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Queixas feitas na internet superam as dos procons em quatro vezes

Em 2017, houve 143,5 mil registros no site Reclame Aqui, enquanto órgãos oficiais tiveram 40,4 mil

YaraFerraz
Do Diário do Grande ABC
Flávia Kurotori
18/03/2018 | 07:00
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Divulgação


 O consumidor do Grande ABC que está com problemas em relação a um produto ou serviço prefere recorrer à internet do que aos procons. Para se ter ideia, em 2017 a quantidade de queixas nas sete cidades foi 255% maior no site Reclame Aqui do que nas unidades municipais dos órgãos oficiais – 143.541 ante 40.410 casos, ou seja, número praticamente quatro vezes maior.

Os dados do site, levantados a pedidos do Diário, foram comparados aos números disponibilizados pelo Sindec (Sistema Nacional de Informações de Defesa do Consumidor), do Ministério da Justiça, divulgados em reportagem no mês passado. Como na época o número de reclamações nos órgão oficiais tinha caído em 41%, a justificativa dos especialistas se baseou na migração do registro de queixas para a internet.

Na avaliação de Ana Paula Satcheki, advogada especialista em Direito do Consumidor, as pessoas optam pelo meio on-line por conta da facilidade. “Para fazer uma queixa no Procon é preciso ir até uma das agências, enquanto que, via web, é possível fazer todo o procedimento sem sair de casa”, justifica. “São estratégias diferentes, mas ambas têm o mesmo objetivo: resolver um conflito”, completa.

Outro fator que pesa na escolha do consumidor é o tempo necessário para resolução. “Na internet, com o auxílio das redes sociais, as empresas sentem-se pressionadas a solucionar o problema. Porém, embora no Procon a burocracia seja maior, assim como o prazo, ele é o órgão competente que pode cobrar, autuar e até mesmo denunciar a empresa”, explica Ana Paula. “Recorrer a uma das ferramentas não exclui a outra.”

O índice de resolução de problemas registrados pelo site é de 80% e no período de até três dias, afirma o presidente do Reclame Aqui, Maurício Vargas, ao destacar que o site apenas faz a ponte entre empresa e consumidor, sem interferir na resolução. “Há muito tempo o fluxo de reclamações é maior do que no Procon em todo o Brasil, porque é muito mais fácil resolver problemas pela internet, além da credibilidade que o consumidor tem com o Reclame Aqui”, destaca.

Ana lembra que, com o intuito de facilitar a vida do consumidor, o governo federal criou portal oficial para solução de problemas entre as partes. No site www.consumidor.gov.br é possível formalizar a reclamação, porém, é preciso que a companhia alvo da queixa seja cadastrada. “O sistema é muito simples e o índice de solução é alto, mas as empresas precisam aderir ao site.” 

O volume de registros no Reclame Aqui cresceu 12,19% entre 2016 e 2017, saltando de 127.940 para 143.541 queixas – o mesmo que  350 por dia para 393 diárias. “Os problemas permanecem ano após ano, e as empresas continuam desrespeitando o consumidor”, salienta Igor Marchetti, advogado do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor).

Dentre as principais reclamações estão as que envolvem smartphones, tanto relacionadas ao produto como problemas com seu funcionamento, o que inclui as operadoras de telefonia celular (veja mais ao lado). “Os smartphones ainda são um desejo do consumidor e, atualmente, lideram as vendas de grandes indústrias. É natural, portanto, que quanto mais se vende, mais apareçam problemas. Já as operadoras de telefonia constam no topo da lista porque o consumidor está cansado de ser vítima de serviço que não funciona, com um atendimento que deixa a desejar”, diz Vargas.

RECALL

Cada dia mais comum, a convocação de recall é vista como algo positivo pelos especialistas. “Não significa que a empresa é má fabricante, mas que o produto apresentou falha de qualidade e segurança que precisa ser mudada”, afirma Ana Paula.

“Chamar para um recall significa que o produto ainda não estava adequado a ser vendido no mercado. Mas é legítimo chamar para fazer este reparo e o importante é não se omitir ante o erro”, diz. A advogada avalia que tais problemas, que podem ser simples ou complexos, devem ser resultado da produção em massa. “Algumas etapas podem falhar, seja por conta da mecanização ou da mão de obra despreparada.”

