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Combate à perda de água na distribuição não avança em 5 anos

Na região, cerca de 35,78% de todo volume tratado é perdido antes de chegar à casa da população; falta investimento na gestão do recurso

Por Flávia Kurotori
Do Diário do Grande ABC
21/12/2020 | 00:01
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Nario Barbosa/DGABC


O Grande ABC ainda engatinha no combate ao desperdício de água durante o processo de distribuição. De todo volume tratado, 35,78% foi perdido em 2019, percentual equivalente ao de 2014 (34,43%). Segundo especialistas, os valores “são absurdos” e refletem a falta de modernização nas redes de saneamento. Os dados são do SNIS (Sistema Nacional de Informações sobre Saneamento) e foram divulgados na última semana pelo Ministério de Desenvolvimento Regional.

Marta Marcondes, bióloga e coordenadora do projeto IPH (Índice de Poluentes Hídricos) da USCS (Universidade Municipal de Sâo Caetano), avalia que o percentual aceitável de perdas seria de no máximo 10%. “É horrível perder de 30% a 40% da água tratada por vazamento. Pode ocorrer perdas na chegada (do recurso) na caixa d’água das cidades e depois, no processo de distribuição às casas. Na própria residência também pode ter vazamentos, mas é mais fácil de perceber, porque dá para sentir na conta de água”, assinala.

Henrique Costa, CEO da Accell, distribuidora de medidores de água, luz e gás, explica que este tipo de desperdício é classificado como “perdas reais”. Ele destaca que, além de desperdiçar o recurso natural, há gasto nos processos de captação e tratamento da água. “É necessário investir e, mais ainda, é preciso ter mais gestão, mais ações de redução de perdas de água”, aponta. Inclusive, este desperdício também está ligado a problemas no abastecimento enfrentado pelas cidades.

Para Marta, é necessário investir em tecnologias já disponíveis no mercado para identificar os pontos da rede de saneamento que estão com vazamentos e, em seguida, solucioná-los. Contudo, ela observa que as instalações da região são antigas e foram “remendadas” no decorrer do tempo para atender ao crescimento populacional. “Sair quebrando cidade inteira  (para trocar toda a rede) é impossível, mas é necessário investir em equipamentos para fazer este monitoramento. Assim, é possível detectar os problemas para fazer reparos ou trocar”, detalha.

Entre as sete cidades, São Caetano é a que registrou o menor índice de perdas em 2019, 14,67%. No município, onde o saneamento é responsabilidade do Saesa (Sistema de Água, Esgoto e Saneamento Ambiental), houve avanço em comparação a 2014, quando o percentual foi de 17,58%.

Cenário mais crítico é em Santo André, cujas perdas foram de 54,12% de toda a água tratada no ano passado. Houve aumento no desperdício, que era de 41,73% cinco anos antes. Desde setembro de 2019, a Sabesp (Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo) é responsável pela gestão da água no município. Até então, o serviço era comandado pelo Semasa (Serviço Municipal de Saneamento Ambiental).

A Sabesp afirmou que mantém o Programa Corporativo de Redução de Perdas, que atua na troca de ramais e hidrômetros e na inspeção das tubulações para identificar vazamentos e fraudes. Em São Bernardo, Diadema, Ribeirão Pires e Rio Grande da Serra, R$ 206 milhões estão sendo investidos em obras, com previsão de conclusão em 2022. Em Santo André, o aporte é de R$ 44 milhões até 2022 para combater as perdas.

Reponsável por Mauá até dia 31, a Sama (Saneamento Básico de Mauá) justificou que o município registra, nos últimos anos, grande número de ocupações irregulares, o que fez crescer a quantidade de sistemas precários e irregulares de abastecimento de água, que, além de impossibilitar a micromedição, eleva os vazamentos. A autarquia, que será substituída definitivamente pela Sabesp em janeiro, completou que a topografia da cidade provoca oscilações de pressão e vazão de água, o que também causa vazamentos. A nota concluiu dizendo que a Sama investe e empenha equipes para conserto de derramamento visíveis e no caça-vazamento.

Desperdício do recurso está ligado a problemas no abastecimento

Os especialistas avaliam que as perdas de água no processo de distribuição é um dos fatores que contribuem para os problemas de abastecimento. Conforme publicado pelo Diário no início deste mês, o nível dos mananciais que abastecem a região está crítico em razão do regime de chuvas irregular registrado em 2020. “(Os vazamentos) Deixam muito mais caro e isso se reverte no aumento de tarifa porque, se o ano está seco, somado às perdas, é preciso bombear água de outro reservatório, o que eleva os custos”, explica Henrique Costa, CEO da Accell, distribuidora de medidores de água, luz e gás.

Ele lembra que as companhias responsáveis pelo abastecimento pregam o consumo consciente e, ainda que seja uma medida essencial, é apenas paliativa. “A pandemia está aí, aumentando o consumo de água para higienização, e existem problemas porque faltam ações de médio a longo prazos, é preciso mais empenho na gestão da água”, critica.

Marta Marcondes, bióloga e coordenadora do projeto IPH (Índice de Poluentes Hídricos) da USCS (Universidade Municipal de São Caetano), lembra que desde a última crise hídrica, os sistemas Cantareira e Guarapiranga estão colapsando e este desperdício, que pode ser evitado, agrava o cenário. “O ideal seria não se perder nada, o que vemos hoje é um absurdo. Não podemos nos dar ao luxo de perder uma quantidade de água dessas com nossos reservatórios em risco”, reforça. 

Costa assinala que traçar plano para reduzir perdas como uma das maneiras de evitar crises no abastecimento também é um investimento na economia de uma cidade. “Nenhuma empresa quer se instalar onde há risco de faltar água”, diz.




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