que compõem a área de risco. O esgoto corre, a céu aberto, na mesma sintonia que as crianças. É nesse cenário que Jenerfeson Dias Lima, 7 anos, se diverte andando de bicicleta, mesmo com toda a precariedade do solo, que não é pavimentado; alguns trechos foram concretados pelos próprios moradores. Quando não está pedalando, joga futebol na pequena garagem de casa. “Coloco dois blocos afastados para fazer de gol”, conta o garoto, que sonha em ser jogador profissional. “Para isso, preciso treinar”, salienta. No entanto, não tem onde.

O pai do menino, o porteiro Genilson da Silva Lima, 32, lamenta a falta de atividades de lazer, esportivas e culturais para o público infantil, ações que ele acredita contribuírem para a formação dos pequeninos. “Sem nada que incentive as crianças, como a prática de esportes, elas estão mais soltas para o mundo das drogas e do crime. Com medo de tudo isso, a gente acaba deixando a criança presa em casa”, fala.

As travessuras dessa fase da vida se tornam ainda mais perigosas no local, onde o barranco também vira depósito de lixo. “Um dia, estava jogando aviãozinho de papel e ele caiu no barranco. Fui pegar, tinha um vidro de televisão jogado, e cortei a perna. Levei 20 pontos”, conta garoto de 9 anos que tem passado a maior parte dos últimos dias sendo cuidado pela irmã, de 15, junto aos outros três irmãos (com 2, 5 e 11 anos) enquanto a mãe trabalha e o padrasto procura emprego. “Queria que aqui tivesse um parquinho e uma rua lisinha para andar de bicicleta”, diz ele.

Sem oportunidades que lhes atendam, há crianças que enxergam nas ruas uma forma de se distraírem, como dois irmãos de 10 e 11 anos, moradores do Parque das Américas, também em Mauá. Ao sair da escola, os dois almoçam em casa, dizem aos pais (que estão desempregados) que vão brincar e se deslocam, de trem, da Estação Guapituba até o Centro da cidade. “É chato ficar em casa sem ter o que fazer”, falam. Durante o trajeto pedem dinheiro aos passageiros e, com o valor conseguido, compram sorvete, arroz, ‘mistura’ e o pão que garantirá à família a primeira refeição do dia seguinte.

 

Prefeituras apontam ações ao público infantil

 

As administrações municipais da região destacam ações educacionais, culturais, esportivas e de lazer para atender o público infantil. Na Educação, a Prefeitura de Mauá informa que desde 2013 foram abertas 2.700 vagas em creche. Três unidades estão em construção (Jardim Campo Verde, Jardim Araguaia e Parque das Américas), que juntas atenderão 750 crianças. O deficit não foi informado. “Para garantir ensino de qualidade, os professores recebem formação continuada”, explica. Já as atividades culturais e esportivas são distribuídas “pelos quatro cantos da cidade, inclusive, de 29 de agosto a 6 de outubro, acontecerão nos bairros Alto da Boa Vista, Jardim Sônia Maria, Jardim Oratório e Jardim Anchieta.”

Em Santo André, cerca de 35 mil crianças são atendidas na rede de ensino. Na pré-escola são 9.000 atendidos e há cerca de 400 crianças em lista de espera. “Estão em processo de construção dez creches, em parceria com o governo federal. Cinco delas têm previsão de entrega para 2017, totalizando 560 vagas para crianças de 4 e 5 anos”, declara. A Prefeitura acrescenta que, para garantir o acesso à Cultura, Esporte e Lazer, integrados à Educação, cursos no contraturno escolar são disponibilizados para as crianças matriculadas na rede municipal e acontecem nos 11 Cesas (Centros Educacionais de Santo André) , “cuja maioria está localizada nas áreas periféricas.”

Em Diadema, a demanda pela Educação Infantil possui 6.089 inscritos. No Ensino Fundamental, que tem atendimento compartilhado com a rede estadual, a lista de espera é de 84 crianças do 1º ao 5ª ano. A administração destaca que promove eventos infantis gratuitos em bibliotecas e centros culturais de bairro, além de programas esportivos.

Apesar disso, muitas ações, mesmo que no bairro do público-alvo, ficam distantes, o que dificulta o acesso, principalmente das crianças que os pais não têm condições de levá-las.

As demais prefeituras não responderam.




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