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Lula se entrega à Polícia Federal

Após 47 horas de resistência no Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, ex-presidente atende advogados e se rende para evitar implicâncias jurídicas

Anderson Fattori
Humberto Domiciano
08/04/2018 | 07:00
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Depois de aproximadamente 47 horas desde a ordem de prisão determinada pelo juiz federal Sérgio Moro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) se entregou à PF (Polícia Federal), às 18h42 de ontem, e foi preso. De imediato, foi encaminhado à superintendência da Lapa, em São Paulo, para fazer exame de corpo de delito e, às 20h46, embarcou do Aeroporto de Congonhas para Curitiba, no Paraná, onde iniciou o cumprimento da pena de 12 anos e um mês por corrupção e lavagem de dinheiro.

O ex-presidente havia ficado no prédio do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo, desde quinta-feira, quando Sérgio Moro decretou sua prisão e determinou que se apresentasse à PF até as 17h de sexta-feira, na capital paranaense. No entanto, após negociação com os advogados do petista, o prazo foi estendido até ontem, quando Lula participou de missa em homenagem à ex-mulher, Marisa Letícia (leia mais nesta página).

A decisão de se entregar surgiu depois que a última esperança de Lula e sua defesa acabou frustrada pelo STF (Supremo Tribunal Federal), que negou outro pedido de habeas corpus na manhã de ontem. A negativa foi do ministro Edson Fachin.

A primeira tentativa de Lula de sair da sede do sindicato se deu por volta das 17h, mas dezenas de militantes impediram o veículo de deixar a garagem do sindicato – o portão chegou a ser quebrado.

Quando passava das 18h, a presidente nacional do PT, a senadora paranaense Gleisi Hoffmann, e o presidente estadual da sigla, o ex-prefeito de São Bernardo Luiz Marinho, entre outros políticos, usaram caminhão de som e pediram insistentemente para que a militância deixasse o carro com o ex-presidente sair do sindicato. O receio era de que Moro decretasse prisão preventiva, o que traria, segundo os petistas, implicâncias jurídicas que impediriam, por exemplo, novos recursos como o habeas corpus.

Mesmo com os pedidos, os militantes não pareciam convencidos e continuavam entoando cânticos pedindo resistência ao ex-presidente. Simpatizantes com opiniões divergentes sobre o assunto chegaram a se estranhar e o clima ficou ainda mais tenso.

Às 18h42, quando a maior parte dos militantes estava próxima ao caminhão de som, Lula saiu a pé por um dos portões do sindicato. Seguranças tentaram fazer cordão de isolamento na rua e usaram o próprio portão como escudo para afastar as pessoas que ainda tentavam impedir que o ex-presidente se entregasse. Em meio a dezenas de pessoas, o petista andou alguns metros e conseguiu alcançar portão do estacionamento da gráfica do sindicato, onde dois carros da PF o aguardavam. A ação demorou menos de um minuto.

Militantes ainda tentaram avançar contra a barreira de seguranças, mas foi em vão. O tumulto pressionou dezenas de pessoas contra um muro, mas ninguém ficou ferido. Após a prisão de Lula, os militantes deixaram lentamente os arredores do sindicato, muitos chorando e ainda inconformados com a decisão tomada pelo ex-presidente.

Bispo fala em ‘golpe’ contra ex-presidentes petistas
Humberto Domiciano

O bispo emérito da Diocese de Blumenau (Santa Catarina), dom Angélico Sândalo Bernardino, que rezou a missa em homenagem à ex-primeira-dama Marisa Letícia, na manhã de ontem,adotou tom mais político durante a cerimônia. Na visão do religioso, o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff, em 2016, e o pedido de prisão de Luiz Inácio Lula da Silva (ambos do PT) fazem parte de um mesmo ‘golpe’. “Temos a convicção que foi um golpe. Foi 50% quando tiraram a Dilma e os outros 50% são porque não deixam você (Lula) se candidatar”, relatou.

Dom Angélico mantém amizade com o petista desde os anos 1970. Em outro trecho da missa, o representante da Igreja Católica criticou o que chamou de “volúpia dos poderosos”, e disse que a “imprensa estaria a serviço desses interesses”. Em outro momento da cerimônia ecumênica, o bispo também alfinetou a Operação Lava Jato. “Temos juízes que condenam e falam por convicção, sem mostrar provas”, completou o religioso.

BASTIDORES
O clima na sede do sindicato, na parte da manhã, revelou uma mudança de ânimos. Apesar de contar com todas as principais lideranças ao longo do dia, as falas sobre resistência deram lugar à resignação. Comentava-se ainda que a defesa do presidente tentaria outros acordos para a entrega do petista. O dia foi marcado também por agressões a jornalistas da CBN, da RedeTV e BandNews. Na sexta-feira, a ABI (Associação Brasileira de Imprensa) divulgou nota repudiando agressões sofridas nos últimos dias por repórteres, em Brasília e em São Bernardo.

 

Petista ataca Judiciário antes de sair de cena
Humberto Domiciano

Durante a missa realizada na manhã de ontem, em frente ao Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, na região central de São Bernardo, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) fez diversos ataques ao Judiciário. A solenidade foi marcada para homenagear o aniversário da ex-primeira dama Marisa Letícia, morta no ano passado, que faria 68 anos.

O discurso de quase uma hora foi o último ato do petista antes de se entregar à PF (Polícia Federal). Em sua fala, Lula elegeu como principais alvos o juiz Sérgio Moro e o promotor Deltan Dallagnol pela atuação de ambos na Operação Lava Jato e seus desdobramentos.

“Sou o único ser humano processado por um apartamento que não é meu. A PF da Lava Jato mentiu, o MP (Ministério Público) mentiu, Sérgio Moro mentiu e me condenou a nove anos. Por isso sou indignado, já fiz muita coisa nos meus 72 anos, não perdoo por terem passado a ideia de que sou ladrão. Deram primazia de fazer um pixuleco, chamar a gente de petralha, criar quase clima de guerra. Digo todo dia, nenhum deles tem coragem ou dorme com a consciência tranquila”, criticou.

O ex-presidente também destacou que sua prisão atenderia a outros interesses. “O TRF-4, o Moro e a Globo têm o sonho de consumo – porque o golpe não terminou com a Dilma –, que só vai se concluir quando convencerem que Lula não poderá ser candidato em 2018. Não querem que eu participe (das eleições)”, prosseguiu.

Sobraram farpas para a imprensa e o petista direcionou críticas a alguns veículos. “Fico imaginando a t... da Veja colocando na capa minha foto, a t... da Globo. Terão orgasmos múltiplos. Eles decretaram minha prisão”, pontuou.

Por outro lado, Lula teceu elogios aos pré-candidatos a presidente Guilherme Boulos (Psol) e Manuela D’Avila (PCdoB). Na visão do petista, o líder do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto) terá papel importante no cenário político. “É preciso levar em conta a seriedade desse menino, que só tem 35 anos. Você tem futuro meu irmão.”

O encerramento do discurso do petista teve uma tentativa de animar a militância. “Tem milhões de Lulas por aí, não adianta tentar acabar com minhas ideias e não tem como prender, pois quando eu parar de sonhar, vou sonhar pela cabeça de vocês, não adianta achar que vou parar. Não sou mais um ser humano, sou uma ideia”, complementou. A missa ecumênica chegou a ser interrompida algumas vezes por gritos de “não se entrega”.




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