Nacional Titulo
Corpo de Barbosa Lima Sobrinho é enterrado no Rio
Do Diário do Grande ABC
17/07/2000 | 12:22
Compartilhar notícia


O corpo do jornalista Barbosa Lima Sobrinho foi enterrado na manha desta segunda-feira no cemitério Sao Joao Batista, em Botafogo, no Rio de Janeiro. O enterro aconteceu no mausoléu da Academia Brasileira de Letras, da qual Barbosa era o decano.

Ele morreu neste domingo, aos 103 anos, em decorrência de problemas circulatórios, respiratórios e renais. O presidente em exercício, Marco Maciel, decretou luto de três dias no país. A mesma decisao foi tomada pelo governador de Sao Paulo, Mário Covas.

Entre as autoridades que estiveram no enterro estao o governador de Pernambuco Jarbas Vasconcelos, o senador Eduardo Suplicy e os escritores Ziraldo e Zuenir Ventura. No velório, maracaram presença Marco Maciel, representando o presidente Fernando Henrique Cardoso, que está em Moçambique, e o governador de Minas Gerais, Itamar Franco, que prestou suas últimas homenagens a Sobrinho. "Barbosa Lima Sobrinho encarnava o que hoje falta no Brasil: o sentimento de pátria", disse Itamar.

Trajeto - Alexandre José Barbosa Lima Sobrinho foi governador do Estado de Pernambuco, presidente da Associaçao Brasileira de Imprensa, membro da Academia Brasileira de Letras, deputado, escritor, jornalista, advogado, mas o que em sua longa vida mais lhe agradava recordar era a sua condiçao de brasileiro. Conhecido como o senhor Coerência, toda a sua existência foi uma prova de fidelidade ao país em que nasceu.

Quando fez cem anos, ele mesmo confessou: ``Vejo que todos me tratam com muita deferência, mas só tenho a dizer que é gratificante levar uma vida digna do ideal de quem ama o Brasil'.

Coerente com a sua discriçao, fez a revelaçao nao em público mas a sós com um dos seus quatro filhos, Fernando. Na mesma ocasiao, no entanto, falou pelos admiradores do acadêmico o entao arcebispo de Sao Paulo, cardeal Paulo Arns: ``Barbosa Lima construiu um monumento à dignidade e à honradez. Nao somos nós que o colocamos sobre o pedestal. Foi ele quem nos elevou até esse nível para que descobríssemos como deve ser o Brasil de hoje e de amanha. O que mais impressiona é sua luta intransigente em favor da liberdade de expressao e dos direitos da pessoa'.

Mesmo sabendo da inutilidade do esforço que lhe pedia a comissao executiva nacional do MDB, nao hesitou em lançar-se anticandidato a vice-presidente na chapa da oposiçao encabeçada pelo deputado Ulysses Guimaraes em 1974, quando o país vivia em plena ditadura militar e o Colégio Eleitoral era dominado pelo partido governista, a Arena. Achou que essa era uma forma coerente de lutar pela redemocratizaçao do país numa hora em que o regime militar concebera uma campanha destinada exclusivamente a confirmar o general Ernesto Geisel na Presidência da República.

Terminada a campanha, disse: ``Já falei da sacada de palácios e até de altares ecumênicos, mas nunca me senti mais honrado do que quando fui guindado a um estrado de caminhao, quase numa cena de surrealismo, para falar a eleitores que nao iam votar, em nome de candidatos que nao eram candidatos mas tao-somente pessoas que protestavam contra a marginalizaçao do povo na escolha do supremo mandatário da naçao'.

Em 1984 foi ele, também, um dos maiores oradores da campanha Diretas-já, que levou às ruas e praças de praticamente todo o país multidoes que queriam escolher o sucessor do presidente Joao Figueiredo.

Quando em 1937 Getúlio Vargas iniciou o governo do Estado Novo, foi ainda por coerência que Barbosa Lima aderiu ao golpe, conforme explicou mais tarde: ``Getúlio foi o presidente que mais lutou em defesa do nacionalismo'. Teve a dignidade de fazer essa afirmaçao apesar de, também ele, ter sido vítima do período autoritário desse governo. Nessa época (1938), mesmo sendo o líder da bancada e ter integrado a Comissao de Finanças da Câmara, foi-lhe cassado o mandato de deputado federal por Pernambuco. Voltou à Câmara, uma segunda vez, para integrar a Assembléia Nacional Constituinte, em 1946, e renunciou dois anos depois para assumir o governo de Pernambuco.

