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Violência doméstica é mais frequente no fim de semana

Entre janeiro e abril, 45% das ocorrências do tipo foram registradas aos sábados e domingos na região

Por Aline Melo
Do Diário do Grande ABC
23/06/2019 | 07:00
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Divulgação


Dados da SSP (Secretaria de Segurança Pública) de São Paulo mostram que de todos os casos de lesão corporal no âmbito de violência doméstica registrados entre janeiro e abril deste ano 45% das agressões aconteceram aos fins de semana. Foram 486 registros. Os dados confirmam de maneira numérica o que especialistas da área de gênero apontam há anos: que a violência doméstica se recrudesce aos sábados e domingos e que são necessárias delegacias especializadas e rede de proteção que funcionem 24 horas por dia.

Socióloga e ex-secretária de Política para as Mulheres de Santo André, Silmara Conchão destacou que é preciso pensar sobre a especificidade da violência de gênero e sobre a dificuldade que as vítimas têm de denunciar os agressores. “Os dados nos mostram que a grande maioria dos casos não chega ao conhecimento das autoridades, porque o agressor é sempre alguém muito próximo.”

Especialista em políticas de gênero, Silmara explicou que, aos fins, de semana ocorrem os momentos em que as pessoas se aproximam dentro de casa, local da maioria das agressões. “Por isso, é importante termos a delegacia especializada que funcione 24 horas, porque, de segunda a sexta-feira, em horário comercial, não são os períodos de maior demanda”, completou.

Consultora em estudos de gênero e integrante da Frente Regional do ABC de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres, Maria Cristina Pechtol afirmou que pesquisas recentes constataram que 97% das vítimas de feminicídio no Brasil no último ano não havia registrado boletim de ocorrência contra seus assassinos. “A violência não explode diretamente no assassinato. É um processo crescente, que, muitas vezes, começa com a violência psicológica e, depois, com a física”, explicou. “Ser vítima de violência e não ter onde pedir ajuda assim que a situação ocorre pode desestimular essa mulher a fazer o registro”, ponderou.

Maria Cristina relatou que muitas mulheres, ao procurarem delegacias comuns aos fins de semana, sofrem o que os especialistas chamam de “revitimização”. “Sem um atendimento adequado, sem uma equipe preparada para lidar com essa situação, como a gente espera que ocorra nas DDMs (Delegacias de Defesa da Mulher), essa vítima pode ter a sua palavra colocada em dúvida, pode ser alvo de chacota e, certamente, se houver nova violência, ela não vai denunciar”, declarou.

Além das delegacias especializadas 24 horas, pauta que a frente regional defende há pelo menos dez anos, Maria Cristina apontou a necessidade de se manter em funcionamento contínuo toda a rede de proteção para as mulheres vítimas de violência. “Nas cidades onde existe centro de referência para as mulheres, é esse equipamento quem vai encaminhar para a casa abrigo, onde são recebidas aquelas que têm uma situação de violência doméstica que coloque suas vidas em risco. Mas são locais que só funcionam em horário comercial e, ainda assim, em muitas cidades, falta a divulgação dos serviços e as mulheres não chegam a saber que têm essa opção”, criticou.

Sto.André projeta para este ano primeira DDM 24 horas

A Prefeitura de Santo André debate com o governo estadual, desde o início do ano, a instalação da primeira DDM (Delegacia de Defesa da Mulher) que vai funcionar 24 horas no Grande ABC. Na última terça-feira, o vice-governador do Estado de São Paulo, Rodrigo Garcia (DEM), esteve na cidade para inauguração do COI (Centro de Operações Integradas) e afirmou que, dentro de 60 dias, será publicado edital para abertura de unidades e que a do município estará na listagem das contempladas.

Segundo o prefeito Paulo Serra (PSDB), Garcia garantiu a inclusão do equipamento em concurso que será realizado pelo governo do Estado para contratação de delegados e escrivães. “Aqui já temos a delegacia da mulher, mas a transformação em 24 horas requer mais equipes. Nossa ideia é levar o 4º DP (bairro Jardim) para onde hoje é a DDM (na Vila Guiomar) e trazer a DDM para prédio novo, num ponto mais central até o fim do ano”, completou Serra.

Em nota, a SSP (Secretaria de Segurança Pública) informou que, desde o início do ano, o governo do Estado tem ampliado as ações para combater a violência contra mulheres e o acolhimento às vítimas. “O atendimento foi ampliado de uma para dez DDMs com atendimento 24 horas e, até o fim da gestão, mais 30 unidades terão o atendimento ininterrupto”, relatou o comunicado. 

Audiência debate corte na Casa Abrigo

A vereadora de Santo André, Bete Siraque (PT), apresentou requerimento para audiência pública, a pedido da Frente Regional do ABC de Enfrentamento à Violência Contra as Mulheres, para debater o corte no orçamento do programa Casa Abrigo Regional, promovido pelo Consórcio Intermunicipal do Grande ABC. O evento será realizado no dia 24, às 19h, na Câmara Municipal andreense. O Diário mostrou, em fevereiro, que a verba destinada para o programa em 2019 é de R$ 1,010 milhão, queda de 34% com relação a 2018, quando foi destinado R$ 1,544 milhão.

O objetivo da audiência é solicitar esclarecimentos ao Consórcio e ao Conselho Gestor das Casas Abrigos sobre os impactos do corte orçamentário na prestação dos serviços, diante da preocupação com o aumento na taxa de feminicídios na região, que subiu 33% entre 2016 e 2018, segundo dados do TJ (Tribunal da Justiça). No período, o número de vítimas saltou de 24 para 32. Neste ano, já foram oito crimes no Grande ABC.

Além de abrigar até 40 mulheres e seus filhos menores de idade, as casas abrigo contam com assistentes sociais e psicólogos, que fazem o acolhimento das vítimas e oferecem atendimento psicossocial, de saúde, geração de emprego e encaminhamento jurídico. “Nunca tivemos recursos sobrando, então, se estão cortando dinheiro, ou vão reduzir as vagas (atualmente, a unidade atende até 40 mulheres e seus filhos menores de 18 anos) ou os serviços oferecidos. De qualquer forma, é a precarização do atendimento às vítimas de violência doméstica”, afirmou a consultora em estudos de gênero e integrante da frente regional, Maria Cristina Pechtol.

Coordenadora de programas de projetos do Consórcio, Maria Gracely Batista Marques, a Graça, explicou que não foram feitos cortes, mas sim readequação financeira. “Destinávamos determinadas quantias para os serviços e passamos a contar com o valor exato do que é utilizado. Não houve redução nos atendimentos e ainda vamos contratar outros três profissionais, dois educadores infantis para os filhos das abrigadas e mais uma coordenadora, para que cada casa tenha sua coordenação individual”, garantiu. Graça afirmou que o Consórcio ainda não foi convidado para a audiência, mas que participará, se houver convite, e que todos os dados e explicações já foram apresentadas à frente regional.




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