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Bazar guarda única biblioteca do Prosperidade
Elaine Granconato
Do Diário do Grande ABC
20/02/2005 | 16:44
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Uma biblioteca adaptada funciona por trás das prateleiras de roupas, agulhas, linhas e material escolar do bazar de Mercedes e Ademir Acerbi, casal que mantém o comércio há 24 anos na praça da Riqueza, no bairro Prosperidade, em São Caetano. Em sala de 20 m², cerca de 2 mil livros alinhados em seis estantes, entre didáticos, infantis, literatura e enciclopédias, são u-tilizados por crianças, jovens e adultos da vila, uma das mais carentes da cidade e distante  cinco quilômetros do Centro. A maioria dos exemplares veio de doações da comunidade.

O espaço de leitura é o único do bairro. Pelo menos há dois anos a biblioteca da EE (Escola Estadual) Laura Lopes, com 985 alunos nos ensinos fundamental (5ªa 8ª séries) e médio, além do supletivo, mantém suas portas fechadas, segundo estudantes afirmaram ao Diário. Com o início das aulas, o movimento diário na biblioteca improvisada cresce. “Uma média de dez pessoas passa por aqui diariamente”, orgulha-se Ademir Acerbi, 49 anos, conhecido como Nenê. Porém, a acanhada sala não permite que a pesquisa escolar seja feita ali pelos usuários. “Ajudo as crianças a encontrarem o tema. Depois, elas levam o livro emprestado”, conta a bibliotecária Mercedes, 48.

“Já perdi as contas de quantos livros emprestei”, afirmou Nayara Diniz Santana, 10 anos, aluna da 5ª série e uma das principais clientes da biblioteca. Mariana Pereira Guimarães, 10, confessou que passou a ler mais depois de freqüentar o comércio da dona Mercedes e do seo Nenê. Nayara acrescentou que até suas notas melhoraram.

Além de livros escolares, Monique Perrone Beraldo, 11 anos, e Camila Pareja Rodrigues, 10, adoram os livros de literatura. Na lista dos já lidos, estão A Ilha Perdida, de Maria José Dupré, e O Pequeno Príncipe,  clássico que nunca sai de moda, de Antoine de Saint-Exupéry. “Até para o meu primo já peguei livros aqui”, afirma Tauani Belves Garcez, 10.

Ônibus – Se não existisse a biblioteca do casal Acerbi, Mariana e Monique lembram que teriam de ir ao Centro. “Só a passagem do ônibus custa R$ 2, e a gente não vai sozinha”,  raciocina Monique.  Acerbi, o comerciante mais velho em atividade na praça da Riqueza – só de farmácia são 11 anos –, contou que a idéia de montar a biblioteca foi inspirada na figura do pai Renato, falecido em 1998, com 84 anos. “Apesar de humilde e sem sequer ter concluído o primário, adorava ler jornais. Costumava grifar o que achava mais importante”, conta, emocionado. Na década de 70, colecionava exemplares do tablóide Diarinho (suplemento infantil encartado aos domingos no Diário). “Não perdia um número. Aí, ele emprestava o Diarinho para as crianças fazerem o trabalho escolar. Por isso, nos inspiramos em seu exemplo”, diz.

Modesta, a biblioteca não possui recursos tecnológicos. Não tem computador nem acervo catalogado. A entrada e saída dos livros é controlada por meio de um caderno universitário. “Não determino prazo de entrega. Dependendo do exemplar, peço para que a pesquisa seja feita o mais breve possível para que outra criança possa usá-lo”, explica Mercedes. A propósito, o casal aceita doações de livros em bom estado de conservação e fitas de vídeo (telefone 4221-1919). “Trazia minhas doações aos poucos, em sacolinhas”, lembra Aline Cordeiro Ribeiro, 13 anos, da 7ª série e assídua freqüentadora.

A assessoria de imprensa da Secretaria de Estado da Educação disse que funciona na EE Laura Lopes uma “biblioteca itinerante”, na qual “os próprios professores pegam os livros e levam para a sala de aula”. Alunos entrevistados pelo Diário não confirmaram. “Os próprios professores pedem para que a gente vá à biblioteca do seo Nenê”, disse um aluno do ensino médio. Ainda de acordo com a assessoria, a biblioteca da escola será ampliada em breve.



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