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Empresas vítimas de espionagem industrial evitam procurar a polícia
Por Gabriel Batista
Do Diário do Grande ABC
02/04/2006 | 08:06
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A espionagem industrial pode ser comparada a um crime fantasma. Existe em todo canto e todos sabem, mas ninguém vê ou ouve falar quando ocorre. A própria polícia dificilmente é comunicada. Justamente porque as empresas vítimas não querem levar a público o fato, para evitar a exposição de uma fragilidade interna. O vilão geralmente é alguém que trabalha ou um ex-funcionário da indústria lesada, e que repassa a concorrentes informações sobre projetos ou fórmulas de produtos. Uma pesquisa realizada em 2005 pela empresa internacional de auditoria Pricewaterhouse Coopers indica que, no Brasil, apenas 29% dos crimes econômicos são informados à polícia ou à Justiça. O resultado é que apenas 8% desses criminosos são condenados no país.

Um exemplo de espionagem industrial altamente lesiva ocorreu na unidade da Ford de São Bernardo em setembro do ano passado. Foram roubados fotos e documentos do modelo de um carro desenvolvido pela montadora, a ser lançado em 2008. As imagens chegaram às mãos de uma revista especializada, que as publicou. Depois, outros jornais rechearam seus exemplares com as fotos do novo carro da Ford. A empresa afirma que o fato está em investigação, mas não confirmou se a polícia está no caso.

Após isso, a montadora anunciou aos funcionários que vai se cercar de meios para não ser vítima da espionagem industrial. "A fábrica orienta semanalmente sobre a conduta a ser incorporada por nós, funcionários. Não é permitido entrar com telefone celular capaz de fazer fotos, muito menos com máquinas fotográficas. Há restrição de acesso a algumas áreas quando é iniciado um projeto", diz o coordenador-geral da Comissão de Fábrica da Ford, Teonilio Monteiro da Costa, o Barba.

Outra empresa que levou susto com a espionagem foi a indústria de autopeças Karmann Ghia, de origem alemã, com filial em São Bernardo. Para controlar as informações, a empresa detém na Alemanha um back up (cópia) de todas as mensagens trocadas por funcionários via e-mail. Foi assim que, há um ano e meio, a matriz detectou que um colaborador na unidade de São Bernardo, recém-demitido, havia enviado arquivos da indústria à namorada.

Como poucas empresas fazem, a Karmann Ghia denunciou o suspeito à polícia. Foi aberto um inquérito policial pela Delegacia Seccional de São Bernardo, que, no final, concluiu que o ex-funcionário não cometeu crime. "O suspeito alegou que utilizaria as informações em um projeto acadêmico", diz o delegado seccional Marco Antonio de Paula Santos. Procurada pela reportagem, a Karmann Ghia não comentou o caso. Uma funcionária, no entanto, disse que problemas como esse ocorrem com certa freqüência.

Na pesquisa da empresa de auditoria Pricewaterhouse Coopers, sobre crimes econômicos, verificou-se que a espionagem industrial e a falsificação de produtos e projetos configuram o segundo crime mais freqüente no Brasil, atrás apenas do roubo comum (apropriação indébita). "A falsificação e a espionagem industrial estão interligadas, pois, para se copiar algo, tem de se obter informações sobre o original", explica o diretor de gestão de riscos corporativos da Pricewaterhouse, Antonio Cocurullo.

Algumas indústrias chegam a grampear o telefone de funcionários suspeitos, o que é ilegal, e só pode ser feito com autorização judicial. "Existem executivos que querem monitorar integrantes de sua empresa suspeitos de atuar no vazamento de informações. Mas o mecanismo legal para se investigar é mesmo recorrer à polícia", diz o diretor de gestão de riscos Antonio Cocurullo.

A lei federal complementar 9.279 (capítulo VI, inciso XI), de 1996, prevê pena de três meses a um ano de detenção ou multa para quem "divulga, explora ou utiliza-se – sem autorização – de conhecimento, informações ou dados confidenciais utilizáveis na indústria ou comércio" (...) informações essas "a que teve acesso mediante relação contratual ou empregatícia, mesmo após o término do contrato".

Mas, segundo o promotor de Justiça José Carlos Blat, da 1ªPromotoria Criminal do Estado, as empresas geralmente optam por processos em uma Vara Cível (e não Criminal), porque podem gerar indenização em casos de espionagem.




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