Questionado sobre o peso de canal de diálogo entre empresas e consumidores, o presidente do Reclame Aqui afirma que houve grande mudança principalmente após a criação da plataforma, que, segundo ele, foi protagonista de revolução. “As marcas estão investindo, sobretudo nos segmentos de e-commerce, dentre elas, bancos, indústrias de eletrodomésticos e serviços. Por outro lado, tanto operadoras de telefonia como de TV a cabo estão ficando para trás nesse sentido.”

Procurar empresa é primeiro passo antes da reclamação

Igor Marchetti, advogado do Idec (Instituto Brasileiro de Defesa do Consumidor), orienta que a primeira coisa a se fazer quando algum serviço ou produto apresentar um problema é entrar em contato com a empresa. “O SAC (Serviço de Atendimento ao Cliente) deve ter a capacidade de apresentar uma solução”.

O advogado destaca que, embora muitas empresas ofereçam o serviço de e-chat – conversa via mensagem on-line – para atender o cliente, telefonar é preferível. “No chat não há número de protocolo porque não há regulamentação. Mas, pelo telefone, há regras e a pessoa terá mais informações para se munir contra problemas futuros.”

Caso não resolva, é preciso procurar a ouvidoria do estabelecimento e formalizar uma queixa. O terceiro passo é recorrer à agência regulamentadora, como a Anatel (Agência Nacional de Telecomunicações) para problemas com telecomunicações, a ANS (Agência Nacional de Saúde) para questões com plano de Saúde, e assim por diante.

Se nenhuma das etapas resolver, o consumidor deve procurar o Procon. “Ele (o Procon) tem o poder de intermediar a relação administrativamente. O órgão tem ‘poder de polícia’ e pode fazer acordos e denunciar a empresa, se for preciso."

Consumidores da região relatam problemas

O tatuador João Victor Nunes de Macedo, 34 anos, morador de Santo André, encontrou problemas ao contratar novo plano de internet da operadora Vivo. “Troquei por um pacote melhor, mas dentro da mesma empresa. Quando o técnico veio para instalar, me disse que eu precisava entrar em contato para cancelar o serviço anterior, senão eu pagaria pelos dois”, conta.

Na terça-feira, Macedo entrou em contato com a empresa para fazer a operação, porém, mesmo explicando a situação, não conseguiu cancelar o serviço. “Eu falava do cancelamento e me transferiam. Cheguei a esperar dez minutos para ser atendido novamente, até ser transferido de novo e a ligação cair. Fiquei uma hora e meia nesse ciclo e não consegui resolver”, lamenta. Na quinta, a operadora entrou em contato, entretanto, o tatuador estava ocupado e solicitou que ligassem em outro horário. “Até agora (sexta-feira) ninguém me retornou.”

Segundo Igor Marchetti, advogado do Idec, o SAC (Serviço de Atendimento ao Cliente) deve atender e solucionar os problemas o mais rápido possível. “Os operadores não podem transferir a ligação, pois todos devem estar aptos a resolver qualquer assunto.” A única exceção é em caso de dúvidas ou problemas técnicos e, caso seja necessária transferência, o consumidor não pode aguardar por mais de um minuto.

O eletricista são-bernardense Ednaldo Onofre da Silva, 58, também teve dor de cabeça, com compra on-line. Seu filho adquiriu televisão em novembro de 2017, no entanto, assim que foi entregue, o aparelho apresentou problemas. “No segundo dia de uso apareceu faixa grande e branca do lado direito da tela.”

Silva conta que acionou o Ponto Frio – responsável pela venda do produto – que informou a necessidade de retirar o objeto para troca. A família aguardou por cerca de 45 dias até que a empresa buscasse a televisão. “Estávamos pagando as parcelas normalmente e não tínhamos satisfação. Ligávamos perguntando quando entregariam e diziam que precisava esperar cinco dias úteis. Tenho mais de 12 números de protocolos de reclamação.”

De acordo com ele, a loja alegava falta de assinatura no momento da retirada do aparelho, e por isso, a troca não seria efetivada. “Quando vieram buscar a televisão, disseram que não precisaria assinar.” O filho de Silva procurou o Procon e escreveu queixa no Reclame Aqui, porém, nada mudou.

A solução só veio quando a filha de Silva enviou e-mail ao Ponto Frio informando os dados da queixa e ameaçando que, caso o problema não fosse resolvido, acionariam a Justiça e levariam o caso à mídia. Após quatro meses, a entrega do produto foi feita. “Foi um alívio”.

A Vivo informou que fez o cancelamento do plano citado nesta data, e que não haverá cobrança de multa contratual. Já o Ponto Frio não se pronunciou até o fechamento desta edição.




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