Seu espírito de coerência e crítica ao mesmo tempo explica algumas das contradiçoes que permeiam sua trajetória. Aliado fiel das esquerdas, nao titubeou em pedir o voto dos coronéis do agreste e do sertao quando se lançou candidato a governador do Estado de Pernambuco. E nao foi fácil ganhar as eleiçoes. Vitorioso por pequena margem de votos, teve contra ele o recurso dos adversários e um ano foi preciso para o Tribunal Superior Eleitoral se pronunciar a seu favor. Governou o seu estado de 1948 a 1951. Mas nem pelo fato de ter ganho graças também ao voto dos latifundiários, deixou de ser coerente em sua luta por um Brasil mais justo. Sabendo que um fazendeiro colocara à venda sua propriedade e levando em conta que isso resultaria na perda de emprego para uma centena de trabalhadores, Barbosa Lima tratou de obter um empréstimo no Banco do Brasil, comprou a fazenda e criou uma cooperativa para os desempregados.

Movido ainda por seu espírito nacionalista, defendeu na Comissao de Sistematizaçao do Congresso, em 1987, a emenda popular com 53.334 assinaturas a favor da manutençao do monopólio estatal do petróleo. Pediu até que a nova Constituiçao fosse estabelecida ``uma proibiçao expressa aos contratos de risco'. Achava ele que ``a tese do monopólio estatal do petróleo é suprapartidária, é dos civis e dos militares, dos estudantes, dos operários, dos profissionais liberais, enfim, de todo o povo brasileiro'. Lembrou, também, que ``foi do maior movimento popular da história brasileira - O petróleo é nosso - que nasceu a Petrobras e que se estabeleceu o monopólio estatal do petróleo'.

Barbosa Lima Sobrinho nasceu em Recife no dia 22 de janeiro de 1897, filho do tabeliao Francisco de Cintra Lima e de Joana de Jesus Barbosa. Depois de aprender as primeiras letras com a mae, mudou-se com a família para o Rio de Janeiro, onde iniciou o curso primário. Mas com os pais voltaria pouco depois para Recife. Aqui terminou o curso de primeiro grau e começou o ginasial no Colégio Salesiano.

Com apenas 13 anos já escrevia no jornal pernambucano A Província. E em 1917, quando se formou na Faculdade de Direito de Recife e foi nomeado adjunto de promotor local, enveredou definitivamente pelo jornalismo. Começou a colaborar nos jornais da terra, Diário de Pernambuco, Jornal pequeno e, sobretudo, no Jornal de Recife. Nao tardou, passou a escrever também em periódicos de outros estados: Revista americana, Revista de direito, Jornal do commercio (Rio de Janeiro), Correio do povo (Porto Alegre) e Gazeta de Sao Paulo.

Em 1921 veio definitivamente para o Rio de Janeiro, a tempo de assistir à última conferência de Rui Barbosa (morto em 1923). Chegando com a recomendaçao do conde Pereira Carneiro, começou logo a trabalhar no Jornal do Brasil. Começou como repórter da Câmara dos Deputados, depois redator principal e comentarista político do jornal. Graças à memória de que era dotado, ele mesmo reconhecia ter facilidade em reproduzir longas entrevistas que depois escrevia à mao. Só em 1934 chegariam ao jornal as primeiras máquinas de escrever, mas a elas Barbosa Lima nunca se adaptaria. Mais tarde haveria de confessar que sempre preferiu o manuscrito alegando que assim tinha mais facilidade de ``coordenar as idéias e fazer um rascunho'.

Em 1924, com apenas 27 anos, já era redator-chefe do JB. E neste jornal publicaria, praticamente todas as semanas, até o fim da vida, perto de 4 mil artigos, o primeiro dos quais saiu no dia 27 de maio de l921, sob o título O momento litterario.

Quando era redator-chefe do JB, Barbosa Lima Sobrinho foi eleito presidente da Associaçao Brasileira de Imprensa (ABI) em 1926. Além do JB, o mais popular da época, havia mais seis jornais no Rio: Jornal do Commercio, o de maior prestígio político, Gazeta de notícias, O Jornal, Correio da manha, Paiz e o recém-fundado O Globo - todos em fase de reestruturaçao. Estava começando em suas




Comentários

Atenção! Os comentários do site são via Facebook. Lembre-se de que o comentário é de inteira responsabilidade do autor e não expressa a opinião do jornal. Comentários que violem a lei, a moral e os bons costumes ou violem direitos de terceiros poderão ser denunciados pelos usuários e sua conta poderá ser banida.


;